Movimentos sociais lançam plano emergencial para enfrentamento da crise e do Covid-19

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A Frente Brasil Popular (FBP) e a Frente Povo Sem Medo (FPSM) lançaram juntas, nesta terça-feira (31), a Plataforma Emergencial para Enfrentamento da Pandemia do Coronavírus e da Crise Brasileira, com mais de 60 propostas, apoiadas por cerca de 40 entidades e movimentos sociais. De acordo com Guilherme Boulos, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e da FPSM, a prioridade é proteger a saúde da população brasileira, respeitado o isolamento social indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e assegurados os recursos de subsistência para os 40 milhões de trabalhadores informais e cerca de 12 milhões de desempregados, além de estabilidade para os que ainda têm contratos formais de trabalho.
 
Além do pagamento – o mais rápido possível – do auxílio emergencial para viabilizar a quarentena sem fome, as propostas incluem o fim da fila do Bolsa Família, com a concessão acelerada do benefício a todos; suspensão da cobrança das tarifas dos serviços essenciais (energia elétrica, gás, aluguel, água) e também de ordens de despejo (coletivo ou individual); utilização da rede hoteleira para abrigar população sem teto — 25 mil só nas ruas da cidade de São Paulo, e centenas de milhares país afora –; requisição dos leitos hospitalares do setor privado pelo SUS, para formação de uma base única, disponível a todos que precisarem de internação; formação de conselhos estaduais para gestão da crise, com trabalhadores, empresários, juristas, imprensa e outras categorias, numa espécie de mutirão de salvação nacional, entre outras medidas.
 
“Este documento quer dizer ao povo brasileiro que a alternativa entre as pessoas irem para a rua, desrespeitando as medidas de quarentena, ou morrerem de fome em casa é uma falácia, é falsa. O que estamos vendo no mundo comprova”, diz Boulos. “Para evitar o colapso maior, é necessário que o Estado apoie com uma renda básica, estabilidade no emprego, apoio aos trabalhadores sem teto, e uma série de medidas que estão na plataforma.”
 
O país está em um momento de “vida ou morte”, afirma Carmen Foro, secretária-geral da CUT. “Optamos por lutar pela vida e enfrentar um governo que optou pela morte, quando vai na contramão de todas as orientações internacionais. Com essa plataforma emergencial, estamos escolhendo um lado: defender a vida do povo brasileiro.”
 
Para os sindicatos e as relações de trabalho, Carmen destaca como principais propostas “garantir a estabilidade dos empregos, os salários e que os Acordos Coletivos (ACTs) sejam mantidos até o fim da pandemia”. Além disso, as entidades querem que o Estado destine mais recursos para o enfrentamento da crise, aumentando, por exemplo, a produção de equipamentos de proteção para os trabalhadores da saúde. A secretária-geral da CUT pediu à base de sindicatos da central para colocarem à disposição das autoridades municipais espaços físicos que possam ajudar durante a pandemia. “É hora de exercer a solidariedade”, diz.
 
Para quem considera utópicas ou radicais iniciativas como a suspensão da cobrança dos serviços essenciais, Boulos observa que já foram tomadas por governos liberais, como o de Emmanuel Macron, na França, e de países bem mais pobres do que o Brasil, como El Salvador. A requisição dos leitos hospitalares, por sua vez, está garantida pelo artigo 5º da Constituição e também sendo implementada fora do país. “A Espanha acabou de fazer isso, a estatização provisória do setor de saúde”, lembra. “Para uma vida não valer mais do que a outra — porque uma pode se salvar indo para o Einstein [Hospital Albert Einstein], e a outra pode nem conseguir entrar em um hospital. É preciso dar ao Estado o controle completo de todas as instalações de saúde.”
 
O presidente da UNE, Iago Montalvão, considerou uma vitória a suspensão de aulas em universidades e escolas, mas chama a atenção para o fato de muitos estudantes dependerem de restaurantes universitários e de auxílios-permanência, estarem perdendo estágios ou empregos e ficando sem renda. Defende, por isso, a criação de crédito especial para os estudantes, redução das mensalidades nas universidades privadas e fim da cobrança de juros e parcelas do Fies durante a quarentena. Paralelamente, reafirma a relevância da pesquisa, das bolsas e dos investimentos na educação para combate ao novo coronavírus. “As universidades estão produzindo máscaras mais baratas, respiradores, pesquisando tratamentos e vacinas.”
 
