Crise Financeira – As duas faces do Capitalismo

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Por Vicente Trindade*

Inicialmente, vamos entender a crise de um modo simples:
John Smith é uma pessoa comum que amava os Beatles e os Rollings Stones. Não tinha um emprego fixo mas fazia uns bicos e às vezes bancava o camelô. Os bancos americanos emprestaram um dinheiro para John comprar sua casa, por 100 mil dólares. Se John comprovou renda, ou não, aos bancos não interessou, pois eles (os bancos) faziam o seguro do empréstimo e colocavam a casa como garantia. Como o banco de crédito habitacional dava muito lucro os bancos de investimentos aplicavam pesado em ações destes bancos e os especuladores do mundo inteiro procuravam estas ações que subiam quanto mais eram procuradas.

Como John não tinha muita capacidade de pagamento, todo ano ele voltava ao banco e, devido à especulação imobiliária, sua casa havia se valorizado e estava custando, no outro ano, 150 mil dólares. O banco então refinanciava sua casa nos mesmos moldes anterior e John pegava os 50 mil dólares e comprava seus sonhos de consumo (carro, tv de plasma, etc.).

E assim foram funcionando por anos e anos, até que …

Ano passado, John voltou ao banco para pegar a valorização anual de sua casa e teve a surpresa de ver que sua casa não tinha se desvalorizado pois havia excesso de ofertas no mercado imobiliário e que ele teria de pagar todas as prestações atrasadas.

Não havia jeito de pagar. Teria de entregar a casa.

Mas milhões de Johns também não tinham pagos suas prestações e o mercado estava abarrotado de casas tomadas dos mutuários. Então John além de ficar sem casa ainda ficou todo endividado.

Ao retirar suas economias (milhões de Johns foram retirar também) os bancos faliram.
Centenas de bancos correram para as seguradoras, que também faliram.
Os bancos de investimentos que tinham investido nos bancos de crédito, faliram.
As pessoas que tinham investidos em ações dos bancos, das seguradoras, correm para vender suas ações, que não valem mais nada e então, não compram mais carros.
Aí a GM, Toyota, etc. estão falindo.
Não havendo venda de carros, as empresas de combustíveis (Petrobrás), de aço(Usiminas, CSN), de minério(Vale) reduzem a produção, e para manter os lucros, demitem os trabalhadores, que estão na base da cadeia produtiva.
O trabalhador é demitido, aí não compra mais nada, realimentando a crise, fechando o ciclo.

A lógica perversa do capital de “concentrar os lucros e socializar os prejuízos” começa a funcionar, com os governos ajudando os bancos.
E, ao arrepio dos teóricos neoliberais, o mercado demonstra que não pode viver sem o Estado.

Crise passa longe do microcrédito

Área de baixa renda do Banco do Brasil e o Grameen Bank não sentem as dificuldades dos grandes bancos. (Jamil Chade, GENEBRA)

Em 13 de outubro de 2006, o Prêmio Nobel da Paz, foi para um bengalês: Muhammad Yunus.

O Banco Grameen , de Yunus, criou microcréditos voltada para a população de baixa renda de Bangladesh, que não era atendida por nenhuma instituição financeira convencional, por isto, Yunus foi chamado de “O Banqueiro dos Pobres”. A metodologia que ele utiliza é dar crédito a pequenos grupos de pessoas que tinham uma cooperativa – normalmente atividade rural e liderados por mulheres – e não tinham acesso a nenhuma linha de crédito. O lastro era a perspectiva do investimento nos trabalhadores e na produção que eles poderiam obter. Deu certo. Seu modelo é utilizado atualmente em mais de 40 países.

Sua história e porque o prêmio Nobel da Paz e não de Economia foi para um banqueiro, assombrou o mundo. Ao conferir o Premio Nobel da Paz a um projeto econômico, fica evidente a tendência de vinculação entre economia, inclusão social e erradicação da miséria.

Em meio ao turbilhão financeiro da atualidade, o segmento o microcrédito, utilizado pelo Banco Grameen, de Bangladesh, parece estar sobrevivendo e até se expandindo:. Seu índice de indimplência está em torno de 2% (98% dos tomadores de empréstimo honram seus compromissos). Conforme suas palavras:
(…)os bancos pobres são mais confiáveis que os ricos. “Quem criou essa confusão toda não foram os pobres, mas os grandes bancos internacionais”, disse. “Nosso banco foi desenhado com base na confiança; não há advogados.”

Para ele, “o mercado se transformou em uma casa de apostas, num cassino sem controle. “Não por acaso acabamos nesse tsunami”, afirmou. “O que vemos hoje é o fracasso coletivo do mercado, não apenas de reguladores.”

O que tiramos dos exemplos reais é a grande diferença entre o investimento na produção e na inclusão social em contraposição à aposta dos grandes bancos, no virtual, na ciranda financeira sem nenhuma entrega de mercadoria.

A crise veio para ficar. Onde vamos parar, somente o tempo dirá.

* Vicente Trindade é Engenheiro, Diretor Vice-Presidente da Fisenge e do Sindicato de Engenheiros de MG, especialista em Engenharia Econômica.