Foto: Petrobras
Por Cláudio da Costa Oliveira, economista aposentado da Petrobras
Publicado pela Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET)
O resultado da Petrobras no 3º trimestre de 2019 foi publicado no último dia 24/10, registrando um lucro de R$ 8,8 bilhões. Entretanto neste mesmo trimestre o resultado foi impactado positivamente em R$ 9,4 bilhões pelo lucro obtido na venda das ações da BR Distribuidora. Portanto sem este efeito extraordinário e não operacional, a companhia registraria um prejuízo de R$ 0,6 bilhões.
No acumulado dos 9 primeiros meses de 2019 o lucro informado alcançou R$ 32 bilhões, do quais R$ 30 bilhões obtidos pela venda da TAG (R$ 21 bilhões no segundo trimestre) e agora com a venda da BR Distribuidora (R$ 9 bilhões). Portanto operacionalmente o lucro obtido até o momento é de somente R$ 2 bilhões.
Ocorre que neste mesmo período a Petrobras já distribuiu aos acionistas R$ 3,9 bilhões sob o título de “juros sobre o capital próprio”. Portanto, deste valor (R$ 3,9 bilhões), R$ 1,9 bilhões foi coberto pela venda de ativos. Assim, mais uma vez, o discurso de que a venda de ativos é para reduzir a dívida, cai por terra.
É bom lembrar que a atual estrutura do capital total da Petrobras, tem a União com 28%, o BNDES com 15 %, os brasileiros na Bovespa com 21% e os estrangeiros na Bovespa e na NYSE com 36%. Como a União e o BNDES não atuam no dia a dia das bolsas, esta atividade está entregue aos brasileiros 21% e estrangeiros 36%. Portanto, nas bolsas, a participação estrangeira representa 63% das ações da companhia, com estranhas atuações de grandes fundos como o Black Rock, conforme registramos no artigo “Petrobras: fatos relevantes e preocupantes”.
O efeito negativo das vendas de ativos nos resultados da empresa já estão sendo sentidos. Para quem não sabe é bom salientar que, como sempre mostra a revista Exame “Maiores e Melhores”, a BRDistribuidora é a segunda maior empresa brasileira, superada apenas pela própria Petrobras. A terceira maior empresa é a Ipiranga e a quarta é a Raizen (Cosan/Shell). A Vale é apenas a quinta maior empresa brasileira.
A venda do controle da BR Distribuidora representou um lucro de R$ 9,4 bilhões para a Petrobras, mas vai levar à perda de mais de 10% da receita da companhia daqui para frente (em torno de R$ 40 bilhões ano), como mostra a nota explicativa copiada a seguir:
Outros sinais começam a surgir.
LIQUIDEZ CORRENTE
A Liquidez Corrente é calculada pela divisão do Ativo Corrente pelo Passivo Corrente. Mostra a capacidade da empresa cumprir com seus compromissos de curto prazo (um ano). Há mais de 10 anos a Liquidez Corrente tem se mantido sempre acima de 1,5. Significa que para cada R$ 1 que a empresa tinha a pagar ela sempre dispunha de R$ 1,50 ou mais. Situação confortável que por si só mostra que a companhia nunca teve problemas financeiros .
No entanto as coisas vem mudando rapidamente. Em dezembro de 2018 a empresa registrou Liquidez Corrente de 1,48. Em junho de 2019 caiu para 1.31 e em setembro de 2019 foi de 1,1. É clara a deterioração da tranquilidade financeira.
GERAÇÃO OPERACIONAL DE CAIXA (1)
A Geração Operacional de Caixa é o recurso que sobra depois de cobertos todos os custos e despesas da empresa. É o recurso que pode ser destinnado para atender o serviço da dívida, fazer investimentos e distribuir dividendos.
Há mais de 10 anos a Geração Operacional de Caixa anual da Petrobras tem se mantido acima de US$ 25 billhões. Em 2018 foi de US$ 26,4 bilhões.
Ainda não temos os resultados do 3º tri de 2019 em dólares, mas sabemos que até junho/2019 a Geração Operacional de Caixa somava US$ 9,6 bilhões indicando que pela primeira vez, há mais de 10 anos, em 2019 será inferior a US$ 20 bilhões.
CONCLUSÃO
Com a venda injustificada de importantes ativos feita para atender interesses contrários ao desenvolvimento da Petrobras e do Brasil a empresa caminha no sentido inverso daquele que motivou sua criação : a autonomia e independência energética do país.
O resultado de 2019 tem sido mascarado pelo efeito da venda de ativos. Este processo deve continuar no 4º trimestre com o recebimento do “bônus” (R$ 33 bilhões) do leilão do excedente da cessão onerosa, e no início de 2020 com a venda das refinarias
Hoje ela passa por um turbulência financeira em termos operacionais que será amenizada com a adequação de sua estrutura à de uma empresa com atividade limitada à exportação de óleo crú , o que será alcançado com muita demissão e desmonte.
Com a entrada em operação de novas unidades de produção, cuja existência é devida unicamente aos investimentos feitos no período 2009/2014, certamente ela voltará a apresentar bons resultados operacionais , forte Geração Operacional de Caixa e muita distribuição de dividendos.
Com isto os atuais administradores dirão ao povo brasileiro: RECUPERAMOS A EMPRESA.
Isto não é só lamentável, é um crime sendo cometido de maneira sórdida contra o futuro do país. Futuro de nossos filhos, netos e bisnetos. A história nos cobrará.
E assim segue o cortejo, sem choro nem vela, pois o povo nem informado foi. Por cima só uma fita verde e amarela “Aqui jaz Petrobras”.
(1) A administração da Petrobras insiste em estabelecer métricas utilizando EBITDA que é um indicador não padronizado o que prejudica a comparação com outras empresas . A própria companhia reconhece isto nos Glossários apresentados nos Releases de Resultados. Julgamos que a Geração Operacional de Caixa é o indicador mais adequado pois alem de ser padronizado é mais preciso pois considera (diferente do EBITDA) a variação do capital de giro. Nenhuma grande petroleira internacional publica EBITDA em relatórios oficiais.
Fonte: Clube de Engenharia