Em abril, a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos completou dois anos. Hoje, o Brasil é o campeão mundial no uso de agrotóxicos no cultivo de alimentos. São consumidos cerca de um bilhão de litros ao ano, o que representa 5,2 litros por brasileiro. De acordo com João Pedro Stédile, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), uma das maiores questões é que as empresas que comercializam o agrotóxico também são as produtoras de sementes transgênicas. “Este é o grande lobby das empresas, que precisamos combater. Estão em disputa duas grandes propostas, a do agronegócio e da agroecologia. O veneno, de origem química, não é biodegradável e contamina o solo, a água, e ainda provoca câncer, conforme estudo do próprio Instituto Nacional de Câncer (Inca)”, explicou.
De acordo com o engenheiro agrônomo e diretor da Fisenge, Jorge Dotti, todo direcionamento da agricultura mundial passa pelas mãos de três ou quatro multinacionais, que produzem agrotóxicos, e agora os transgênicos. “Ainda mais grave é a forma indiscriminada e o uso inadequado destes produtos químicos. A situação no meio rural é muito grave. No Brasil, temos situações de descontrole que não acontecem em nenhum outro país civilizado”, pontuou. E é nesse sentido que caminha a Campanha Permanente contra os Agrotoxicos, com o objetivo de denunciar o uso abusivo de agrotóxicos que, inclusive, foram banidos em outros países e que trazem sérios danos à saúde e ao meio ambiente.
A engenheira agrônoma e técnica da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Fran Paula de Castro, acredita que é preciso resgatar a agricultura tradicional livre de agrotóxicos. “Os ruralistas dizem que é impossível produzir em larga escala sem o uso de agrotóxicos. No entanto, há 50 anos, por exemplo, produzíamos sem veneno. O resgate do conhecimento tradicional e a aplicação de práticas agroecológicas são fundamentais para a mudança do modelo hoje praticado”, afirmou.
Um elemento bastante debatido entre os movimentos sociais e agricultores familiares é a falta de assistência técnica agroecológica. “A assistência técnica com prática agroecológica não chega aos assentamentos de reforma agrária, além de enfrentarmos uma enorme burocracia”, questionou Stédile. A engenheira agrônoma e diretora da Fisenge, Anildes Lopes argumenta que, mesmo com a aprovação da lei de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater), que aponta como diretriz a agroecologia, ainda são poucas as organizações que contemplam tais práticas. “A agroecologia para o pequeno produtor é fundamental, tanto para sua produção como para sua própria saúde. Temos que mobilizar para que a lei saia do papel e, efetivamente, seja colocada em prática a Política Nacional de Agroecologia”, detalhou.
A prática agroecológica tem o objetivo de resgatar a agricultura tradicional com preocupação social e ambiental, mas mesmo com avanços, ainda é pouco praticada. “A questão está na formação dos profissionais. Hoje, as universidades formam profissionais para atenderem o agronegócio. O grande gargalo é ainda a falta de uma reforma agrária no Brasil”, ratificou Fran. De acordo com Jorge Dotti, o currículo das escolas de agronomia são defasados, e não sintonizados com as demandas dos agricultores e do mercado. “Os pacotes tecnológicos da revolução verde ainda estão impregnados em professores e pesquisadores conservadores. O potencial e a necessidade de aumentarmos a produção agroecológica ou orgânica são imensos”, finalizou. Ainda sobre este ponto, Anildes ressalta o fato do financiamento de pesquisas em universidades pelo próprio agronegócio. “Existe um estímulo muito grande para a pesquisa e o uso de sementes modificadas. A agroecologia é estratégica para uma verdadeira reforma agrária no país com soberania nacional”, disse Anildes.
O sumiço das abelhas
Mais conhecido como “Desordem do Colapso das Colônias”, o fenômeno do sumiço das abelhas ganhou relevância nos Estados Unidos, em 2006, quando milhões de colmeias desapareceram. Um dos responsáveis por esta situação pode ser o agrotóxico aplicado. “Muitas pesquisas já vêm apontando o sumiço de insetos. Não somente abelhas, como também as joaninhas, por exemplo, que cumprem papel essencial para o equilíbrio do ecossistema. Um estudo da Escola de Saúde Pública de Harvard, com 20 colmeias, usando aplicação de inseticidas, determinou que a partir da 23ª semana, 15 de 16 colmeias tinham desaparecido. No Brasil, a perda das colônias atinge 5 a 6%, das cerca de dois milhões de colmeias consideradas.