Esther Dweck, professora da UFRJ, também detalha por que bloqueio foi de 30% e não 3,5%
No último dia 22 de maio, o governo anunciou que recuaria dos cortes orçamentários na Educação e liberaria uma verba de R$ 1,6 bilhões para que fossem reinvestidos no setor. Em entrevista ao Brasil de Fato, Esther Dwek, professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que não houve recuo, mas sim uma manobra do governo para simular uma repatriação do valor.
“O governo fez um corte que não contou para ninguém, em 2 de maio, de mais R$ 1,6 bilhão, além dos R$ 5,8 bilhões anunciados em março. Eles fizeram esse bloqueio preventivo sem anúncio. Em 22 de maio, quando saiu o relatório bimestral, que avalia o que está acontecendo com as receitas e despesas como um todo, eles viram que não era necessário fazer esse bloqueio extra de R$ 1,6 bilhões e devolveram esse valor. O corte está mantido, não houve recuo. O governo usou isso, na minha opinião, para tentar esvaziar as manifestações contra os cortes”, afirmou Dweck.
:: Com R$ 5,8 bilhões ainda congelados, situação de universidades permanece crítica ::
Dwek mostra que ao investir apenas 21% do orçamento da Educação em universidades, o Brasil ocupa a 58ª posição entre 128 países. Além disso, o Brasil é o 48º, entre 99 países, em investimento por aluno matriculados no ensino superior.
Confira a entrevista com Esther Dweck.
Brasil de Fato: A senhora explica que o valor discricionário em 2019 é equivalente ao valor de 2008, quando corrigido pela inflação. Onde nós notamos essa curva com maior intensidade?
Esther Dwek: O principal corte entre 2014 e 2019 é no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que é justamente o recurso para a educação básica, contrariando o discurso de que o governo prioriza a educação básica. Então, em 2013 e 2014, chegamos ao pico de gastos nessa área. Saímos, em 2007, de R$ 6 bilhões e chegamos, em 2014, com 17,5 bilhões para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Mas tinha também, nessa época, um orçamento enorme para construção de creches e para construção das escolas em tempo integral.
Então, tinha uma série de coisas voltadas para a melhoria da educação básica, que saiu de R$ 17,5 bilhões e hoje está em torno de R$ 5 bilhões, voltando ao mesmo nível de 2008. Essa foi a maior queda proporcional, sem dúvida alguma. As bolsas da Capes também tiveram uma importante queda no orçamento em termos reais.
O governo segue defendendo a tese de que o governo cortará 3,5% e não 30% das universidades federais. Qual é o valor correto?
O governo fez uma métrica para medir os 3,5% que não faz sentido. São duas coisas importantes. O próprio governo, quando anunciou o valor do contingenciamento inicial, falou em 30%, porque ele estava calculando sobre o que, de fato, há possibilidade de contingenciamento, que são as despesas discricionárias. Como houve uma reação, o governo anunciou que o corte seria só de 3,5%, mas aí eles pegaram o valor total que está previsto no orçamento para as universidades. O problema é que esse valor mistura coisas que não vão para as universidades.
Então, por exemplo, tem duas contas que não fazem o menor sentido serem incluídas. A primeira é uma despesa financeira que não se aplica à lógica de meta de resultado primário, porque é uma despesa financeira, não uma despesa primária. Essa é uma despesa patronal, que o governo paga para ele mesmo, de R$ 4,4 bilhões. Além disso, tem todo o pagamento de pessoal inativo, que são aposentados e pensionistas, que somam R$ 12,8 bilhões. Então, se juntarmos esses dois, já dá R$ 17 bilhões que não deveriam fazer parte de nenhuma base de cálculo, porque isso não é o custo das universidades: isso é pagamento de aposentadoria, que não é recurso disponível para as universidades gastarem. No que sobra, que são R$ 32 bilhões, se o governo quiser fazer algo é sobre esses R$ 32 bilhões, não sobre os R$ 49 bilhões, uma parte grande é R$ 25 bilhões, que é pagamento de pessoal.
O governo anunciou que estava recuando de parte do corte. Porém, não ficou claro o tamanho do recuo e se houve recuo. Afinal, o que significou a manobra do governo?
Não houve recuo. O governo fez um corte que não contou para ninguém, em 2 de maio, de mais R$ 1,6 bilhão, além dos R$ 5,8 bilhões anunciados em março. Eles fizeram esse bloqueio preventivo sem anúncio. Em 22 de maio, quando saiu o relatório bimestral, que avalia o que está acontecendo com as receitas e despesas como um todo, eles viram que não era necessário fazer esse bloqueio extra de R$ 1,6 bilhão e devolveram esse valor. O corte está mantido, não houve recuo. O governo usou isso, na minha opinião, para tentar esvaziar as manifestações contra os cortes.
Fonte: Brasil de Fato / Edição: Aline Carrijo