A lona subiu e a cortina desceu. A noite de sexta-feira (5/8) foi marcada pela magia do “Circo da Democracia”, inaugurado em Curitiba. O ato aconteceu no dia da abertura dos Jogos Olímpicos e tem o objetivo de denunciar o golpe ocorrido no Brasil e, com alegria, promover o debate e o diálogo na sociedade. Aos poucos, mulheres, homens e crianças lotaram o circo e a lona foi tomada pela fantasia e pela utopia. Artistas circenses fizeram apresentações pirotécnicas e de equilibrismo, além das tradicionais gargalhadas com os palhaços. O professor Carlos Marés abriu o circo contando sobre o contexto histórico do evento. “Estamos no mesmo espaço, onde montamos o ‘Circo da Constituinte’, em 1987, quando era uma simples arquibancada. Hoje, a Constituição começa a se romper no Brasil e temos a finalidade de debater a nossa jovem democracia, que é o meio de produzir e reproduzir vida e cultura. Esse não é um circo capitalista. É um circo solidário”, afirmou Marés, também agradecendo à família circense Zanchettini, que promove boa parte do espetáculo.
Com uma rosa vermelha em mãos, a rosa do povo, o sociólogo Emir Sader iniciou sua fala destacando que no Rio de Janeiro, a cidade vive uma festa. Uma festa de lutas, manifestações e resistências. “A direita perdeu quatro eleições e não querem apenas romper com a democracia. Querem retomar o projeto econômico com uma agenda de destruição do patrimônio público, de financiamento privado de campanha e parlamentarismo. Hoje, quem ocupa o governo é a parcela 1% mais rica do país. Terminamos a ditadura e não avançamos na democracia social”, disse Emir, prestando solidariedade à atriz Letícia Sabatella que foi agredida na mesma praça nas últimas semanas.
Não é pão e circo. É luta e comunidade. A sede é pelo diálogo. E os tempos de intolerância exigem a reconstrução do campo progressista. “Estamos diante de narrativas de ódio e precisamos preservar os rumos do país no campo democrático progressista. Esse golpe é político e estamos organizando forças para o enfrentamento”, destacou o integrante do “Advogados pela Democracia” e também da coordenação geral do “Circo Pela Democracia”, Eduardo Faria. E quem disse que a luta precisa ser dura? “A ideia do circo parte do princípio que dentro da luta pode e deve haver alegria, o que motiva corações e mentes. Este também é um recado para as forças golpistas que estamos organizados numa frente de resistência articulada para criar e reforçar um pensamento contra hegemônico”, disse o vice-presidente do Senge-PR e diretor da Fisenge, Valter Fanini, um dos integrantes da organização do “Circo da Democracia”.
Jovens e mulheres
Nos últimos anos, mulheres e jovem têm ocupado o protagonismo nas ruas. E a disputa das narrativas é fundamental para a organização da classe trabalhadora. “A juventude mostra preocupação com tudo que está acontecendo. O jovem quer lutar e se preocupa com o país”, apontou a estudante de engenharia química, Letícia Partala, de 19 anos. Adriana Oliveira, da coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) reforça a importância da luta das mulheres e ainda sobre o momento histórico. “A luta pela democracia também é a luta pela reforma agrária e pela reforma urbana”, concluiu.
A mestranda em direito e militante feminista, Kellyana Veloso explica que o debate extrapola os muros da universidade e ocupa as praças e as ruas. “Curitiba não é uma República. Curitiba é negra, é feminista é LGBT, e da periferia. Em Curitiba tem muita resistência e luta. Este é um momento de diálogo e construção de pontes, e não de polarização”, reforçou.
Unidade na mobilização
O professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e vice-presidente da Associação dos Professores da UFPR, Luiz Allan acredita que a conjuntura não conseguiu vencer as arestas do campo da esquerda. “O fundamental é que estamos dialogando e conseguimos reunir muitas organizações sindicais. O Circo abre um espaço onde o diálogo da esquerda possa se reconstruir e essa reconstrução passa pelas bases”, reafirmou o professor.
Mais de 100 entidades participam da organização do evento. O ex-presidente da Fisenge e atual presidente do Senge-PR, Carlos Roberto Bittencourt dialoga no sentido de que este pode ser o início de um espaço unificado contra o golpe. “Conseguimos aglutinar três centrais sindicais, várias associações e movimentos estudantis e sociais. O Brasil acompanha esse movimento em Curitiba e precisamos unificar as forças para lutar contra as propostas do governo interino para mudar a legislação trabalhistas e retirar direitos sociais”, ratificou Bittencourt contando que o Senge-PR e a Fisenge participaram ativamente da organização do “Circo da Democracia”.
Além de gritos uníssonos de “Fora Temer”, a plateia também lembrou da violência praticada pelo governo do estado contra os trabalhadores da educação e protestaram em uma só voz “Fora Richa”, aludindo ao governador Beto Richa. “Esse é um espaço para promovermos reflexão, uma avaliação da conjuntura e, sobretudo, projetar a superação desse período para sustentarmos o processo democrático, que se coloca em profunda contradição. Também é um estímulo para retomarmos uma projeção de futuro”, finalizou o presidente da Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP), Hermes Silva Leão.
Aos poucos, o Circo baixou a cortina e acendeu a chama da utopia por uma sociedade justa, igualitária e fraterna. O circo permanece nos sonhos de mulheres e homens, fortalece as forças de resistência e anima a capacidade de luta. Que a lona e a luta sigam firmes.
Texto: Camila Marins (Fisenge)
Foto Vírus Planetário