Centrais sindicais vão apoiar as ações de inconstitucionalidade já impetradas contra a MP 873/19 pela OAB, Concate e Proifes.
Três decisões tomadas pela Justiça Federal do Rio de Janeiro e outras duas em Minas Gerais e no Espírito Santo garantiram para entidades sindicais a manutenção dos “descontos/consignações em folha das mensalidades ou contribuições dos sindicalizados sem ônus para a entidade sindical”. As ações questionam a Medida Provisória 873/19, editada pelo governo federal às vésperas do Carnaval, que, entre outras questões, veda o desconto de obrigações de trabalhadores associados ou não para os sindicatos, determinando que os pagamentos sejam feitos por boleto bancário. No Congresso, acredita-se que a MP seja uma espécie de “bode na sala”, uma moeda de troca para forçar deputados com bases sindicais a votarem pela Reforma da Previdência. E, na opinião de muitos advogados e especialistas, a medida é inconstitucional, por violar, entre outros, o direito previsto na Constituição Federal à organização e à liberdade associativa, e ferindo seus artigos 8º, 5º e 37º.
As nove grande centrais sindicais brasileiras estudam a possibilidade de ingressar com Ação de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal contra a MP, e também como colaboradoras (“ amicus curiae”) nas ADIs já ajuizadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pela Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Conacate) e pela Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (Proifes), a fim de evitar ações isoladas das entidades. Também divulgaram nota com os argumentos jurídicos que contradizem a medida e dão outras orientações: (http://www.diap.org.br/images/stories/nota-orientadora-centrais-mp-873.pdf.)
Para o advogado Wilmar Alvino da Silva Jr., o centro dessa discussão está no artigo 8º da Constituição, que trata da liberdade sindical e estaria sendo violada pela MP. “A medida provisória, da forma como foi feita, é apenas uma intervenção direta — e, ressalte-se, inconstitucional — do Estado nas entidades, ou seja, qualquer cidadão republicano e bem intencionado não precisa de esforço para ver a absurda violação da nossa Carta Maior causada pela MP”, escreveu no site do Diap. “Aqui cabe ressaltar, ainda, o entendimento já manifestado pela OAB e Ministério Público do Trabalho, por meio da Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical (Conalis), de que, com essa MP, estamos rasgando nossa carta constitucional, a Consolidação das Leis do Trabalho (ou o pouco que resta dela após a reforma trabalhista) e os tratados e acordos internacionais(…). Parecer da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB Federal publicado em 7 de março recomenda ingresso imediato de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). “
A ADI 6.098 da OAB no STF argumenta que a MP do governo Bolsonaro tem como objetivo “dificultar ao máximo” a organização das entidades que representam os trabalhadores, dificultando “severamente” o recolhimento das contribuições que asseguram o sustento das suas atividades. “A repercussão será instantânea em razão da imediata produção de efeitos da norma, afetando os recursos para a manutenção das entidades no próximo mês, o que por sua vez comprometerá o pagamento de inúmeras obrigações de naturezas diversas, inclusive as remunerações de milhares de trabalhadores destas entidades”, dizem os advogados. As formas de financiamento dos sindicatos estão previstas na Constituição, diz a OAB, e tais “direitos” não podem ser confundidos com “privilégios”. “Se a atuação dos sindicatos representa, em análise última, uma garantia adicional ao respeito dos direitos sociais dos trabalhadores, evidente que tais entes se revestem da condição de entidades privadas de interesse social.”
Decisões da Justiça Federal
As decisões contra a MP na Justiça Federal resultaram de ações impetradas pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (SintUFRJ) contra a UFRJ, pelo Sindicato dos Servidores da Justiça Federal no estado (Sisejufe), ambas no Rio de Janeiro, pelo Sindicato dos Delegados de Polícia Federal – Região Nordeste (SindPF-NE), pelo Sintraemg (servidores da Justiça federal no estado de Minas), pelo Sintufes, trabalhadores na Universidade Federal do Espírito Santo e, também no Rio, pelo SintSaude, esta última ação contra o Ministério da Saúde, a União e o Serpro.
As primeiras tutelas provisórias (decisão temporária que evita que uma das partes sofra um prejuízo irreversivel) foram concedidas pela 2ª e a 3ª Varas Federais do Rio para o SintUFR e para o Sisejufe. Nos dois casos, os juízes avaliaram que os sindicatos precisariam de tempo para substituir os modelos de cobrança e que a própria medida não parece ser razoável. “Em uma análise perfunctória [superficial] (…) revela-se irrazoável a vedação para que a cobrança de contribuição autorizada pelo sindicalizado ocorra por meio de desconto em folha de pagamento”, escreve o juiz federal Fabio Tenenblat, da 3ª Vara, em resposta ao Sisejufe.
