Em nota técnica, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho expõe prejuízos da MP 927

Share on facebook
Share on twitter
Share on whatsapp
Share on email

Em carta aos parlamentares, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (SINAIT) analisa artigos do novo parecer da MP 927/2020, que retoma os dispositivos da revogada Medida Provisória nº 905/2019, inserindo temas absolutamente estranhos ao objeto da matéria em apreciação.

O texto traz prejuízos aos trabalhadores e à Inspeção do Trabalho ao manter as mesmas inconstitucionalidades que constavam no texto da MP nº 905 e o mesmo grau de interferência na atuação dos Auditores-Fiscais do Trabalho. Além disso, a matéria impõe grave fragilização do sistema de representação sindical, em ofensa às disposições convencionais e constitucionais sobre a matéria. Também incorre em desrespeito direto ao artigo 7º da Constituição Federal, que assegura a irredutibilidade do salário.

O parecer prevê diversas medidas de flexibilização da legislação trabalhista. O SINAIT destaca que assegurar renda e emprego durante a pandemia aos que trabalham representa dar segurança à saúde dos cidadãos e também à economia. Por isso, pede aos parlamentares que rejeitem a matéria, que é tão danosa aos trabalhadores brasileiros e à Inspeção do Trabalho.

CONFIRA ABAIXO CARTA ENVIADA AOS PARLAMENTARES

O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho – SINAIT, manifesta contrariedade ao relatório do Deputado Federal Celso Maldaner (MDB-SC) sobre a Medida Provisória – MP nº927/2020, publicado em 2 de junho – com informação ainda não confirmada de republicação, com alterações, em 3 de junho – considerando que os direitos dos trabalhadores seguem sofrendo com retrocessos inadmissíveis, mais graves ainda se considerado o propósito do envio da MP 927/2020 ao Congresso, que foi o de proteger o emprego e, por conseguinte, os direitos fundamentais do trabalhador e da trabalhadora.

O primeiro aspecto a ressaltar é a persistência da fragilização do sistema de representação sindical, em ofensa às disposições convencionais e constitucionais sobre a matéria. O direito à negociação coletiva, com participação obrigatória dos sindicatos, é reconhecido como direito fundamental pelas Declarações Internacionais de Princípios e Direitos Fundamentais aprovadas no âmbito do sistema ONU. Por outro lado, a MP, além de desconsiderar tais normativas, desrespeita o necessário diálogo social, ferindo o conteúdo das Convenções 98 e 154 da Organização Internacional do Trabalho – OIT. Por outro lado, ainda nesse primeiro aspecto, evidencia-se desrespeito direto ao artigo 7º, VI da Constituição Federal de 1988, que assegura a irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo, bem como ao artigo 8º, caput e incisos III e VI dessa Constituição, que definem a obrigatoriedade da participação sindical. Ademais, a prevalência do acordo ou convenção coletivos é garantidora do natural desequilíbrio nas negociações entre empresários e trabalhadores. A partir desta irrefutável premissa, é inadmissível o reconhecimento da validade de acordos individuais como pretensas formas de solução de conflitos trabalhistas, sendo certo que, em tais condições, deles resultarão prejuízos exatamente para quem se deve proteger, os trabalhadores, polo mais frágil na relação capital e trabalho.

Ademais, passa-se a descrever comentários sobre artigos do relatório da MP 927/209, que circula entre os representantes dos movimentos sindical e social, que merecem uma detida reflexão por todos os parlamentares. Em razão da não confirmação, até o momento, de republicação do Relatório, pode haver desencontro na citação numérica dos artigos, o que não prejudica, na essência a análise do conteúdo a seguir apresentado.

  1. O primeiro aspecto geral e estruturante a ressaltar é a persistência da fragilização do sistema de representação sindical, em ofensa direta ao art. 7º, VI, da Constituição Federal, que assegura a irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo. A prevalência do acordo ou convenção coletivos é o garantidor da atenuação do natural desequilíbrio nas negociações entre empresários e trabalhadores. A partir desta irrefutável premissa, é inadmissível o reconhecimento da validade de acordos individuais como pretensas formas de solução de conflitos trabalhistas, sendo certo que, em tais condições, deles resultarão prejuízos exatamente para quem se deve proteger, os trabalhadores.

    SUGESTÃO: alteração do texto, em todos os artigos que se fizer necessário, para assegurar o cumprimento do artigo 7º, VI, da Constituição Federal.

  2. O art. 2º, e seu parágrafo único, que coloca os acordos individuais e, da forma posta, também os coletivos, em patamar incompatível com o sistema de representação sindical, ao prever a sua preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais.

    SUGESTÃO: supressão do artigo 2º e parágrafo único.

  3. O art. 3º insere medidas de flexibilização nos contratos como o teletrabalho, a antecipação de férias, a concessão de férias coletivas, o aproveitamento e antecipação de feriados, o banco de horas, a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho e o diferimento dos depósitos do FGTS sem haja garantia de manutenção no emprego, durante o prazo de sua vigência.

SUGESTÃO: alteração do texto para estabelecimento de garantia do emprego como forma de contrapartida, sem possibilidade de se indenizar o período de estabilidade.

