Especialistas avaliam que agenda nacional precisa ser desenvolvimentista e inclusiva
A reconstrução do Brasil, do ponto de vista econômico, ambiental e social foi tema das palestras da manhã do 13º Congresso Nacional de Sindicatos de Engenheiros (Consenge). Neste segundo dia, os especialistas falaram da necessidade de construção de uma agenda nacional diferente da que vinha sido adotada nos últimos anos. Nesta nova agenda, o rentismo deve dar lugar à economia popular e os juros, ao aumento de renda das famílias.
A questão urbana deve ser vista como direito dos cidadãos brasileiros e o campo dar espaço para agricultura familiar e agroecológica. Um novo pacto foi defendido pelos palestrantes Ladislau Dowbor, Tainá de Paula e Gilmar Mauro. Para eles, é preciso enfrentar a destruição que o capital e a agenda extremista impuseram ao país nos últimos anos.
O rentismo consome o desenvolvimento brasileiro
O professor titular de pós-graduação da PUC-SP e consultor da ONU, Ladislau Dowbor, falou sobre “a reconstrução do Brasil” e de uma política pública que possa superar as desigualdades.No caderno tese do 13o Consenge, ele afirmou que a desigualdade se tornou o grande obstáculo estrutural ao desenvolvimento do país. O professor mostrou os magnatas brasileiros, aqueles que afundaram as lojas Americanas e estão comprando ações de empresas públicas como a Copel, e como eles exercem a dominação econômica no país.
“São grupos poderosos, muito articulados com o sistema financeiro internacional. O ponto chave é que entre o poder econômico e financeiro, com as suas ramificações políticas, e os interesses do desenvolvimento do país, gerou-se uma ruptura. O enriquecimento das elites passa pelo dreno de riquezas, não pelo investimento produtivo”, comentou Ladislau Dowbor.
Durante o congresso, o especialista chamou atenção para a liquidez da moeda e do uso dos juros como modelo econômico que estrangula o desenvolvimento nacional e a população. Destacou, também, que a taxa Selic, no resto do mundo, é menor de 1,5%. No Brasil, está em 13,25%, em uma economia estagnada desde 2013.
“É um sistema generalizado de agiotagem. Literalmente se mete a mão na grana pública com essa taxa Selic. Quando o Governo eleva a taxa básica de juros (Selic) para 13,25%, este valor será pago pelo próprio Governo aos detentores privados dos títulos da dívida pública, basicamente os 10% mais ricos da sociedade, usando os impostos que pagamos”, esclareceu Dowbor..
O desenvolvimento sustentável e democrático para a questão urbana
Tainá de Paula, que é arquiteta, vereadora e secretária municipal de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, abordou “Os múltiplos desafios da questão urbana brasileira”. Para ela, cada vez mais acontecem desastres, ocorrências climáticas muito fortes e de longo alcance. Para enfrentar esses riscos, a discussão da agenda urbana brasileira passa pela reconstrução da própria agenda em si, definindo quais são os novos marcos, quais são os novos legados e os desafios do futuro que se precisa estabelecer e enfrentar.
A palestra dela enfatizou a Mobilidade Urbana, o programa Minha Casa Minha Vida, o papel da Lei de Assistência Técnica, o que é cidade de resiliência, o cenário ambiental nas favelas e periferias e o marco legal do saneamento básico.
“Nós vivemos uma desconstrução da máquina pública, de como essa estrutura, esse pacto federativo, se orienta e se organiza, do nosso Ministério das Cidades. A desconstrução do processo da agenda urbana brasileira, que a democracia recente nos havia proporcionado. Precisa ser recomposta e reconstituída a governança popular e democrática, os conselhos, a participação popular conjunta, o fazer coletivo, as iniciativas pioneiras, como os mutirões, a autogestão e todas as discussões da nossa base popular contemporânea”, avaliou a arquiteta.
A secretária municipal de meio ambiente do Rio de Janeiro ainda destacou o novo PAC e o programa Minha Casa, Minha Vida. “É preciso enfrentar o desafio da escala, algo que tanto o presidente Lula como a presidenta Dilma brilhantemente reforçaram. Mas a escala não deve ser um fator de preterimento da qualidade urbanística, arquitetônica e da tecnologia aplicada a essas construções que nós realizamos. Nós pioramos a qualidade de vida nos últimos 30 anos. Falta saneamento básico. Não entregamos moradias no último governo. Já o agronegócio e a soja comeram nosso campo. Bolsonaro lambeu nossa floresta”.
Um novo pacto ambiental e de produção de alimentos
Já Gilmar Mauro, que é da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Teto, falou sobre a “Crise biosociopolítica e Transformação Social”. Em sua exposição, ele trouxe a estimativa de que 850 milhões de pessoas no mundo passam fome e mais de 2 bilhões estão em situação de insegurança alimentar. E o Brasil – país que havia saído do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2014, em decorrência da criação de Políticas Públicas voltadas à segurança alimentar e nutricional – agora figura novamente neste cenário.
Para ele, é necessário pensar em uma Reforma Agrária para além da distribuição fundiária, singularizando-a de acordo com as necessidades socioambientais brasileiras. É preciso aproximar o campus do campo para que ocorra a transformação do modelo de produção, industrialização e distribuição dos recursos naturais, bem como dos paradigmas tecnológicos, que precisam, também, ser repensados.
“A Reforma Agrária poderá, imediatamente, atender a milhões de famílias sem-terra, mas é preciso que a sociedade reflita sobre novos paradigmas tecnológicos que caminhem no sentido do bem-estar socioambiental, como é o caso da agroecologia. Hoje, 60% da produção mundial é composta por quatro produtos:soja, arroz, milho e trigo. Uma parte da população mundial passa fome e a outra come mal, apontou .
Gilmar Mauro enfatizou três questões principais a serem enfrentadas: a questão econômica, agrária e o movimento social. “A ordem do capital é insustentável do ponto de vista social, econômico, ambiental e político. Não haverá sustentabilidade enquanto existir capitalismo no planeta”, alertou.