Ubiratan Félix, presidente do Sindicato dos Engenheiros da Bahia (Senge-BA) e representante da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) no Conselho Nacional das Cidades, comenta a sanção do Estatuto da Metrópole, avalia as atuais políticas públicas e aponta a reforma política como estruturante para o avanço da sociedade brasileira. Entre os principais fatos da conjuntura das políticas urbanas estão a indicação de Gilberto Kassab ao Ministério das Cidades (MinCidades), a luta pela reforma urbana e a necessária reforma política.
– O que muda com a sanção do Estatuto da Metrópole?
Do ponto de vista imediato, a mudança é quase imperceptível. A médio prazo, desde que haja vontade política, o estatuto poderá propiciar uma maior colaboração entre os entes federativos. É importante ressaltar que serão necessárias mudanças constitucionais, que limitem a autonomia municipal em questões que são de interesses de todos municípios de uma determinada região metropolitana. Além disto, constitucionalmente cabe aos estados a criação e a regulação das regiões metropolitanas (desde de 1988), logo teremos um grande caminho para o estabelecimento da governança metropolitana.
– Acredita que é possível a aplicabilidade do Estatuto?
Sim, mas é bom ressaltar que o estatuto tem diretrizes importantes para governança metropolitana, porém são necessárias mudanças constitucionais e leis complementares para sua plena aplicação.
– Como você avalia a indicação do Ministro das Cidades? De que forma avançar na luta pela reforma urbana no país?
A indicação no novo Ministro das Cidades se manteve coerente com a política do governo federal aplicada a partir de 2005. A novidade é que o PP que deteve o MinCidades neste período é substituído pelo PSD. Acho que esta é a principal mudança, enquanto o PP é um consórcio de deputados sem uma liderança visível, o PSD tem um líder inconteste, o ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, que é uma liderança com trajetória ascendente no cenário político nacional, e que tenta criar um contraponto ao poder do PMDB, no Governo Dilma. Logo, é um ministro forte com acesso direto à presidente e ao núcleo do poder. Do ponto de vista operacional , a presidenta continua controlando os programas habitacionais com a continuidade de Inês Magalhães na secretaria de Habitação do MinCidades, que tem poder de um ministro e acesso privilegiado à Presidência da República .
– O Brasil possui um déficit urbano muito alto. Algumas prefeituras, como a de São Paulo, tentam avançar em políticas urbanas como a política de IPTU progressivo. Qual a importância destas ações?
O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), no meu ponto de vista, é o principal instrumento para democratização do acesso à terra urbana e de aumento da arrecadação do municípios brasileiros. O problema é que existe muita demagogia neste assunto. De modo geral, o IPTU tem valor mais baixo que o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), – diga-se de passagem, que ninguém reclama -; e de taxas condominiais. Em São Paulo, o PT de Haddad é a favor do aumento do IPTU e o PSDB é contra, já em Salvador que o Prefeito é do DEM ocorre o contrário. O IPTU é imposto justo, porque penaliza a propriedade privada da terra e as terras ociosas. A capacidade dos ricos transferirem este ativo para o exterior (como fazem com dinheiro e ações) é nula.
– As tarifas do transporte público continuaram a subir e sem qualquer melhoria na qualidade dos serviços. Ao contrário, a sociedade assiste a gargalos enormes. Que sistemas podem ser viáveis?
Esta questão é mais complexa. Alguém tem de pagar o custo do investimento e da operação do sistema de transporte urbano. Logo, a tarifa pode ser zero, mas alguém tem de pagar o custo do sistema. No Brasil, quem paga o custo são os mais pobres, ou seja, o usuário do sistema de transporte. Em outros países, o sistema é custeado por toda sociedade através do orçamento geral do país ou por meio de imposto especifico. Eu resgato e defendo a proposta do engenheiro José Gregori, que foi Secretário do Governo Erundina (1988 a 1992), que defendia o aumento do IPTU com finalidade de garantir a gratuidade do sistema de transporte para todos. A gratuidade pode permitir o aumento da eficiência operacional com eliminação de linhas longas e ineficientes, pois o usuário pode pegar quantos ônibus forem necessários para chegar ao seu destino final. Além disto, temos de ter uma política, que penalize o uso do automóvel. Este item tem uma grande oposição política da classe média, da indústria automobilística e do setor dos trabalhadores, que são majoritários em algumas centrais sindicais.
– Que pautas serão centrais aos movimentos sociais?
A pauta é variada e complexa; e vai além das cidades. São necessárias: uma reforma tributária, uma reforma agrária e uma reforma política que, no meu ponto de vista, é a mãe de todas as reformas. Não é possível qualquer mudança substancial no Brasil sem uma profunda reforma política com financiamento público de campanha, além da democratização dos meios de comunicação.
Entrevista: Camila Marins/Fisenge