Mudanças estruturais
A plataforma emergencial tem um papel estratégico de mobilização, ressalta João Pedro Stédile, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Será importante “para dialogar com a sociedade e os militantes dos movimento, no sentido de apresentar uma posição unificada, orientar no que é fundamental agora, para enfrentar as graves crises que a sociedade está sofrendo: em primeiro lugar, a saúde pública, garantir a saúde de todo mundo”. Mas ele alerta que a saúde vai depender “de como nos comportamos com os outros”, da importância dada ao #fiqueemcasa e a atitudes solidárias. “Essa não é tarefa para médicos e hospitais, temos que prevenir antes.”
 
O segundo objetivo do lançamento da plataforma, explica Stédile, é indicar para a sociedade a necessidade de mudanças estruturais na economia para garantir alimentação, emprego, e revelar que há recursos públicos no governo central que poderiam ser mobilizados para resolver os problemas.
 
“Infelizmente, das 40 medidas do Guedes [Paulo Guedes, ministro da Economia], de R$ 708 bilhões sinalizados, a maioria é crédito para empresas, necessário mas insuficiente”, diz o dirigente do MST. “Precisamos de mais recursos para o SUS, para ampliação do Bolsa Família, para garantir que o governo assuma a folha de pagamento das empresas, para que as pessoas possam ficar em casa, sem pânico de que no final do mês não vão ter renda. E também esperamos que o governo normatize imediatamente o auxílio emergencial de R$ 600,00 por pessoa, até R$ 1,2 mil por família [proposto pelos partidos de oposição e aprovado nesta segunda, 30, pelo Senado], para que ainda nesta semana as pessoas possam acessar esse recursos. Isso é urgente, urgentíssimo.”
 
Aliado da pandemia
A plataforma emergencial não ignora a insistência do presidente da República em desacreditar e combater as medidas de prevenção à Covid-19 da OMS, dos governos estaduais e do Ministério da Saúde. “Bolsonaro perdeu qualquer condição de liderar o país nessa crise; ele tem que sair. Ele desinforma e atua como aliado da pandemia”, critica Boulos.
 
“Ninguém mais aguenta este governo”, avalia Stédile. “Bolsonaro deu demonstração de que é um irresponsável e está contra a ciência. Não tem condições morais de liderar. Felizmente, estão assumindo esse papel os governadores, em particular, o consórcio do Nordeste, atuando de forma conjunta e coordenada.”
 
Os governadores, contudo, têm um raio de ação limitado por falta de recursos e de prerrogativas legais de alcance nacional. Por exemplo, diz o dirigente do MST, não podem proibir empresas transnacionais e bancos, como deveria fazer o governo federal, de mandarem recursos para fora do país — R$ 35 bilhões nos últimos dias. “Além disso, temos no Brasil apenas 206 bilionários, que controlam grande parte da nossa riqueza — R$ 1,2 trilhão. O governo pode tomar uma medida radical, compulsória, de impor um Imposto de Renda extraordinário, de 10% a 15%, e iríamos arrecadar R$ 180 bilhões para injetar na economia e garantir um novo modelo. Esperamos que a sociedade brasileira debata esse documento e vá acumulando forças para mudar o governo.”
 
Na impossibilidade de realizar manifestações de rua, Stédile reconhece o papel das demonstrações feitas nas janelas, onde há mais de dez dias acontecem protestos contra o governo. “Não podemos ir para a rua, então temos que ir para a janela. As janelas estão cumprindo um papel fundamental.”
 
 
 
* A divulgação oficial da Plataforma Emergencial para Enfrentamento da Pandemia do Coronavírus e da Crise Brasileira, pelo canal da TVT, teve a presença de Carmen Foro da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Guilherme Boulos do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Iago Montavão da União Nacional dos Estudantes (UNE) e João Pedro Stédile do Movimento dos Tralhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST).

 

Fonte: Senge-RJ