Aconteceu, entre os dias 28 e 29 de agosto, a Conferência Mundial de Profissionais e Gerentes (P&M), em Kuala Lumpur, Malásia. Pela primeira vez, o evento contou com um painel específico sobre mulheres nas áreas de STEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática). A engenheira e diretora da Mulher da Fisenge (Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros), Simone Baía, foi a única representante brasileira da conferência e participou do painel ao lado de Johanne Störkersen (NITO, Noruega) e Dwi Handayani (Aspek, Indonésia) sob a coordenação de Liz Hardwick (BCTU, Reino Unido).
Representantes de 79 países participaram da Conferência cujo tema principal levantou questões sobre os impactos da tecnologia no mundo do trabalho. “O direito à desconexão foi uma das principais pautas entre sindicalistas e profissionais, principalmente com o avanço da Indústria 4.0 e os impactos na engenharia e nos direitos dos profissionais”, disse Simone.
Durante a conferência, a engenheira ressaltou que, em primeiro lugar, precisamos de um ponto de partida que é o enfrentamento às desigualdades sociais referenciadas em um marco estrutural que desfavorece as mulheres com piores condições de trabalho, acúmulo de jornada e as responsabilidades familiares e domésticas. “Esse traço estrutural do machismo impõe que as mulheres estejam direcionadas a profissões ligadas ao cuidado doméstico e, portanto, desestimuladas a seguirem as carreiras de STEM. Mesmo quando rompemos estas barreiras e alcançamos a universidade e o mercado de trabalho temos os processos seletivos que dificultam o nosso acesso”, destacou Simone, que acrescentou: “em muitas entrevistas de emprego, por exemplo, os empregadores perguntam sobre possibilidade de gravidez, se temos filhos, acreditando que estes são fatores para baixo desempenho. Ou, ainda, no mercado de trabalho, ouvimos piadas e questionamentos sobre nossa capacidade técnica e intelectual, sofremos com assédios moral e sexual e, mesmo desempenhando mesmas funções, recebemos remunerações mais baixas”.
Diante deste quadro, a engenheira reafirmou a importância dos sindicatos para a igualdade de direitos entre homens e mulheres. “Os sindicatos precisam formular cláusulas específicas relacionadas a gênero em suas negociações coletivas, em um processo ativo de escuta das mulheres, defendendo cláusulas de gênero e sociais nas negociações coletivas. Sabemos que estas cláusulas são as primeiras a serem retiradas e, nesse sentido, é fundamental a construção de espaços de formação e diálogo com a sociedade”, enfatizou.
Simone ainda abordou o quadro da conjuntura brasileira. “Precisamos de atuação na macropolítica. No Brasil, vivemos um retrocesso após o corte de quase 40% de recursos para universidades públicas e institutos federais, atingindo os núcleos de pesquisa, ciência e tecnologia, além da interrupção das bolsas, afetando a engenharia e soberania nacional. Acerca das pesquisas, é fundamental o respeito às licenças-maternidade e paternidade e cumprimento dos direitos em relação à maternidade plena, como a amamentação, porque sabemos o alto grau de exigência em relação às mulheres pesquisadoras”, afirmou Simone que ainda destacou a importância de uma cultura organizacional e de gestão comprometida com políticas de gênero. “É necessário estimular a criação de Comitês de Igualdade de Gênero e Raça com programas de palestras e formação para os trabalhadores nas empresas, além de incentivar a ocupação de cargos de direção por mulheres e respeitar os acordos coletivos de trabalho”, afirmou.
A engenheira ainda apresentou o trabalho do Coletivo de Mulheres da Fisenge com a publicação das histórias em quadrinhos da Engenheira Eugênia que foram traduzidas em inglês, exclusivamente para a Conferência. “As histórias são protagonizadas pela Engenheira Eugenia, que é uma mulher negra divorciada, servidora pública e mãe de dois filhos que traz os principais problemas que as mulheres enfrentam na profissão e também questões sociais. São estas situações que criam um movimento de expulsão das mulheres de suas profissões, uma vez que em seu próprio local de trabalho não há um banheiro específico ou mesmo Equipamentos de Proteção Individual (EPI) com tamanho adequado”, afirmou. As histórias são distribuídas gratuitamente em formato de marcador de livro em escolas, universidades e locais de trabalho, de modo a dialogar com um amplo conjunto de pessoas e também podem ser acessadas nas redes sociais e no site: www.fisenge.org.br
Ao finalizar, Simone convocou a plateia à reflexão: “quando uma mulher avança nenhum homem retrocede”.
Além dos painéis, a Conferência contou com a aprovação do novo programa global de P&M (Profissionais e Gerentes), do estatuto e com a reeleição do presidente mundial de P&M, Ulf Bengtsson.