Sobre os cortes na educação, engenheiro afirma: “os mais pobres serão os mais prejudicados”

Share on facebook
Share on twitter
Share on whatsapp
Share on email

O governo federal anuncia, desde o início deste ano, cortes no Orçamento que impactam áreas fundamentais para a soberania do país como educação, ciência e tecnologia. Ainda em maio, o Ministro da Educação, Abraham Wintraub afirmou que três universidades federais – UFF (Universidade Federal Fluminense), UFBA (Universidade Federal da Bahia) e UnB (Universidade de Brasília) – teriam 30% do orçamento cortado sob a justificativa de promoverem “balbúrdia. Tal declaração fere a autonomia universitária garantida no artigo 207 da Constituição. As três universidades mencionadas são bem avaliadas, com nota 5, o valor máximo no desempenho do Índice Geral de Cursos (IGC) do próprio MEC. Por meio de nota, a UFBA destacou: “Somos a primeira universidade do Nordeste, a 10ª brasileira e a 30ª da América Latina no ranking Times Higher Education (THE), da revista Times, que avalia 1.250 universidades de 36 países. Apenas 15 brasileiras estão entre as 1.000 melhores do mundo. (…) UFBA reafirma-se enquanto espaço democrático e dinâmico”.

Ressalte-se que a UFBA possui um escritório de engenharia pública que promove importantes ações com a sociedade. A universidade ainda é responsável pela descoberta do Zika vírus no Brasil, por pesquisadores do Laboratório de Virologia. Outra referência é a pesquisa de geoquímica do petróleo no Recôncavo baiano, por meio do Centro de Excelência em Geoquímica do Petróleo, o chamado Projeto Geoqpetrol.

Com 27 anos de atuação como professor do Instituto Federal da Bahia (IFBA), o engenheiro civil, Ubiratan Félix, repudiou os cortes. “É um desastre para os serviços das universidades e dos institutos, porque cortam verbas de custeio. Isso significa que atingem serviços de apoio, limpeza e segurança que são, em sua maioria, terceirizados”, sublinhou Ubiratan que também é vice-presidente da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) e presidente do Sindicato dos Engenheiros da Bahia (Senge-BA).

Criado em 2013, o “Bolsa Permanência” também corre risco. O programa foi instituído com o objetivo de apoiar estudantes em situação de vulnerabilidade social. “A permanência de estudantes carentes será inviabilizada, pois os cortes podem acabar com o apoio à alimentação, moradia, pesquisa e extensão. Os mais pobres, mais uma vez, serão os mais prejudicados”, avaliou Ubiratan.

Após o anúncio, o Ministério da Educação foi além e declarou cortes ainda maiores, atingindo as universidades e os institutos federais de todo país, o que poderá inviabilizar o acesso à educação pública e gratuita.  Em nota, o reitor do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), Rafael Almada, informou que “a atual gestão da reitoria do IFRJ reforça o compromisso de levar educação pública, gratuita e de qualidade a diversas regiões do Estado do Rio de Janeiro, priorizando a oferta de ensino às populações de baixa renda, propiciando a jovens e adultos uma real possibilidade de inserção no mercado de trabalho, através de qualificação profissional e de formação cidadã. O IFRJ entende que a Educação é sempre um investimento no desenvolvimento do nosso país”.

O IFRJ teve corte de 32,6%, mais de 16 milhões de reais. Já ingressaram na instituição 5.685 novos estudantes, atingindo um número de 16.798 estudantes matriculados e com 3.303 estudantes que alcançaram o seu diploma e conclusão do curso. Mais do que ensino e pesquisa, os institutos federais têm como atribuição o desenvolvimento social e econômico dos territórios, fortalecendo as potencialidades regionais em cidades do interior e periferias.

O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES) repudiou o cortes e ratificou que irá responder com mobilização. Entre 2003 e 2014, foram criadas 18 novas universidades federais, 173 campus universitários e 360 unidades de institutos federais por todo o país.

Engenheira repudia cortes: “É um atraso”

Para a engenheira agrônoma, diretora nacional da Mútua e diretora da Fisenge, Giucélia Figueiredo, a determinação do Ministério da Educação representa um ataque a uma das principais instituições brasileiras, produtora de ciência, inovação e tecnologia, ferramentas fundamentais para o processo de desenvolvimento sustentável do país. “Enquanto os países desenvolvidos investem maciçamente em ciência e tecnologia, o governo Bolsonaro vai na contramão da história e do que acontece no mundo. Na Paraíba, foi criada a Frente Parlamentar de Ciência, Tecnologia e Inovação, numa demonstração que o parlamento paraibano e o Governo do estado compreendem a importância da ciência e da tecnologia para o desenvolvimento regional e, ao contrário do governo federal, investem na produção tecnológica”, comentou Giucélia.

De acordo com ela, é importante que a bancada federal se una à defesa das universidades, mostrando a importância dessas instituições públicas e gratuitas no processo de desenvolvimento sustentável regional e nacional. Com o investimento de mais de R$ 200 milhões na área, atualmente, a Paraíba ocupa a 9ª posição no ranking da inovação tecnológica.

“Toda produção científica será prejudicada”, alerta estudante

Essa linha de cortes em áreas fundamentais para o país começou em dezembro de 2016, quando o governo de Michel Temer aprovou a política do “teto dos gastos” por meio da Emenda Constitucional (EC) nº 95. A medida asfixia o orçamento de áreas da saúde, educação e assistência social por 20 anos, congelando os investimentos sociais em porcentagem per capita (por pessoa) e em relação ao PIB.

A estudante de engenharia ambiental da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e integrante do Coletivo Nacional de Estudantes da Fisenge, Marília Cavalcante, lembrou que as universidades já sofriam com o sucateamento desde o governo Temer com a EC 95. “As universidades estão se mantendo a duras penas, em um processo de resistência. Sucatear a universidade afeta não apenas quem trabalha ou frequenta, como também toda a sociedade”, justificou Marília, que ainda acrescenta: “vejo uma perseguição ideológica contra o ensino público, gratuito e de qualidade. Toda a produção científica será prejudicada. Essa medida irá dificultar ainda mais o acesso de pessoas mais pobres às universidades e condicionar nossa sociedade à completa dependência”.

O estudante de agronomia na Universidade Rural do Semi-Árido, Jonas de Sousa, acredita que os cortes na educação pública afetam diretamente jovens e adolescentes que estão nas instituições estaduais e federais e de educação básica. “O ensino, a pesquisa e a extensão são o tripé da educação, que contribuem, de forma qualitativa e quantitativamente, para o bem-estar social. O que está acontecendo é um projeto de desestruturação educacional que irá afastar o jovem do cenário acadêmico”, disse, ressaltando que “é importante defendermos nossas instituições para que as próximas gerações tenham acesso à educação pública, gratuita e de qualidade, produzindo conhecimento nas mais diversas áreas em defesa da soberania científica nacional”.

Texto por Camila Marins

Foto: Ascom/MCTIC