Apesar de campanhas de conscientização e de enfrentamento da violência contra a mulher no Brasil, os números de homicídios de mulheres continuam crescendo. Essas mortes são chamadas de feminicídios ou femicídios, por serem, em sua maioria, relacionadas com a condição de ser mulher. O Instituto Avante Brasil aponta que, em 2010, uma mulher foi vítima de homicídio a cada 1 hora e 57 minutos.
Segundo a coordenadora-geral de Acesso à Justiça e Combate à Violência da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Aline Yamamoto, o feminicídio no país vem aumentando ao longo dos anos. “Segundo o Mapa da Violência, de 1980-2010, a taxa de assassinatos de mulheres mais que triplicou. Só na última década foram mortas mais de 43 mil mulheres”, apontou Aline.
Os motivos que levam a essa violência possuem profunda relação com a cultura arraigada no patriarcado. “A violência praticada contra a mulher é reflexo do patriarcado e do machismo, que naturaliza a inferioridade e a submissão da mulher em diversos espaços sociais: no trabalho, na escola, na família, entre outros. A sociedade brasileira convive e tolera essa violência”, destacou a coordenadora.
Numa lista de 84 países sobre assassinatos de mulheres, o Brasil é o sétimo colocado devido ao elevado índice de mortes femininas. No país, o estado que lidera com maior índice de homicídios é o Espirito Santo. Essas mortes em sua maioria (70%) acontecem na residência, e mais da metade dos casos o agressor é o próprio cônjuge/namorado/ex.
Para Leila Linhares, coordenadora-executiva da Ong Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação (Cepia), o feminicídio vem de longe na história das sociedades. “As chamadas Ordenações Filipinas até 1840 permitiram que o homem matasse a sua esposa, caso houvesse suspeita de adultério. Um exemplo mais recente é o caso de um julgamento de feminicídio no Paraná, em 1991, e o da Leila Diniz, em 1976. Os homens que assassinaram suas respectivas companheiras utilizaram o recurso de legítima defesa da honra. Na época, em 1976, isso foi acatado pela Corte, mas, em 1992, isso provocou um rebuliço entre os poderes. O MP recorreu e o STJ solicitou a anulação da sentença. Hoje em dia, pode ser utilizado o recurso de legitima defesa da honra, o que já é um absurdo, mas não há mais aceitação do júri, já que isso é considerado motivo fútil”, diz.
Os resquícios dessa prática machista ainda se faz presente no dia a dia de muitas mulheres. Segundo o Balanço Semestral 2012 do Ligue 180, 60% das mulheres que telefonam sofrem violência diária. E em 50% das ligações são risco de morte. De olho nisso, movimentos de mulheres estão articulando debates sobre a necessidade da tipificação do feminicídio no Código Penal. Essa mudança na legislação, que já faz parte das leis de vários países da América Latina, como El Salvador, México, Chile, entre outros, significa diferenciá-lo do homicídio e definir penalidades próprias de forma a reprimir, repudiar e promover políticas públicas preventivas para esse crime contra a mulher. Para Leila, politicas publicas são imprescindíveis, mas para que alcancemos conquistas maiores é necessária a integração da sociedade. “Na luta dos movimentos das mulheres é muito importante que outras entidades de classe, que sindicatos, instituições, e a sociedade civil como um todo apoie. É uma luta que envolve a todos e para que cresça o repúdio a esse crime covarde é necessário a união e participação de todos”.
Feminicídio X Femicídio
Cada vez mais, a expressão feminicídio ou femicídio vem ganhando destaque na mídia. O termo, ainda em construção, é desconhecido até entre juristas e legisladores. Segundo a investigadora Patsilí Toledo Vásquez, feminicídio é um homicídio de mulheres “em um contexto social e cultural que as coloca em posições, papéis, ou funções subordinadas, contexto que, portanto, favorece e as expõe a múltiplas formas de violência”.
Segundo a teórica feminista inglesa Diana Russel, há uma diferença política entre as duas palavras. Femicídio denominam-se os assassinatos de mulheres, sem relação com a condição de ser mulher. Já, o feminicídio é o assassinato cometido por um homem motivado por sentimentos de discriminação de gênero, como superioridade e propriedade sobre as mulheres. Ou seja, machismo mata.