A modelagem para a privatização da Eletrobras, aprovada pelo Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (CPPI), no último dia 19, favorece bancos, acionistas estrangeiros, o mercado financeiro, criticou o diretor da Associação dos Empregados de Furnas (Asef) e do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ), Felipe Araújo, em entrevista ao Programa Faixa Livre (clique para ouvir). Segundo ele, “o dinheiro vai sair do bolso dos consumidores, dos comerciantes e industriais brasileiros, que vão pagar mais pela energia para os bancos.”
Estimada em R$ 113 bilhões, a operação já teria atraído o interesse de 14 bancos, o que demonstra, diz Felipe, que são mesmo o mercado e os acionistas, e não a população brasileira, os maiores interessados na privatização. “E estou falando principalmente dos acionistas externos, que vão se valer da diferença de câmbio, por exemplo, para comprar muitas ações da Eletrobras.”
De acordo com o dirigente, as chamadas poison pills (pílulas de veneno), dispositivos que visam impedir a formação de blocos acionários com mais de 10% de participação, “são completamente falhas”. “Essas medidas podem ser contornadas, como já mostramos em audiências públicas no Congresso. Várias empresas externas são controladas por outros majoritários, por exemplo, nações. E podem comprar 10% cada uma, sem conformar um bloco, mas controladas todas pelo seu acionista majoritário que é outro país. É o caso da China, com cinco empresas no Brasil, que podem comprar, cada uma, 10% das ações da Eletrobras.” Com o áudio do banqueiro André Esteves, dono do BTG, publicado pelo portal 247 (ouça aqui), “temos a real noção de que são os bancos que controlam a nação, não o povo”, destaca Felipe.
A previsão do governo de realizar a venda das ações no primeiro semestre de 2022 “é irreal”, avalia o dirigente. Ele observa que já existem, contra a operação, duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) e questionamentos também na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em tese, os próximos passos são o envio dos parâmetros da privatização ao TCU para confirmação do valor de outorga; depois, a realização de uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) com os acionistas da Eletrobras para aprovação da capitalização; a implementação das mudanças societárias – uma nova empresa, a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBpar), passará a deter o controle da Itaipu Binacional e da Eletronuclear, que precisam continuar estatais; e, por último, um novo acórdão do TCU relacionado à oferta das ações, antes da efetiva oferta ao mercado.
Na opinião de Felipe, o valor do bônus de outorga, de R$ 23 bilhões, é “ridículo”, considerando o tamanho da dívida do país, e que se trata do controle da maior empresa de energia elétrica da América Latina. A validação da modelagem do BNDES pelo CCPI em menos de 24 horas revela, na sua avaliação, a falta de seriedade e de transparência no processo. “Estão preocupados apenas em fazer o negócio”, diz. “A primeira coisa a ser dita sobre a modelagem é que sua motivação é totalmente errada e busca enganar a população. Afirmam que a empresa não tem capacidade de investimento, o que é mentira; que vão poder ter reforço de caixa, mas o caixa da empresa já é forte e a relação Dívida/ Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] nunca esteve tão saudável.”
Uma vez privatizada, argumenta Felipe, mesmo a volta da empresa aos leilões de energia deixa de reverter a favor do consumidor. “A participação da Eletrobras pública beneficia sim o consumidor, comprovadamente, porque como empresa pública joga para baixo a tarifa; mas, privada, estará buscando lucro e não a tarifa ótima, a melhor para a população, e sim a mais atrativa para o acionista.”
O diretor do Senge RJ cita, ainda, as obrigações impostas pela Lei 14.182, como os investimentos em gasodutos e a instalação de termelétricas, como fatores adicionais para o aumento da tarifa. Também é importante, diz Felipe, que as pessoas entendam o que significam os R$ 30 bilhões destinados à modicidade tarifária, ou seja, para atenuar o aumento das tarifas de energia. “Essa modicidade é uma solução temporária, até que esse recurso acabe. Um pouso suave, para enganar a população.”