O uso de energias caras, produzidas sem planejamento, é uma consequências da privatização de empresas públicas na década de 90, segundo o engenheiro mecânico Antônio Gerson Ferreira de Carvalho. Ele lançou, na última quarta-feira (7), o livro “Gás Natural no Brasil: uma história de muitos erros e poucos acertos”, lançado pelo Sindicato dos Engenheiros do Rio de Janeiro (Senge-RJ).
Antônio Gerson é conhecido no setor por ser ex-superintendente de Gás da Secretaria de Estado de Energia, Indústria Naval e Petróleo do RJ e ex-presidente e diretor do Senge-RJ. Além disso, tem pós-graduação em Gás Natural, pela École de Metiers Gaz de France (França) e pós pela escola de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
No livro ele mostra como a falta de visão estratégica dos governos da década de 1990 criaram uma crise energética, com desdobramento inclusive nos dias de hoje. “Quando o governo Fernando Henrique Cardoso decidiu privatizar a distribuição de gás natural ele não criou mecanismos que obrigassem as concessionárias a realizar investimentos e expansão da rede. Isso fez com elas se concentrassem no filé mignon e apostando principalmente nos grandes clientes. Isso exige um grau de investimento baixo e alta taxa de lucro”, afirma o engenheiro.
O problema é que essa diretriz cria um desequilíbrio energético. O gás natural, que é uma energia mais barata e menos poluente, acaba sendo subutilizada. “Hoje a maior parte das termoelétricas utilizam grande quantidade de gás natural. Acontece que essas termoelétricas são pouco eficientes, pois foram construídas às pressas em momento de apagão no país. Elas aproveitam apenas 50% do valor energético do gás natural e o restante é descartada”, diz o engenheiro. Isso representa uma falta de eficiência. “Existem maneiras mais nobres de usar o gás natural, como o consumo residencial, por exemplo”, diz Antônio Gerson. Isso porque além de substituir o gás liquefeito (de botijão, caro e perigoso), na cozinha pode ser alternativa ao chuveiro elétrico, um dos vilões no consumo de energia.
Para o engenheiro Antônio Gerson, as termoelétricas poderiam ser desligadas se o Brasil investisse mais em hidroelétrica e destinasse o uso do gás natural, que é um recurso escasso e que exige altos investimentos, para setores que utilizasse esse tipo de energia com mais eficiência.
O resultado final da utilização dos diferentes tipos de energia é o aumento dos custos ao consumidor final. “Todos os brasileiros estão pagando essa conta. Já está provado que as privatizações provocaram grandes danos ao país, porque quem continua investindo nesses setores é o Estado, através do BNDES e incentivos fiscais”, aponta.
Bueiros explosivos
Entre os anos de 2006 e 2008, o Rio de Janeiro viveu um verdadeiro surto de explosões em bueiros, provocando acidentes e mortes. Mas, afinal, por que esses bueiros explodiam? As explicações estão no livro “Gás Natural no Brasil”.
As explosões, que ocorrem até hoje, embora em menor quantidade, teriam sua origem na má gestão da empresa privadas CEG e CEG RIO (empresas da companhia Gás Natural Fenosa), segundo o engenheiro Antônio Gerson.
Até 1983 todo gás usado no Brasil era manufaturado, ou seja, fabricado em uma planta industrial no bairro de São Cristóvão, na zona norte do Rio de Janeiro. Quando foi descoberto o gás natural, que já sai do reservatório de petróleo pronto para o consumo, toda a matriz de distribuição teve que ser adequada. Essa mudança coincidiu com o período do processo de privatização da rede de distribuição de gás.
A partir de 1997, ano da concessão, foram iniciadas as conversões da rede de gás, que precisaram passar por adaptação porque o gás natural tem mais pressão que o gás manufaturado. O poder calórico do manufaturado é de 4.300 kcal, enquanto o natural é de 9.600 kcal. Então, era preciso mudar as tubulações de gás, substituir materiais e ajustar as juntas. “Aí começou o problema. Para economizar, a empresa concessionária contratou equipes sem experiência para fazer essa conversão. O trabalho ficou cheio de falhas, começou a vazar gás e ter explosões nas tubulações”, explica o engenheiro.
Por isso ele avalia que as medidas anunciadas pelo governo de Michel Temer (PMDB), de privatizar setores importantes da Petrobras, assim com a distribuição de água no Rio de Janeiro, é uma saída “terrível”. “Basta ver o que foi prometido na época das privatizações do governo FHC. Os investimentos e expansões não foram cumpridos. Os investimentos continuaram vindo do poder público, muitas vezes através do BNDES. Falar em privatização de novo é sinal de que não aprenderam nada com os erros do passado”, conclui o engenheiro.
Por Fania Rodrigues (Brasil de Fato)