A Unesco (entidade da Organização das Nações Unidas) estima que 11% da população mundial já é atingida pela escassez hídrica. Se as políticas, modelos de produção e hábitos modernos não mudarem, 1,8 bilhão de pessoas estarão vivendo em zonas muito secas e dois terços da humanidade estarão sujeitos a alguma restrição no acesso à água em 2025. Governos, indústria e sociedade terão obrigatoriamente que repensar processos produtivos e modelos de consumo e isso tem tudo a ver com a engenharia. O crescimento do mercado em torno do consumo da água enseja ser nicho de oportunidade para engenheiros e engenheiras.
O Brasil e o Mundo precisam economizar água e nunca se desperdiçou tanto. Uma pesquisa da ONU sobre o uso racional de água colocou o Brasil como o 12º país que mais desperdiça o recurso no mundo. Em média, cada brasileiro consome mais de 180 litros por dia, sendo que o recomendado seria utilizar 110 litros/dia. Dados do Instituto Socioambiental (ISA) revelam que as capitais brasileiras perdem, diariamente, quase metade da água captada durante a distribuição, a maior parte deve-se a vazamentos na rede.
No lastro por resoluções para estes problemas entra a engenharia, ciência tipicamente criadora de soluções tecnológicas que possam manter a eficiência produtiva da indústria e da agricultura, bem como atender a padrões sustentáveis de consumo de água e energia. O homem precisa de sistemas que tenham ação regeneradora sobre o ambiente. Essa integração sustentável inevitavelmente vai precisar de profissionais capazes de projetar canais, barragens, ou mesmo repensar hábitos diários e rotinas produtivas. “O respeito à sustentabilidade é premissa do que acreditamos ser o caminho das ciências tecnológicas. Soluções para o déficit hídrico inevitavelmente passam pela engenharia, agronomia, geologia e meteorologia”, disse o presidente do Senge-ES, engenheiro eletricista Ary Medina Sobrinho. Segundo especialistas, a solução passa por ações como o controle de uso das reservas, monitoramento constante do meio ambiente, planejamento urbano eficiente, investimentos em cisternas, construção de poços e de infraestrutura de distribuição de água tratada. Claro que isso tudo depende de investimentos públicos e privados.
Investimentos públicos
A União já investiu mais de R$ 20 bilhões de reais em obras de infraestrutura e ações ligadas a gestão hídrica. O cronograma indica que isso é só o começo. O Brasil quer universalizar o acesso aos serviços de saneamento básico. De acordo com o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), isso vai acontecer até 2030. O plano, instituído pela Lei nº 11.445/07, prevê investimentos na ordem de R$ 420 bilhões para populações urbanas e rurais do País, sendo 60% do governo federal e 40% de estados, municípios e iniciativa privada. Não por acaso o desafio hídrico virou urgência pública. A seca que sempre prejudicou o Nordeste fechou as torneiras dos Grandes Centros do Sudeste no último ano. Além disso, o vácuo político nacional pode elencar qualquer liderança pública que acerte na gestão da água a patamares mais altos.
O caso capixaba
O Espírito Santo enfrentou em 2016 a pior crise hídrica de sua história e foi castigado pela onda de lama de rejeitos de minério que desceu o leito do Rio Doce no maior desastre ambiental do Brasil. As intempéries e o rompimento da Barragem de Mariana colocaram, como nunca, a água no centro do poder público no Estado. O resultado são ações governamentais que engrossem a segurança hídrica. Convênios com os setores técnicos para especialização de mão de obra já começaram. Em março deste ano foi assinado Termo de Cooperação Técnica entre a Secretaria de Agricultura do Espírito Santo e instituições públicas e privadas (incluindo o CREA-ES). O objetivo é realizar 12 cursos de Construção de Barragens e Gestão de Recursos Hídricos em todas as regiões capixabas. Os participantes receberão subsídios técnicos quanto à elaboração de projetos de barragens, caixas secas, gestão de recursos hídricos, licenciamento ambiental, outorga e manejo de irrigação. O público-alvo dos cursos são justamente engenheiros agrônomos, agrícolas ou civis. Serão implantados mais de 60 reservatórios de água no interior do Espírito Santo até 2018. A gestão dos recursos hídricos tem previsão de receber investimentos na ordem de R$ 1,2 bilhão até 2021. “O Espírito Santo enfrentou no último ano a pior seca e o maior desastre ambiental de sua história. Somos protagonistas da morte do Rio Doce e da incerteza da segurança hídrica da sociedade moderna. Desejamos que esses fatos desencadeiem processos produtivos mais seguros e conscientes para pessoas, empresas e o meio ambiente”, sintetiza Ary Medina.
Por Flávio Borgneth/Senge-ES