  1. Quanto aos artigos 22 e 27, que tratam do FGTS, revelam-se incongruentes, já que estabelecem uma suspensão de prazo prescricional das dívidas com o Fundo por 120 dias, enquanto preveem que uma suspensão pelo período de 180 dias nos prazos processuais para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originados a partir de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS. Tal disparidade inibe a execução de dívidas e opera em benefício da prescrição, prejudicando ainda mais as receitas do FGTS.

SUGESTÃO: alteração do texto para que os prazos sejam compatíveis, afastando o risco de prescrição de valores do FGTS.

  1. Já no artigo 12, tem-se a dispensa de comunicação prévia às Superintendências Regionais do Trabalho e a comunicação aos sindicatos representativos da categoria profissional, no caso da concessão de férias coletivas, igualmente enfraquecendo a atuação da representação sindical, gerando “efeitos surpresa”, dado que o “caput” do art. 11 prevê que a comunicação dessa decisão unilateral do empregador será precedida de antecedência apenas 48 horas.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. O artigo 14 permite que, mediante acordo individual ou coletivo, seja estabelecido banco de horas, quando houver a interrupção das atividades do empregador, ou mesmo que não haja a interrupção no caso das empresas que desempenham atividades essenciais (art. 14, § 3º). Essa compensação, que poderá ser feita até mesmo mediante o aproveitamento de feriados antecipados na forma do art. 13, poderá se dar no prazo de 18 meses, a contar da data de encerramento do estado de calamidade pública, ou seja, até junho de 2022, sujeitando o trabalhador a um período excessivo em que não fará jus a horas extras, e que poderá ser determinado pelo empregador independentemente de negociação coletiva ou de acordo individual, prorrogando a jornada normal de trabalho em até 2 horas, observado o limite máximo de 10 horas. Além da fragilização do trabalhador diante do empregador, há confusão dos institutos (aproveitamento de feriados e banco de horas), e agravamento da exploração dos trabalhadores em supermercados, farmácias e outras atividades essenciais, que não interromperam suas atividades, trata-se de um período muito longo, posto que a CLT já prevê que no caso de acordo individual a compensação deverá ocorrer no prazo máximo de 6 meses, e no caso de acordo coletivo, em doze meses.

SUGESTÃO: alteração do texto para não penalizar, especialmente, os trabalhadores de atividades essenciais.

  1. O artigo 15 suspende a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais. O Parecer torna ainda mais problemática essa suspensão, que passa de 60 para 180 dias, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública, expondo o trabalhador a agravamento de riscos à saúde.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. No artigo 17 consta a permissão de suspensão dos processos eleitorais das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes – Cipas e suspende a realização de quaisquer reuniões ordinárias presenciais, comprometendo a efetividade e representatividade de sua atuação, fundamental para a garantia da observância das normas de segurança nos locais de trabalho.

    SUGESTÃO: exclusão do texto.

  2. No artigo 29, foi mantida a previsão de que os acordos e as convenções coletivas vencidos ou vincendos, no prazo de 180 dias da vigência da Lei, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de 90 dias, após o termo final deste prazo. Trata-se, mais uma vez, de subordinar integralmente a atuação sindical ao interesse e à conveniência do empregador, sem que sequer haja a previsão de consulta à representação classista quanto ao interesse nessa ultratividade excepcional dos acordos e convenções coletivas.

SUGESTÃO: alteração do texto para que se restaure o sistema de representação sindical.

