“Acho que na sociedade atual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objetivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objetivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma”. Este é o último texto publicado no blog do escritor/pensador e ativista português José Saramago, que faleceu hoje pela manhã, em sua residência, nas Ilhas Canárias.
Saramago era uma caixinha de surpresas. Apesar da sua vasta cultura, o único diploma que possuía era o de mecânico. De origem humilde, trabalhou como serralheiro, mecânico, editor e jornalista. Escolheu a literatura porque não gostava do mundo em que vivia. “Nossa única defesa contra a morte é o amor”, costumava dizer Saramago. E ele se protegeu, apesar de saúde frágil, dando provas de que amou tanto o quanto pôde e da melhor maneira.
Seus inúmeros romances abordam os principais problemas do ser humano e não há quem saía ileso após a leitura de seus livros, até porque seus personagens são cobertos de dignidade. Pelo conjunto da obra recebeu, em 1988, o Prêmio Nobel de Literatura. A morte o surpreendeu quando preparava um romance sobre a indústria do armamento e a ausência de greves neste setor, ou pelo menos essa era a ideia que queria desenvolver, como disse quando apresentou seu último livro, “Caim”, em novembro de 2009, a Agência Efe.
Saramago era um defensor dos oprimidos do mundo. Veio algumas vezes ao Brasil, mas inesquecível mesmo foi a sua vinda para lançar o livro Terra, do fotógrafo Sebastião Salgado, baseado no trabalhador do campo, em especial nos que integram o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST). Após o lançamento, no Instituto de Filosofia da UFRJ, Saramago participou de debate na praça, ao lado do próprio Sebastião Salgado, Gilmar Mauro (MST) e do economista Celso Furtado. As mesas dos palestrantes foram colocadas no meio da rua, atraindo gente simples do povo, estudantes, ativistas e a imprensa. Era assim que ele se sentia bem, ao lado de gente que pensa e lutando pelos que mais precisam. Os ativistas sociais vão sentir sua falta. Sai do front um grande militante.
Fonte: Agência Petroleira de Notícias