Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Ameaçado de morte por sua atuação como um dos líderes do povo Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul, Elizeu Lopes disse, no dia 31, que a decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), em São Paulo, de suspender a liminar judicial que poderia resultar na retirada de um grupo de 170 índios de uma fazenda localizada em Iguatemi (MS) não resolve o conflito que afeta várias outras comunidades indígenas sul-mato-grossenses.
“A decisão do dia 30 foi positiva, mas, para nós, ainda não é um bom resultado. Para nós, a justiça, os governos, estão deixando nossas comunidades abandonadas”, disse Lopes, durante audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, esta manhã, na sede do Conselho Federal de Psicologia.
Segundo Lopes, após décadas esperando que o Estado demarcasse novos territórios indígenas e desse um basta ao grave conflito fundiário entre índios e produtores rurais que se estabeleceram na região ao longo do século passado, os guaranis kaiowás de Mato Grosso do Sul decidiram ocupar e lutar pelas terras que afirmam terem pertencido aos seus antepassados.
“Estamos sofrendo há mais de 30 anos, lutando por nossos territórios, pela nossa terra, acampados a margem de estradas, sem condições de sustentar nossas famílias e ter uma vida tranquila, sem atendimento médico e com nossos filhos tomando água suja e muitas vezes impedidos de estudar. Somos as maiores vítimas da violência e não aguentamos mais. Por isso, decidimos ocupar nossos territórios”, disse Lopes, garantindo que, com a decisão indígena de intensificar a ocupação de terras onde hoje estão instalados grandes produtores de soja, cana-de-açúcar e gado, boa parte deles legitimados pelo Estado, aumentaram os conflitos.
“Fazendeiros continuam nos atacando com seus pistoleiros e não têm mais vergonha de dizer na frente das câmeras que vão derramar ainda mais sangue dos guaranis kaiowás. Mesmo assim, vamos continuar lutando, ocupando nossas terras. Não tem como voltarmos atrás nesta decisão porque já aguardamos muitos anos e não queremos mais promessas nem discursos. Queremos a demarcação de nossos territórios”, concluiu Lopes, descartando a hipótese dos 170 membros da Comunidade Pyelito Kue, em Iguatemi, a cerca de 460 quilômetros da capital sul-matogrossense, Campo Grande, se suicidarem, caso fossem obrigados a deixar os dois hectares da fazenda que pleiteiam como sendo um território tradicional indígena.
Presidente em exercício da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), visitou áreas em conflito no final do ano passado. Na época, fazendeiros chegaram a tentar impedir a comitiva, da qual também faziam parte os deputados petistas Domingos Dutra (MA) e Padre Ton (RO) e agentes da Polícia Federal, de chegar até as áreas ocupadas por grupos indígenas.
“O nível de enfrentamento é intenso e, a nosso ver, não será resolvido sem a participação dos entes públicos, inclusive com mudanças legislativas e a eventual possibilidade de os produtores serem indenizados para deixarem a área”, disse a deputada, informando que a comissão encaminhou à presidenta Dilma Rousseff, uma carta manifestando a preocupação com a situação e pedindo a adoção de medidas que ajudem a resolver os conflitos.
“As soluções e possibilidades só podem ser concretizadas se houver, por parte do governo, a decisão política de resolver o problema. Podemos dizer que há um processo de etnocídio em curso,” disse a deputada.
Edição: Carolina Pimentel