Como a MP 873/2019 entrou em vigor no mesmo dia em que foi publicada [1º/3/2019], as decisões reconhecem, ainda, que não houve tempo hábil para os sindicatos reorganizarem suas finanças e, sem o dinheiro dos boletos que venceram no começo de março, suas atividades estariam ameaçadas.
O advogado Rudi Cassel, do escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados, responsável pelas duas ações, lembra que elas não trataram do imposto sindical, mas da mensalidade facultativa dos filiados. Ou seja, aquela que é fixada em assembleia, com autorização constitucional para desconto em folha (artigo 8º, IV).
Reação das Centrais sindicais
Em nota conjunta, as centrais sindicais, incluindo a CUT, apontam a MP 873/19 como “um grave ataque contra o princípio da liberdade e autonomia sindicais e o direito de organização dos trabalhadores, dificultando o financiamento das entidades de classe, no momento em que cresce no seio da classe trabalhadora e do conjunto da sociedade a resistência ao corte de direitos de aposentadoria e previdenciários em marcha com a apresentação da proposta de reforma da Previdência que já tramita no Congresso Nacional”.
Também afirmam que, junto com sindicatos, federações e confederações de trabalhadores “tomarão todas as medidas de caráter legal e junto ao Congresso Nacional, as bancadas dos partidos políticos, e mobilizações para derrotar a MP 873”. A recomendação da nota é que as ações na Justiça sejam sempre articuladas com o coletivo jurídico das centrais, que vão construir estratégias para orientar seus filiados. “A MP 873 não altera o desconto em folha de pagamento das mensalidades associativas e outras contribuições constantes nas convenções e acordos coletivos aprovados em assembleias”, destacam na nota.
Em outra ofensiva na defesa das contribuições, fundamentais para sustentar a capacidade de negociação dos trabalhadores junto a corporações e empresas, as nove centrais vão denunciar o governo brasileiro na Organização Internacional do Trabalho (OIT) e demais organismos internacionais por práticas antissindicais.
Moeda de Troca
Segunda nota publicada pela jornalista Denise Rothenburg no jornal Correio Braziliense, no dia 5 de março, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) estaria sendo aconselhado a negociar com os partidos nos seguintes termos: “Se os deputados insatisfeitos com as mudanças no pagamento da contribuição sindical quiserem derrubar a medida provisória sobre o tema (MP 873), terão que votar a favor da reforma previdenciária.” A colunista diz que, para os congressistas, a medida “chega ao parlamento em péssima hora” e sem consulta aos líderes.
Uma Medida Provisória tem vigência de 60 dias, podendo ser prorrogada automaticamente pelo mesmo período, se não for votada na Câmara e no Senado. Se não for apreciada em até 45 dias após sua publicação, a MP entra em regime de urgência e bloqueia a pauta, impedindo a votação de outros projetos. A relatoria da Comissão Especial Mista que vai analisar o texto está com o deputado Hildo Rocha (MDB-MA).
Fonte: com informações do DIAP, do Conjur e da CUT
Nota de orientação das centrais sindicais: http://www.diap.org.br/images/stories/nota-orientadora-centrais-mp-873.pdf
Adin da Concate: https://www.conjur.com.br/dl/entidade-sindical-entra-adi-mp.pdf
Adin da Proifes: http://www.diap.org.br/images/stories/adi-mp873-proifes.pdf
Decisão da 2ª Vara Federal do Rio: https://www.conjur.com.br/dl/justica-federal-mantem-contribuicoes.pdf
Decisão da 3ª Vara Federal do Rio: https://www.conjur.com.br/dl/justica-federal-mantem-contribuicoes1.pdf
https://www.cut.org.br/noticias/oab-vai-ao-stf-contra-mp-de-bolsonaro-que-prejudica-entidades-sindicais-3476
Mais informações:
http://www.diap.org.br/index.php/noticias/agencia-diap/28690-mp-873-mira-nos-sindicatos-mas-acerta-na-constituicao
http://www.diap.org.br/index.php/noticias/noticias/28697-mais-decisoes-mandam-descontar-em-folha-mensalidades-e-outras-contribuicoes
http://blogs.correiobraziliense.com.br/denise/mp-873-como-moeda-de-troca-para-aprovar-previdencia/
http://www.diap.org.br/index.php/noticias/agencia-diap/28683-centrais-tomarao-todas-as-medidas-contra-mp-873-decidem
http://www.diap.org.br/index.php/noticias/agencia-diap/28689-decisoes-judiciais-garantem-desconto-em-folha-para-sindicatos-de-servidores-no-rj
https://www.conjur.com.br/2019-mar-08/justica-federal-mantem-desconto-folha-contribuicao-sindical?
Fonte: Senge-RJ