Para Valter Pomar, organização da sociedade é fundamental no Brasil pós-manifestações

Share on facebook
Share on twitter
Share on whatsapp
Share on email

Definir e discutir os desafios que foram postos para o Brasil durante as manifestações de junho, manter a mobilização e organizar a sociedade e os movimentos sociais.Estes foram os três pontos que o historiador Valter Pomar destacou como necessários no período pós-manifestações pelo qual o país está passando, durante sua palestra na faculdade Newton Paiva, organizada pelo Senge-MG, no dia 29 de agosto. O historiador apresentou o balanço das manifestações. O primeiro motivador, segundo Pomar, foi o mal estar generalizado da sociedade brasileira com os serviços públicos de péssima qualidade, mal estar presente, principalmente, na juventude. “Essa geração de 20 a 25 anos também tinha uma demanda reprimida de sair às ruas”, afirmou. Outro ponto levantado por Valter foi a falta de políticas públicas e a má qualidade dos políticos do Brasil. “No país, política não tem a ver com democracia, tem a ver com grana. Se nada for feito, nossa democracia pode virar um grande balcão de negócios. Chega um ponto em que a corrupção se torna algo mais grave pois ela significa o desrespeito às leis, o desvio de recursos, obras desnecessárias, entre outros”, disse.

Segundo Valter Pomar, o Brasil vai precisar fazer um investimento maciço em políticas públicas, porque outros pontos estão ruins, além dos serviços públicos. “Para se tornar e se manter uma potência industrial, o país precisa de investimentos para dar um salto em todos os aspectos. Porém, isso precisa ser feito de uma forma diferente do que já foi feito na democracia. Historicamente, só houve crescimento e intenso desenvolvimento econômico em períodos de ditadura.” Para Valter, é preciso garantir a soberania nacional, o combate à desigualdade e a democracia e, para isso, as manifestações de junho podem ajudar, dependendo do rumo que tomarem. “Se as manifestações não se repetirem, será um desastre. Agora, ou vamos adotar a postura do dane-se tudo ou vamos realizar outras manifestações. É necessário dar continuidade ao processo e fundamental que ele se organize, para não gerar o caos, uma vez que este significa repressão ou vandalismo ou terceiros te dizendo o que fazer”, proferiu.

Mundo

Membro do diretório nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) e candidato à presidência nacional do partido, Valter Pomar apresentou três processos que, a seu ver, formam a conjuntura mundial do momento em que as manifestações tomaram conta do Brasil. O primeiro ponto levantado foi a mudança geopolítica mundial, que devolveu o centro do mundo para a Ásia. “O centro do mundo voltou da Europa para a Ásia, onde estava nos anos 1400. Além disso, os Estados Unidos, principal potência do mundo pós-guerra agora está em declínio”, disse. Pomar justificou suas afirmações sobre os Estados Unidos destacando que o país destruiu o Iraque e não foi capaz de reconstruí-lo como fez como o Japão, após a 2ª Guerra Mundial.

Além disso, o mundo todo está passando por uma crise econômica, cuja tendência é se estender ainda por muitos anos. O resultado disso, segundo Pomar, é a instabilidade mundial, que gera conflitos sociais, econômicos e militares. “É o caso da Síria, por exemplo. Estamos em um estado de pré-guerra e as instabilidades só tendem a aumentar por todo o globo”, afirmou. A única saída para os países se protegerem, segundo o historiador, é com a criação de blocos regionais, que servirão de autoproteção contra estas instabilidades.

Brasil

Valter aproveitou a ocasião para falar sobre a história do desenvolvimento do Brasil. “Dos anos 1920 a 1980 tivemos 50 anos de crescimento gigante do país. O Brasil cresceu mais rápido do que muitos países desenvolvidos. No entanto, é um dos países mais desiguais do mundo”, expôs. O Brasil tem um crescimento marcado por três características: dependência externa, desigualdade social e falta de democracia. “Todo processo de grande crescimento do Brasil foi marcado pela falta da democracia”, avaliou Pomar.

No entanto, no fim da década de 1980, o crescimento econômico entrou em crise, o mundo também entrou em crise e a ditadura entrou em crise. Com isso, o país foi tomado pelo neoliberalismo, processo que começou a ser superado em 2003, com a eleição do PT para a Presidência do país. “No começo dos anos 2000, carregávamos uma história de crescimento, desigualdade social e ditadura, agravada pela crise econômica e pelo neoliberalismo”, avaliou.

Atualmente, o Brasil passa por uma nova fase, de retomada dos níveis de emprego, recuperação salarial e expansão da capacidade de consumo. “Mas essa retomada foi em níveis dos anos 1980, antes do neoliberalismo. Os gargalos existentes na época ainda existem hoje. A melhoria da vida dos cidadãos se deu da porta de casa para dentro. A parte pública do Brasil foi ficando cada vez pior”, observou. Valter questionou, assim, a fala de que os poderes brasileiros foram surpreendidos com as manifestações. “Existiam indicadores claros de que alguma coisa iria acontecer. As tarifas do transporte público foram apenas o gatilho para o movimento”, considerou.

Manifestações

Para Valter Pomar, as manifestações de junho foram dividas em 4 momentos. “No primeiro momento, ou onda, vimos nas ruas a juventude trabalhadora ou filha de trabalhadores, pedindo o cancelamento do aumento das tarifas e a possibilidades de se discutir a tarifa zero. No segundo momento, as pessoas solidárias aos manifestantes que foram feridos e reprimidos pela polícia militar em São Paulo, saíram às ruas. Novamente, o público foi de jovens trabalhadores e filhos de trabalhadores”, explicou.

A terceira onde de manifestação, segundo Pomar, mudou a composição social das manifestações. “Agora vão para as ruas aqueles que querem comemorar a redução das tarifas, assim como os que foram antes e, também, os que foram convocados pelos meios de comunicação.” Valter explica que, nessa fase, a imprensa começou a usar as manifestações para fazer campanha contra o governo. “A Globo chamava os manifestantes e dizia que cada um podia reivindicar seus próprios desejos, transformando, assim, em algo individual”, ressaltou. O quarto momento foi logo após o pronunciamento da presidente Dilma Rousseff, em que ela reconheceu a legitimidade do movimento e sua importância para o Brasil. “Houve uma certa dispersão, pois cada um estava indo às ruas com a sua própria pauta”, finalizou.