Se aprovar a terceirização, STF respaldará fim de direitos trabalhistas

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Os retrocessos nos direitos da classe trabalhadora brasileira, que tem sofrido com as consequências da reforma trabalhista, poderão ser ainda maiores se STF aprovar nesta quarta a terceirização na atividade-fim.

Foto: Nelson Jr. / STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, nesta quarta-feira (29), o julgamento sobre a constitucionalidade da terceirização na atividade-fim, considerada a principal atividade de uma empresa. O placar da votação está 4 a 3 a favor da ampliação desta forma de intermediação de mão de obra que precariza as condições de trabalho. Em comparação aos trabalhadores e trabalhadoras diretamente contratados pelas empresas, os terceirizados têm menos direitos, ganham menos, trabalham mais horas e são os mais vulneráveis a acidentes no local de trabalho por falta de segurança.

Os ministros Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli já votaram a favor da legalização desse retrocesso no direito trabalhista. Já Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski votaram contra. Devem votar nesta quarta, a presidente do STF, Cármen Lúcia, e os ministros Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello. 

A Corte julga duas ações – a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324 e o Recurso Extraordinário (RE) 958.252 -, que chegaram ao tribunal antes da Lei 13.429, sancionada em março de 2017, que liberou a terceirização para todas as atividades das empresas.

Apesar da sanção da nova lei pelo governo, a Súmula 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), editada em 2011, proíbe a terceirização das atividades-fim e tem sido aplicada pela Justiça do Trabalho nos contratos que foram assinados e encerrados antes da lei.

O secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle, criticou os votos dos ministros favoráveis à terceirização, ressaltando que eles não conhecem a realidade da classe trabalhadora, muito menos as condições precárias de trabalho a que é submetido um trabalhador terceirizado.

“Teve ministro que chegou a afirmar que a única diferença entre um terceirizado e um contratado direito é apenas a forma de contrato. Isso é um absurdo, uma falácia e um desrespeito aos direitos daqueles trabalhadores que sofrem na pele as consequências dessa forma precária de contratação”, criticou o dirigente.

“Como se pode julgar sem sequer conhecer a realidade do local de trabalho, de um chão de fábrica, de um canteiro de obra?”, questiona Valeir, referindo-se, sobretudo, aos discursos adotados por Barroso e Fux ao aprovar a terceirização.

Para o ministro Luís Roberto Barroso, relator da ADPF, a livre-iniciativa e a livre-concorrência foram as prioridades no julgamento e não as condições precárias a que são submetidos os terceirizados. “Aqui se trata de um modo de produção, e as empresas não podem ter altíssimo custo fixo em face das demandas”, afirmou o ministro em seu voto.

Já para o relator do Recurso Extraordinário, ministro Luiz Fux, “a dicotomia entre a atividade-fim e a atividade-meio é imprecisa, artificial e ignora a dinâmica econômica moderna, caracterizada pela especialização e divisão de tarefas com vista à maior eficiência possível”.

“É impressionante que ministros do Supremo desconheçam as diferenças de condições de trabalho entre terceirizados e trabalhadores contratados diretamente pela empresa”, critica a secretária de Relações do Trabalho da CUT, Graça Costa.

Segundo ela, a própria Justiça do Trabalho já manifestou posição contrária à legalização da terceirização nas principais atividade das empresas. “Na época das discussões sobre o PL 4330 [terceirizações], 19 ministros do TST publicaram uma nota contrária à terceirização na atividade-fim”, diz Graça.

“O objetivo das empresas é um só, reduzir custos. Se não fosse isso, eles aceitariam a proposta de isonomia, ou seja, garantia de direitos iguais a todos os trabalhadores feita pela CUT e as demais centrais sindicais”, afirma.

A secretaria diz, ainda, que estão enganados os ministros que argumentam que os objetivos dos empresários é a modernização. O fato, diz ela, é que a empresa contratante se isenta de qualquer responsabilidade com os terceirizados. “Não têm compromisso com a remuneração, com as condições de saúde e segurança e nem com as verbas rescisórias. Pouco importam se os trabalhadores morrem ou não”.

É uma vergonha os ministros do STF desconsiderarem essa realidade

– Graça Costa

Em artigo publicado nesta terça-feira (28), a técnica da subseção do Dieese da CUT, Adriana Marcolino, também reagiu à retórica utilizada por alguns ministros do STF. Segundo ela, o Estado deve, sim, impor limites aos ganhos empresariais oriundos da ampliação da exploração, como é o caso da terceirização, que não é modernização, é exploração, ao contrário do que acham os ministros.

A precarização é estrutural nesse tipo de contrato de trabalho

– Adriana Marcolino, socióloga e técnica do Dieese

“Na prática os ganhos advindos com a terceirização são decorrentes da redução do custo do trabalho com a piora generalizada das condições, das relações de trabalho e da vida dos trabalhadores”, diz.

Acidente de trabalho é maior entre os terceirizados

A cada dez acidentes de trabalho no Brasil, oito acontecem, em média, com trabalhadores terceirizados, segundo pesquisa da Central em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

A morte de um jovem que prestava serviço terceirizado à Petrobras na madrugada dessa segunda-feira (27) é o retrato dessa realidade. Torrista da empresa PetroRecôncavo, Lucian Nobre Santos, 28 anos, faleceu ao realizar a limpeza de um poço terrestre na sonda PR-02, localizada na Estrada do 20 mil, próximo à Estação São Roque, região metropolitana de Salvador. Segundo relatório inicial do acidente, durante a movimentação da coluna de produção, houve o rompimento do cabo de aço que pode ter atingido fatalmente o trabalhador. As investigações ainda serão concluídas.

Reprodução

Imagem do local de trabalho após o acidente fatal que vitimou um jovem trabalhador da PetroRecôncavo

A relação entre terceirização e a morte em serviço é clara em diversos setores, segundo estudo da CUT em parceria com o Dieese feito a partir de relatórios publicados pelas empresas. Na Petrobras, por exemplo, 85 dos 99 trabalhadores que morreram entre 2005 e 2012 eram terceirizados. O mesmo padrão é visto em empresas do setor elétrico, campeão em acidentes de trabalho. 

Terceirizados ganham menos e trabalham mais

Um relatório divulgado pelo Dieese em março do ano passado mostrou, mais uma vez, que os terceirizados ganham menos e trabalham mais. De 2007 a 2014, a diferença entre os terceirizados e os contratados diretamente pelas empresas se manteve, em média, entre 23% e 27%. Em dezembro de 2014, a remuneração média nas atividades tipicamente contratantes era de R$ 2.639, enquanto nas atividades tipicamente terceirizadas era de R$ 2.021.

Imagem: Reprodução DIEESE

Reprodução Dieese

Com relação à jornada de trabalho, 85,9% dos terceirizados trabalhavam entre 41 e 44 horas semanais, enquanto essa proporção era de 61,6% entre os contratados diretamente pelas empresas.

“Se a maioria do STF votar pela terceirização irrestrita o que teremos no mercado de trabalho é mais situações como a da Latam, que demitirá cerca de mil trabalhadores para terceirizar a mão de obra, precarizando as condições de trabalho e a qualidade do serviço”, conclui o secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle.

A Latam Airlines anunciou no dia 20 de agosto que irá demitir cerca de 1,3 mil trabalhadores e trabalhadoras e substituirá a força de trabalho direta por terceirizados. A medida atingirá o Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, e o Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, no Rio de Janeiro.

 

Fonte: CUT / Escrito por Tatiana Melim