Na contramão da universalização da água, Senado aprova privatização da água

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O Senado Federal aprovou, nesta quarta-feira (24/6), o Projeto de Lei que altera o marco legal do saneamento básico, o PL 4.162/19. O texto, criticado por movimentos sociais e organizações que defendem as águas como bem público, teve 65 votos a favor e 13 contra. O texto, sem destaques, seguirá para sanção presidencial. O PL 4162/2019 afeta a titularidade dos municípios, privilegiando as empresas privadas, e ainda cria um fundo público para fomentar a privatização. Um dos pontos mais graves é o fim dos Contratos de Programa, que desestrutura as companhias estaduais de água e esgoto ao acabar com os subsídios cruzados. “Privatizar a água em plena crise sanitária é uma grave violação de direitos humanos. Água é um bem essencial à vida, e não mercadoria. A bancada privatista aliada ao governo federal segue a cartilha do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, quando afirma em ‘passar a boiada’. Estamos vivendo a total desregulamentação do Estado e quem será prejudicado é o povo mais pobre desse país em lugares onde a água não chega, mas seguiremos na luta”, afirmou o engenheiro civil e presidente da Fisenge, Clovis Nascimento.

A Fisenge, os sindicatos de engenheiros de todo o Brasil, entidades sindicais e movimentos sociais se manifestaram contrários ao PL e organizaram dias de resistência e luta junto aos senadores que, infelizmente, privilegiaram os interesses privados. A Constituição de 1988, no seu artigo 30, inciso 5, estabelece que serviços de interesse local são de competência e titularidade municipal, o que inclui água, esgoto, resíduos sólidos e drenagem urbana.

O relator do PL é o senador Tasso Jereissati (PSDB/CE), um dos políticos mais ricos do país e acionista da Coca-Cola no Brasil, que consome enorme quantidade de água. O líder do PT, Rogério Carvalho, considera que o projeto “não assegura nem preserva o patrimônio das empresas estatais de saneamento”. “Mesmo com a privatização da energia foi preciso um programa público com recursos públicos, como o ‘Luz Para Todos’, para garantir a universalização da luz elétrica, assim como o programa das cisternas”, disse. Carvalho ainda pediu que seja votado um novo projeto sobre o tema para garantir políticas públicas para o saneamento.

Segundo o PL, para receber apoio financeiro e técnico da União, os municípios devem privatizar suas estatais de saneamento. Outra modificação é que a Agência Nacional de Águas (ANA) será a nova reguladora do saneamento básico, cuja colaboração financeira e técnica também está sujeita à adesão dos municípios ao novo sistema.

O projeto acaba com o subsídio cruzado, que permitia reaplicar recursos dos municípios rentáveis para os menos lucrativos. Por isso, existe um alto risco de que a situação permaneça igual ou pior nos municípios mais pobres, e de que o setor privado explore apenas áreas mais lucrativas.

No Brasil, dois exemplos marcantes apontam para o desastre que pode significar a privatização do saneamento básico e da água. Em Manaus, esses serviços são controlados e geridos pelo setor privado há 20 anos. No ano 2000, sob o comando na época do grupo Suez, um dos maiores do setor no mundo, foi criada a empresa que hoje se chama “Águas de Manaus”. 

Segundo o ranking do saneamento 2020 do Instituto Trata Brasil, somente 12,4% da população da capital do Amazonas é atendida pela coleta de esgoto. A cidade é também uma das capitais com menor média de investimentos no setor.

No Tocantins, após a privatização da Saneatins, a empresa devolveu ao estado cerca de 78 municípios que eram deficitários, e ficou apenas com o controle de 47 municípios que apresentavam níveis mais altos de rentabilidade.

A privatização dos serviços de saneamento e água tem se revelado desastrosa no mundo. Cidades como Buenos Aires, Berlim, Paris, Kuala Lumpur e Budapeste são algumas das mais de 300 ao redor do mundo que decidiram retomar o controle sobre seus serviços após os péssimos resultados com a privatização. Segundo o Transnational Institute (TNI), de 2000 a 2017, foram 900 reestatizações.

 

Fonte: Fisenge com informações do MAB (Movimento de Atingidos por Barragens)

 

Foto: Agência Senado