No dia 27 de novembro, uma rodada de debates e painéis marcou a fundação do Comitê Fluminense em Defesa do Pré-sal. O seminário “O pré-sal é do povo brasileiro” contou com a presença de convidados que abordaram sob aspectos geológicos, econômicos e políticos a questão da nova descoberta como ponto de defesa da soberania nacional. Ao final do encontro, o diretor do Senge-RJ, Olímpio Alves dos Santos, pediu o empenho das mais de cem pessoas presentes na luta pela alteração dos marcos regulatórios e defesa do pré-sal.
Até o dia 14 de dezembro, entidades e movimentos sociais participarão de reuniões para estruturar o ato contra a décima rodada de licitações para concessão de novas áreas de exploração de petróleo, que acontecerá no dia 18 de dezembro. Uma vigília está programada para começar às 17h do dia 17, na Candelária. O objetivo não é só o de barrar a rodada, mas cancelar todos os demais leilões e alterar o marco regulatório do petróleo.
O pré-sal e a soberania
O geólogo João Victor Campos apresentou o primeiro painel, que tinha como tema “A última fronteira”. Segundo João Victor, as principais concentrações de petróleo no mundo estão em sua maioria situadas em áreas-limite das placas tectônicas. “No caso do pré-sal, sua origem se dá com a separação entre Brasil e África. Nos primeiros estágios, o mar invadiu a fissura que se formou entre essas duas regiões, formando extensas camadas de sal. Grande quantidade de matéria orgânica foi depositada, o que gerou o petróleo que temos”, afirmou o palestrante. De acordo com João Victor, a Petrobras estima em 80 bilhões de barris a capacidade de produção da camada pré-sal, que tem extensão de 160 mil km2.
O painel “Pré-sal – desenvolvimento e soberania”, mediado pelo presidente do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas do Rio de Janeiro, Jeferson Salazar, e que teve como palestrantes os economistas César Benjamin e Carlos Lessa, debateu o pré-sal no contexto da crise econômica mundial. “Se tivermos uma adaptação passiva à crise, o pré-sal vai ser mais um produto de exportação. Será usado para compensar o furo na balança comercial. Em contrapartida, se o Brasil se posicionar ativamente, com a reformulação de seu sistema produtivo, aí o pré-sal muda seu papel. Passa a ser visto de forma estratégica, como oportunidade de investimento. Mas para que isso aconteça é evidente que se deve mudar o marco regulatório do petróleo”, afirmou Benjamin.
Carlos Lessa também debateu os rumos do pré-sal no contexto da crise, mas trouxe à tona uma questão relacionada à segurança nacional. Ele expôs o fato de os Estados Unidos serem um dos únicos países a não reconhecer o mar territorial na ONU, ligando isso ao fato de o país ter reativado a 4º Frota – que tinha sido desativada no fim da Segunda Guerra e voltou a operar nos mares da América do Sul em julho. “O pré-sal recisa ser pensado como questão de segurança nacional. A 4ª Frota foi reativada depois mais de 40 anos. Os EUA continuam não reconhecendo o direito ao mar territorial. Isso não é à toa”, disse.
Crise
Para César Benjamin não há discussão verdadeiramente amadurecida sobre os rumos do país diante da crise financeira mundial. “Estou bastante preocupado com a posição que considero fraca do Brasil com relação à dimensão da crise”, apontou o economista. “O Brasil entra com um grau de vulnerabilidade muito maior do que imaginamos, justamente porque não discute um projeto político de fortalecimento efetivo da nação. A política do país não debate os grandes temas nacionais, os interesses sociais”, afirmou.
Benjamin esclareceu que quando um país opera muito tempo com uma moeda valorizada, a tendência é de ficar em desvantagem nas exportações, exceto com produtos nos quais haja alta vantagem competitiva. No caso do Brasil, esses produtos são as commodities. “Isso fez com que houvesse uma reprimarização da nossa pauta de exportação. A elevação do preço das commodities refletiu na elevação das arrecadações com exportação”, explicou. “No entanto, mais de 80% do que entra no Brasil sai como serviços e rendas. Para o futuro há um quadro de aumento de remessas de recursos para o exterior, déficit de serviços e rendas e déficit na conta-corrente. Isso cria condições ideais para um ataque especulativo às nossas reservas internacionais”, alertou o economista.
Lessa afirmou que o Brasil possui uma das mais promissoras matrizes energéticas do mundo, mas que faltam investimentos em infra-estrutura. De acordo com o economista, as análises de que o Brasil está blindado para enfrentar a crise são frágeis, pois se apóiam apenas nas reservas internacionais do país, que atualmente somam US$ 207,5 bi. “Só há uma maneira de preservarmos nossa reserva internacional, que é centralizar as operações financeiras através do Banco do Brasil. Se perdermos essa reserva, vamos fatalmente ver nosso pré-sal ser entregue e o Brasil ser colocado na posição apenas de produtor de petróleo”, analisou.
Marco regulatório e monopólio
No terceiro painel, o professor da USP e ex-diretor de Gás e Energia da Petrobras, Ildo Sauer, expôs a importância estratégica da Petrobras como única empresa a ter preparação técnica e tecnológica para atuar na exploração e gerência do pré-sal. “O sucesso da Petrobras está em sua força de trabalho. O pré-sal é resultado de uma estratégia histórica da empresa. Ninguém mais no mundo, além da Petrobras, conhece onde estão os recursos naturais. É uma falácia dizer que a empresa não terra dinheiro para investir na descoberta”, desabafou. “Isso me parece uma ação orquestrada para desmoralizar a Petrobras e dizer que ela precisa da ajuda de investidores. O que será mais uma maneira de tentar privatizar o nosso patrimônio”, disse Sauer.
O diretor da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet), Fernando Siqueira, avalia que se a União for detentora do petróleo, a riqueza produzida será suficiente para mais de 50 anos. “O monopólio estatal não foge do controle da sociedade, mas um oligopólio privado é incontrolável. Ao contrário, é capaz até de controlar os governos locais. Não faltarão recursos para quem for proprietário do petróleo. Nós temos uma riqueza capaz de tirar o Brasil de qualquer crise financeira”, disse.
Para o dirigente, os royalties do petróleo precisam ser distribuídos para todo o país, de forma mais equânime. “Os royalties não podem ficar restritos só a meia-dúzia de estados. Se não forem distribuídos de forma social e economicamente justa, facilmente os royalties serão derrubados no senado. É preciso que a legislação estabeleça que os royalties devam ser aplicados em questões sociais: educação, saúde, moradia”, finalizou.