  1. Quanto ao artigo 32, também é inaceitável a redação que recebeu, visto que reintroduz abordagem já afastada pela decisão do STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 6342, 6344, 6346, 6348, 6349, 6352 e 6354, que suspendeu o art. 29 da MPV 905/2019, que exigia a comprovação do nexo causal para sua caracterização como doença ocupacional. A redação do art. 32 veda estabelecer o nexo causal entre a doença e o trabalho sem que sejam observadas disposições como a exigência de contato permanente e devidamente comprovado com o SARS-CoV-2, no caso de profissionais da saúde, e, nos demais casos, a realização de exames clínicos, relatórios, anamnese, estudos do local de trabalho, dados epidemiológicos, a identificação de riscos e outros, tornando virtualmente impossível essa caracterização, num contexto de elevada exposição involuntária ao contágio.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. Quanto ao artigo 34, preocupa a tentativa de reapreciação de matérias vencidas recentemente na MP 905/29 e 881/19, motivos pelo qual devem ser prontamente rechaçados, mediante questões de ordem e requerimentos ao Presidente da Câmara, para que declare não escritos os artigos no novo PLV, de modo que sequer sejam apreciados em plenário. Ainda assim, destacam-se itens gravosos vinculados às alterações pretendidas na CLT. São elas:
  2. Dupla Visita (artigo 627 da CLT). Uma clara afronta ao princípio constitucional da eficiência administrativa é extraída na tentativa de mudar as regras da dupla visita, reformulado pela já vencida Medida Provisória nº 905/2019, cujo teor amplia o critério de dupla visita para uma quantidade significativamente maior de hipóteses não contempladas na redação anterior daquele dispositivo. O critério da dupla visita, na forma do relatório, constituirá embaraço à regular atuação dos Auditores-Fiscais do Trabalho – e, consequentemente, ao atingimento do interesse público inerente à função de inspetoria laboral –, na medida em que impedirá os referidos agentes públicos de coibir efetivamente a prática de irregularidades trabalhistas por intermédio da autuação dos empregadores tão logo constatadas as vulnerações legais.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. “CARF Trabalhista” (artigo 635 da CLT), associado ao procedimento de “Uniformização de Jurisprudência” (artigo 637-A). O Conselho Paritário Tripartite seria responsável por decidir em última instância as questões relacionadas às autuações dos Auditores-Fiscais do Trabalho. Além delas, as interdições e os embargos, resultados de situações de riscos de morte para os trabalhadores. A existência do “CARF Trabalhista” coloca em xeque a política nacional de combate ao trabalho escravo, porque para este colegiado, que será composto de empresários, governo e representantes de trabalhadores, serão dirigidos os autos de infrações caracterizadores da existência de trabalho escravo; bem como a de prevenção de acidentes e doenças no trabalho. O CARF será constituído por pessoas indicadas pelo secretário especial da Previdência e será gerido no âmbito na Secretaria de Trabalho. Dessa forma, o ambiente é absolutamente segregado da área técnica finalística do Sistema Federal de Inspeção do Trabalho. Numa constituição política, o resultado será político.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. Atribuição para interdição e embargo de situações onde há risco de vida para os trabalhadores (art 161 da CLT). Noutro resgate de matéria vencida da MP 905/19, reintroduz no texto a alteração proposta ao artigo 161 da CLT, pela qual a interdição ou o embargo de atividade, setor, máquina ou equipamento seria incumbência da “autoridade regional em matéria de Inspeção do Trabalho”. Tal expressão gera dúvidas inadmissíveis sobre as autoridades às quais se vinculam essas atribuições: os Auditores Fiscais do Trabalho.

SUGESTÃO: alteração do texto, nos termos comentados acima.

  1. Novos dispositivos para fiscalização (Artigos 627-A e 627-B da CLT). Tenta-se inserir dois novos dispositivos que conferem a autoridades do Ministério da Economia, estranhas aos quadros da Auditoria-Fiscal do Trabalho, atribuições correspondentes à elaboração de procedimentos e rotinas de fiscalização no âmbito dos “procedimentos especiais para a ação fiscal” e dos “projetos especiais de fiscalização setorial”. Trata-se de uma tentativa de legalizar interferências políticas indevidas na Fiscalização do Trabalho.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. Má-fé do Auditor-Fiscal do Trabalho (parágrafo 3 do artigo 628). O texto busca conferir nova redação ao artigo 628, §3º, da CLT, a propalar que a ocorrência de má-fé do Auditor-Fiscal do Trabalho na lavratura dos autos de infração submeterá os referidos agentes públicos a Processo Administrativo Disciplinar para apuração de “falta grave no cumprimento do dever”, já carimbando que responderá por falta grave no cumprimento do dever, sendo instaurado, obrigatoriamente, processo administrativo disciplinar. Mais uma tentativa que colide com os princípios constitucionais da impessoalidade e da segurança jurídica, positivados nos artigos 5º, caput e 37, caput, da Constituição Federal, porquanto não há em seu singelo texto qualquer definição minimamente objetiva a respeito da “falta grave no cumprimento do dever” que caracterizaria, em concreto, a “má-fé do agente da inspeção” para fins de instauração do correspondente Processo Administrativo Disciplinar. É mais uma tentativa de politizar as decisões e viabilizar perseguições aos Auditores-Fiscais do Trabalho.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

  1. Já quanto ao artigo 36, é preocupante a sua manutenção, já que convalida as medidas trabalhistas adotadas por empregadores, sem base legal, a partir de 20 de fevereiro, promovendo retroatividade das normas estabelecidas pela Medida Provisória nº 927, de 2020. Tal medida abre precedente grave, contrário ao Estado de Direito e particularmente à necessidade de preservação da proteção ao trabalhador.

SUGESTÃO: exclusão do texto.

Por fim, assegurar renda e emprego durante a pandemia aos que trabalham, bem como os fluxos de renda como já se fez com a aprovação da MP 944, é tanto assegurar a saúde dos cidadãos quanto a da economia, minimizando os efeitos da crise sem deprimir consideravelmente a renda e, assim, sem deprimir a demanda por consumo essencial para a própria economia, constituindo-se condições para uma melhor saída da crise. O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho – SINAIT, coletiva e individualmente, por meio de sua Diretoria Executiva Nacional e de cada Auditor-Fiscal do Trabalho, dirige-se à Vossa Excelência para solicitar, com base na exposição dos deletérios efeitos apresentados por meio de uma avaliação cautelosa do texto do Relatório da MP 927/2020, que se ponham ao lado dos que lutam pela verdadeira e inclusiva recuperação plena do país, sem deixar nenhuma pessoa para trás, clamando pela supressão ou alteração dos dispositivos retro mencionados.

Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (SINAIT)