Projeto do Marco Regulatório da Mineração mantém antigos privilégios do capital

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Movimentos sindical, social e ambientalistas unificam luta para barrar a iniciativa; entidades argumentam que proposta não tem embasamento social
É inegável que o Brasil necessita de um novo marco regulatório da mineração, mas nos moldes como está proposto no Congresso atende apenas aos interesses de uma minoria em detrimento da soberania nacional e da preservação dos recursos naturais.
O modelo vigente é da década de 1940, reformado em 1967, período em que o Brasil vivia sob o regime de opressão e, portanto, reflete as condições político-administrativas da época.
Lourival Andrade, presidente do Instituto Brasileiro de Educação, Integração e Desenvolvimento Social (IBEIDS) explica que não existem critérios para a exploração das jazidas de minério. O sistema aplicado hoje é o de ‘quem chega primeiro na fila’. “É o formato utilizado em todas as capitais. Empresas que controlam as concessões possuem empregados que passam sua vida na fila e ali se aposentam. A mineradora solicita o requerimento de pesquisa e confirmada a viabilidade pede a licença para exploração da jazida”, relata.
Para Andrade, o governo acerta em propor um novo Marco Regulatório da Mineração, porém se equivoca quando constrói uma proposta sem participação dos atores sociais. “Foi uma proposta articulada pela tecnocracia brasileira. É uma iniciativa sem capilaridade e legitimidade social.”
Em junho do ano passado, o Executivo encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei 5.807/13 que dispõe sobre a atividade de mineração. A proposta que já era frágil ficou ainda pior a partir da tramitação no Parlamento.
O projeto foi encaminhado para análise de uma comissão especial da Câmara, cujo relator é o deputado federal Leonardo Quintão (PMDB-MG). Foram apresentadas mais de 320 emendas que atendem apenas aos interesses de mineradoras e do mercado internacional.
Das 30 audiências públicas realizadas no período, a participação da sociedade civil foi quase nula. Andrade ressalta que são mais de duas mil cidades com mineração formalizada e legal, mas dessas audiências, apenas 10 ocorreram fora de Brasília.
“O projeto se tornou uma colcha de retalhos moldado aos interesses mercantilistas, comerciais e eleitorais”, critica o presidente do IBEIDS, citando como exemplo a criação da Agência Nacional da Mineração (ANM), prevista no Marco Regulatório, que praticamente retira do Estado à autonomia de planejamento e definição das políticas sobre os recursos naturais do País. “As mineradoras vão dialogar diretamente com uma autarquia e isso poderá resultar na flexibilização de direitos trabalhistas, da legislação ambiental e das formas de licença, concessão e fiscalização, precedente para um verdadeiro balcão de negócios.”
Conflito de interesses – entidades da sociedade civil protocolaram no dia 6 de maio um requerimento contra o deputado Leonardo Quintão por quebra de decoro parlamentar.
Segundo a representação, há um conflito de interesses em relação à escolha do deputado para relatoria do Projeto. Na campanha de 2010, cerca de 20% das doações ao parlamentar vieram de empresas mineradoras. E na relatoria do Marco Regulatório Leonardo Quintão têm defendido de forma irredutível os interesses desse setor.
Dispositivos do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara proíbem os deputados de relatarem matérias de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído para o financiamento de campanhas eleitorais.
No dia 14, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, arquivou o requerimento apresentado pelas entidades. “Casos como esse mostram a importância de uma reforma política ampla e profunda que possibilite uma mudança na atual correlação de forças nos poderes instituídos”, argumentou Andrade.
– A política está chata? Vamos mudá-la
Sociedade civil na luta- a unidade entre centrais sindicais (CUT, CTB e Nova Central), entidades do movimento sindical, ambientalistas e lutadores sociais conseguiu barrar até o momento a votação do Projeto.
O conjunto de entidades reivindica a imediata retirada de tramitação do PL 5.807/13. A proposta é que o governo convoque uma Conferência Nacional da Mineração Brasileira para 2015, cujo cerne seria a construção de um texto que reflita a diversidade de interesses da sociedade brasileira.
– Acesse aqui o documento apresentado pelas entidades
“Antes de votar o projeto queremos a realização desta 1ª Conferência Nacional, com etapas municipais e estaduais, que envolva todos os setores interessados e atingidos”, disse Andrade.
O movimento também encaminhou ao ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, um ofício para que seja convocada uma reunião com o propósito de debater o novo Marco Regulatório da Mineração, “considerando as demandas do Brasil por seus bens minerais de forma a garantir o bom funcionamento das cadeias produtivas.”
Na visão das entidades são cinco os pontos cruciais:
– a forma de concessão que deverá ser feita a partir de licitação/contrato com condicionantes sociais e econômicas, similar ao modelo petrolífero e energético;
– que a Agência Nacional da Mineração cumpra seu papel e não seja um órgão voltado aos interesses comerciais e privados;
– garantia de condições dignas de trabalho. Segundo informações da Fundacentro, o setor de mineração é o que mais acidenta, adoece e mata trabalhadores;
– analise profunda dos impactos ambientais;
– respeito aos direitos das comunidades tradicionais atingidas;
Pelo projeto, haverá o aumento da alíquota da Contribuição Financeira sobre Exploração Mineral (CFEM) a ser paga como royalties pelas empresas. O valor passará dos atuais 1,8% para 4% e não será mais contabilizado a partir da receita bruta, mas sobre o faturamento final. Os atuais percentuais de distribuição dos recursos da CFEM serão mantidos: 12% para a União, 23% para os estados e 65% para os municípios.
Andrade rebate o argumento de que com o reflexo da crise e o aumento da alíquota haverá um recuou de investimentos no País. “Continuaremos abaixo da média internacional no que tange contrapartidas pela exploração de bens minerais. Como parâmetro, a tarifa mais alta cobrada na Índia é de 10%, na Austrália de 7,5% e no Canadá 18%, sem contar que no Brasil temos o minério de ferro mais barato do mundo para ser extraído”, assinalou.
Para ele, a urgência na aprovação do projeto não se justifica. “É preciso muito cuidado e uma análise profunda, pois este é um setor que destina matéria-prima e garante a pujança dos principais setores econômicos brasileiros. Mas para além da questão econômica, haverá graves impactos ambientais e sociais que devem ser levados em consideração”, acrescentou.
* com informações da Agência Brasil

Escrito por: William Pedreira