A hesitação do empresariado em investir se torna compreensível à luz de tantas condicionantes da política econômica. O país está diante de uma encruzilhada
Os anos passam e a Selic passa junto, como o chato que não arreda pé. A taxa de juro básica começou 2011 em alta e termina em baixa, mas já fomos avisados de que poderá haver recidiva em 2012. Virada de ano precedida de alerta equivale a desconfiar das alternativas.
“Caso o cenário de inflação em alta para 2013 se confirme, vamos tomar providências”, preveniu Carlos Hamilton, diretor de Política Econômica do Banco Central, ao divulgar o relatório de inflação do quarto trimestre recheado de projeções. O BC prevê inflação perto da meta (4,5%) ao fim de 2012, com a economia crescendo 3,5%. Este ano deve crescer em torno de 3%. Será assim? Depende muito mais do que fizer a presidente Dilma Rousseff que da crise externa.
O país há muito tempo está por si e atado à sorte das commodities no mercado internacional, o que nos une mais à China que aos EUA, que começam a engrenar, e à Europa, enrascada cada vez mais. Certo é que crescerá o protecionismo no mundo, provavelmente reduzindo o comércio global. Os investimentos externos deverão murchar até que se reduza a enorme capacidade instalada tornada ociosa pela crise. E a tensão geopolítica vai acirrar-se em várias partes do mundo.
Em meio a tal cenário se insere o Brasil, com duas trajetórias em princípio antagônicas: o crescimento movido pelo investimento, mas também pelo consumo alavancado por facilidades do crédito e pelas transferências orçamentárias de renda, incluindo o salário mínimo real atrelado ao PIB. Ficam restritas a fraqueza cambial, devido à sequela sobre o salário real, cuja promoção é a base do contrato social gerido desde o governo Lula, e a queda estrutural da Selic.
Para acomodar tantas intenções, algo sempre fica para trás. Neste ano foram o investimento público, pois o grosso foi postergado, e o salário mínimo, que não teve correção real. Para 2012, serão a folha do funcionalismo federal – já que o orçamento fiscal estima aumento nominal de 4,5% – e os rentistas, se o juro real continuar cedendo. São metas difíceis, que mexem com interesses poderosos.
Pouco campo de manobra
O menor aumento nominal da folha do setor público até hoje, diz o economista Fernando Montero, foi de 6,7%. A queda sistemática dos juros, além disso, é função da inflação, que segue colada ao teto da meta (6,5%), enquanto a Selic já recuou desde agosto de 12,50% ao ano para 11%. A expectativa implícita de economistas da Fazenda é que ela chegue a abril entre 9% e 9,5%, com inflação de 5%.
A alternativa aos juros do BC é a restrição ao crédito, que foi afrouxado para vitaminar a demanda e, supõe-se, o crescimento do PIB. Supõe-se, porque o viés da indústria internacionalizada leva o consumo a ser cada vez mais atendido por importações diretas ou disfarçadas no processo produtivo. E importação desfalca o PIB.
Discursos conflitantes
Tantas contradições talvez expliquem o alerta do diretor do BC a respeito da associação entre a Selic e a inflação. O governo mesmo tem tentado conciliar dois discursos opostos, segundo Montero.
O primeiro é o de que a solidez das contas fiscais nos diferencia no mundo. “Ele aponta para gastos que o governo quer reter (e acha que pode), sobretudo com o funcionalismo federal e com as emendas parlamentares”, diz. “Acredito na determinação da presidente em conter tais rubricas.”
O segundo discurso é do gasto anticíclico, do “não à recessão”. Ele realça o mercado interno e é dirigido por gastos, segundo Montero, que “o governo não quer segurar, como os investimentos, ou não pode – o forte aumento do salário mínimo”.
Janela fiscal fechada
Em síntese, segundo Montero, 2012 começará impulsionado por gasto público crescendo acima do PIB e projetando um superávit primário menor, por ora garantido pelo governo em 3,1% do PIB. Com o quadro externo recessivo e a política econômica expansionista, um acomoda o outro.
Menos juros e mais câmbio também vão reforçar o fôlego no início de 2012. A contrapartida é que a janela da contenção fiscal aberta em 2011 vai estar fechada em 2012, comprometendo a redução estrutural da Selic antes mesmo que os juros bancários estivessem em rota declinante.
A alternativa será confiar em nova surpresa da arrecadação tributária. À falta dela, ou haverá aumento de carga ou menos superávit primário ou as duas coisas de uma vez.
As razões para hesitar
A hesitação do empresariado em investir se torna compreensível à luz de tantas condicionantes da política econômica. Não será com o ministro Guido Mantega falando de crescimento de 5% em 2012 que a realidade será diferente. O país está diante de uma encruzilhada.
Um lado leva à commoditização da economia. Outro, a uma genuína e inovadora plataforma industrial. Ambos os caminhos têm sequelas. O 1º implica um contrato perpétuo com as commodities, sobretudo com o pré-sal e a China. O 2º requer que se reveja o contrato social, para que o investimento cresça mais que as transferências de renda em relação ao PIB. O que for de 2012 vai resultar de tais embates.
Fonte: Boletim Cidade Biz
Por: Antonio Machado