Na sexta-feira (31), em uma entrevista coletiva de seu presidente, Ilan Goldfajn, o Banco Central anunciou que o governo vai promover a “modernização da remuneração do BNDES”. Em verdade, foi anunciado uma despedida, um claro e direto aceno: “Adeus ao BNDES”.
A atual taxa dos empréstimos do BNDES, a chamada taxa de juros de longo prazo (TJLP), desaparecerá. Será mantida apenas para os contratos que estão em vigor. Novos contratos, a partir de janeiro de 2018, terão uma nova taxa chamada apenas de TLP. A partir de janeiro do ano que vem a TLP cresceria até se igualar à taxa de juros das NTN-B (de cinco anos), um título da dívida pública. O prazo de transição para igualar a TLP à taxa das NTN-B será de cinco anos.
A taxa de juros das NTN-B (cinco anos) é composta pela inflação medida pelo IPCA mais uma taxa que reflete as circunstâncias do momento, principalmente riscos. Nos últimos dez anos, ela foi mais alta que TJLP e sempre sofreu pressão de alta por parte de rentistas. É uma taxa definida em leilões sob a tensão da demanda e da oferta e, assim, portanto, será definida a TLP.
Durante a coletiva, quando perguntado se tal medida não anularia a potência das políticas anticíclicas já que em momentos de dificuldades econômicas o BNDES pode reduzir a TJLP, o presidente do Banco Central deu uma resposta inusitada. Disse que as políticas anticíclicas seriam, pelo contrário, potencializadas.
O presidente do Banco Central esqueceu, contudo, de dizer que durante o ano de 2002, a taxa de juros das NTN-B alcançou 37,8% ao ano. Esqueceu de dizer, ainda, que durante o período mais crítico da crise de 2009, saltou de 7,5% para algo em torno 11% ao ano. E esses seriam os valores da TLP se essa taxa já existisse naquela época.
Cabe observar que políticas anticíclicas, por definição, não podem ser decididas pelo mercado. O mercado é sempre pró-cíclico. E, portanto, a TLP nunca será uma taxa anticíclica porque será uma taxa definida sob a pressão do mercado financeiro em leilões de títulos do tipo NTN-B (de cinco anos). Em sentido oposto, políticas anticíclicas são, de forma obrigatória, resultantes de movimentos discricionários, autônomos.
Quando perguntado por um jornalista qual seria a taxa dos empréstimos do BNDES hoje se essas medidas já estivessem em vigor, o presidente do Banco Central deu uma resposta vaga para uma pergunta objetiva. Nada respondeu. A resposta objetiva seria a seguinte: hoje, a TJLP está em 7% ao ano, mas se a TLP já estivesse vigorando em sua plenitude, ela seria de 11,8%.
As consequências dessa medida de “modernização” serão gravíssimas. Haverá a redução da atratividade dos financiamentos do BNDES, devido à taxa bem mais elevada da TLP em relação ao que tem sido a TJLP. O BNDES terá, portanto, folga de recursos, o que dará condições para a instituição acelerar seus pagamentos ao Tesouro (decorrentes de recursos que recebeu do governo para aumentar a oferta de crédito nos últimos anos). Tal descapitalização levará o BNDES à lona.
E para a economia brasileira haverá um enorme risco. Primeiro, ficará sem o seu principal instrumento de financiamento do investimento da indústria e da infraestrutura e, em segundo lugar, estimulará os empresários a tomar empréstimos no exterior, em dólar. Com receitas em reais e despesas contratadas em dólar, empresários estarão expostos a crises cambiais. Esse cenário, que parecia ser algo do passado, está de volta com aquilo que o governo chama de “modernização”.
Fonte: Carta Capital