Norma atual prevê desconto apenas para quem é filiado a sindicato, ministro vai pedir mudança para abranger todos os trabalhadores
BRASÍLIA – O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Antonio Levenhagen, defende que os sindicatos têm o direito de retirar uma parte do salário do trabalhador brasileiro, mesmo que ele não seja filiado, para arcar com as despesas da entidade de classe. O ministro é a favor de que a contribuição assistencial volte a ser descontada uma vez por ano de todos os trabalhadores, independentemente da filiação sindical.
Atualmente, o precedente normativo do TST só permite que a contribuição assistencial seja descontada do empregado sindicalizado. Assim como o imposto sindical – descontado na folha de pagamento de março e equivalente à remuneração de um dia de trabalho -, a contribuição assistencial também está prevista na Constituição e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas não há definição legal sobre o valor e a forma como ela é descontada do salário do trabalhador.
A legislação trabalhista diz que esses fatores devem ser definidos por meio de acordo ou convenção coletiva, mas há casos em que sindicatos conseguiram arrecadar até 20% do salário-base de um mês do ano de cada um dos filiados. Ou seja, a contribuição tem muito mais impacto no caixa das entidades do que o imposto sindical. O Ministério do Trabalho não faz levantamento do valor total da contribuição sindical nem de como é feita a distribuição entre as entidades.
“Os sindicatos estão em polvorosa com esse precedente normativo. Se o acordo vale para todos, por que só o sindicalizado contribui e o outro trabalhador que vai receber os mesmos benefícios não contribui?”, questiona Levenhagen. “Eles entram na negociação, conseguem vantagens para toda a categoria, mas só recebem a contribuição que serve para a manutenção da entidade daqueles que são sindicalizados. Os sindicatos não deixam de ter razão e isso acaba desmotivando na hora das negociações.”
O normativo anterior do TST permitia que a contribuição assistencial fosse descontada de todos os trabalhadores, com exceção daqueles que redigiam um termo pedindo para não pagar. Para Levenhagen., o órgão da cúpula da Justiça do Trabalho deve retomar a discussão para, provavelmente, voltar à orientação que vigorava antes, embora seja um tema “difícil”. Para isso, ele teria que pedir à comissão de jurisprudência do TST, que reúne três ministros, um posicionamento sobre o tema, que depois seria levado ao plenário, que reúne todos os ministros.
Ele afirma que os sindicatos precisam muito desses recursos para a manutenção das entidades, que também desenvolvem outros projetos. “Muitos sindicatos oferecem aos seus integrantes benefícios que o Estado deveria promover e não fornece”, diz, citando como exemplos, assistência médica, odontológica, práticas esportivas, entre outros.
Levenhagen diz que essa é uma das questões que deveriam ser debatidas dentro de uma reforma sindical, mas não acredita que se tenha condições de implementá-la. “Talvez seja mais fácil fazer a reforma tributária”, brinca. “Seria temerário da minha parte dizer o que fazer porque como magistrado cabe a mim apenas interpretar a Lei, mas a situação é difícil”, afirma.
O assunto também não encontra consenso no Ministério Público do Trabalho, mas o entendimento predominante é que deve se manter a jurisprudência atual – descontar a contribuição assistencial apenas dos sindicalizados – em parte devido à atuação das entidades. “Falta transparência aos sindicatos. Todo mundo presta contas no País, menos essas entidades. Algumas não dão satisfação nem mesmo às categorias que representam”, sentencia o procurador regional do trabalho Francisco Gérson Marques de Lima, presidente da Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical (Conalis).
Ele afirma que modelo de custeio do sindicalismo é “antigo e arcaico” e contribui para que sejam criadas entidades de fachadas. “Como não tem ninguém fiscalizando, é uma porta aberta até mesmo para organizações criminosas”, afirma. Lima defende que, se o TST promover uma alteração no normativo sobre a contribuição assistencial para permitir a cobrança inclusive dos trabalhadores não sindicalizados, é preciso colocar um limite para essa contribuição – em torno de 6% do salário-base, defende. Ele afirma que há casos em que foram descontados 20% do salário, bem acima do próprio reajuste que o sindicato tinha conseguido, que normalmente gira em torno da inflação acumulada no ano anterior.
Segundo o procurador, o trabalhador não sindicalizado deve ter resguardado o direito de não permitir que a contribuição seja descontada do salário, sem que os sindicatos estipulem prazos e exigências descomedidas – como ser obrigado a ir à sede da instituição pessoalmente para assinar a recusa – que, na prática, impediam que o trabalhador se opusesse ao desconto.
Lima também questiona convenções que decidem colocar a contribuição assistencial na conta das empresas. “Isso é pior ainda porque, além de ilegal, faz com que os sindicatos fiquem nas mãos das empresas porque a maior parte que entra no caixa deles é decorrente dessa contribuição”, afirma.
Multas. Levenhagen vai baixar um ato específico, no início do segundo semestre, para acelerar a resolução de um dos principais problemas da justiça trabalhista no Brasil – a baixa execução dos processos.
A ideia de Levenhagen é tornar obrigatório que o juiz de primeira instância faça um levantamento nos processos já decididos por ele, e convoque a parte derrotada para o tribunal, de forma a esquematizar o pagamento da multa ou qualquer que tenha sido a decisão. Este procedimento final, chamado de “execução” do processo, é uma das principais deficiências da justiça trabalhista brasileira.
Nem mesmo a sanção da Lei 12.440 pela presidente Dilma Rousseff, em 2011, considerada um “marco” para dinamizar a execução dos processos na área, serviu para resolver o problema. A lei criou o Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT), que instituiu uma espécie de “SPC das empresas com dívidas trabalhistas”. A lógica era simples: uma empresa derrotada em sentença ou acordo judicial já transitado em julgado que esteja inadimplente teria seu nome inscrito no BNDT e, assim, ficaria sem a certidão negativa.
“A execução é uma preocupação de todo o Judiciário, mas ela ganha conotação de dramaticidade na justiça trabalhista, porque há a peculiaridade da verba. Agora queremos que o juiz chame o devedor à vara trabalhista e alertar que se o débito não for pago, ele pode ser apenado com uma multa”, disse Levenhagen. “Esta é uma aplicação subsidiária à execução trabalhista”, explicou.
Quando corregedor nacional da justiça do Trabalho, Levenhagen já tinha lutado para que os corregedores regionais pressionassem os juízes a adotar esse caminho, uma espécie de conciliação para agilizar a execução. Agora, como presidente do TST, ele vai trabalhar para tornar esse caminho obrigatório.
“O magistrado está se alheando da discussão, ele não está mais presente na discussão. Isso se deve principalmente ao uso da tecnologia da informação. Os magistrados, inconscientemente, passaram a ficar alheios, e passaram a execução a auxiliares da vara. Nesses processos se não tiver a presença do juiz, a história fica lenta. O juiz não pode deixar de estar presente na execução, é o momento mais delicado. É a materialização do direito, da decisão”, afirmou o novo presidente do TST.
Murilo Rodrigues Alves e João Villaverde, da Agência Estado