Há um ano, no dia 6 de fevereiro de 2019, foi fundado o Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento. O ONDAS nasceu com o propósito de promover a ação conjunta, autônoma e crítica de instituições acadêmicas, de movimentos sindicais e sociais de todo o país, pela efetivação dos direitos à água e ao saneamento, por meio da gestão pública e democrática.
Entre as diretrizes do ONDAS destacam-se a defesa do acesso universal à água e ao saneamento básico como direitos humanos, cuja promoção é de responsabilidade dos Estado e a consequente construção e fortalecimento da prestação dos serviços de saneamento básico por entidades de natureza pública, observando os princípios de solidariedade, universalidade, equidade, integralidade com participação e controle social e produção de pensamento crítico socialmente referenciado.
O Observatório trabalha na perspectiva de que, a partir da produção e disseminação de dados, análises e estudos críticos, seja possível enfrentar, de modo mais efetivo, o processo de mercantilização da água e de privatização do saneamento, que tende a dificultar o acesso ao serviço, principalmente por parte da população mais pobre.
Não era nova a ideia de se criar um “observatório do saneamento” na perspectiva dos que defendem o direito humano à água e ao esgotamento sanitário, e a água como direito e não mercadoria. O primeiro documento que tratou do tema, abordando aspectos conceituais e organizativos, foi elaborado pela Profa. Ana Lúcia Britto (UFRJ), Prof. Léo Heller (então da UFMG), Prof. Luiz Roberto Santos Moraes (UFBA) e a então Pesquisadora Patrícia Borja (hoje professora da UFBA), em janeiro de 2007.
No entanto, a criação do observatório foi sendo postergada em razão das dificuldades enfrentadas pelas organizações populares potencialmente interessadas. Mas, em março de 2018, durante a realização em Brasília do Fórum Alternativo Mundial da Água – FAMA, representantes de movimentos sociais e populares da cidade e do campo de todas as regiões do País, do movimento sindical, notadamente dos urbanitários, acadêmicos professores (as), estudantes pesquisadores (as) de várias universidades, resolveram desencadear um debate sobre o caráter, o funcionamento e a estrutura desta nova entidade. Foi deste rico processo, baseado em muita reflexão e discussão, que surgiu o ONDAS.
Nesse primeiro ano de atuação, o ONDAS já ocupa um papel de destaque, sendo reconhecido como mais um instrumento de luta e resistência na defesa da universalização do acesso aos serviços de saneamento básico a toda a população, independente da sua condição social e da sua capacidade de pagamento.
Nossa comunicação tem cumprido papel de destaque no relacionamento com entidades e pessoas que têm a questão da água e do saneamento como temas centrais da sua atuação. O Observatório conta com páginas no Facebook[i], no Instagram[ii] e na Internet[iii]. Por estes meios divulgamos os relatórios traduzidos para o português do Relator Especial da ONU para os Direitos á Água e ao Esgotamento Sanitário, disponibilizamos resenhas e trabalhos acadêmicos de interesse, bem como notícias de maior relevância. Já contamos com milhares de seguidores, sendo o ONDAS um veículo de difusão de informação qualificada sobre a prestação de serviços de saneamento básico.
Em 2019, o Observatório participou de debates e audiências públicas sobre os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional objetivando alterar o marco legal do saneamento básico com vista à privatização. Contribuiu também com emendas ao Plano Nacional de Saneamento Básico – PLANSAB, que esteve em consulta pública até o dia 22 de abril de 2019.
Em outubro, em parceria com o Relator Especial da ONU para os Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário, Léo Heller, que integra o Conselho de Orientação do ONDAS, promoveu uma mesa redonda com o tema: “Direitos humanos à água e ao saneamento na prática: uma agenda de prioridades para as cidades brasileiras”. Este evento estudou os seguintes temas:
– acessibilidade financeira, abordando a necessidade e amplitude da tarifa social, a vedação do corte do abastecimento de água e a necessária garantia de volume mínimo gratuito além de apoio, por parte do poder público, às pessoas, cuja residência não está conectada às redes de abastecimento de água e esgotamento sanitário ou cujo domicílio não dispõe de banheiro;
– equidade de gênero, que priorizou o debate sobre oportunidades desiguais e violações dos direitos humanos no acesso à água e ao esgotamento sanitário; as múltiplas formas de discriminação e o tratamento iníquo nas leis e políticas públicas; correção das desvantagens econômicas, foco na intersetorialidade e nas medidas responsivas às desigualdades baseadas em gênero;
– direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário em esferas de vida, além do ambiente doméstico com ênfase em espaços públicos, com foco na garantia de acesso pela população em situação de rua;
– regulação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário e realização dos direitos humanos, responsabilização do poder público, nos diferentes níveis da Federação, para cumprirem suas obrigações em relação a esses direitos.
Em setembro passado, o ONDAS produziu um estudo que comparou a evolução dos da oferta dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário em relação ao crescimento do PIB brasileiro[iv] no período de 2007 a 2017. A metodologia utilizou dados extraídos do Sistema Nacional de Informações em Saneamento (SNIS) do Governo Federal, abrangendo amostra de 4.104 municípios, no período referido. Verificou-se que o crescimento de variáveis que caracterizam a evolução da oferta dos serviços neste período, como número de ligações totais de água, número de ligações totais de esgotos, volume de água produzido e volume de esgoto tratado, foi do modo geral, superior ao crescimento do PIB nacional, bem como de seus componentes por setor produtivo: agropecuária, indústria e serviços.
Mais recentemente, o ONDAS vem debatendo internamente o Programa Nacional de Saneamento Rural com a perspectiva da formação de um núcleo temático de direitos humanos a água e ao esgotamento sanitário em áreas rurais.
Nossos principais desafios em 2020 consistem e ampliar, aprofundar e estreitar os laços com as entidades representativas dos movimentos sociais e populares da cidade e do campo, sobretudo dos povos das águas e das florestas e daqueles que lutam pela reforma urbana com o objetivo de construirmos cidades socialmente justas, democráticas e inclusivas; com o movimento sindical; com estudantes, professores (as) e com pesquisadores (as) acadêmicos.
Nos percebemos com parte do amplo movimento de combate ao autoritarismo e filo fascismo do atual governo federal, de denúncia e resistência às políticas neoliberais, pró imperialistas e entreguistas. Somamo-nos aos que lutam pela democracia e pelas causas populares no Brasil e no mundo.
Relevante destacar que nossa principal sustentação tem sido as anuidades pagas pelos associados. Assim, estamos intensificando nossa campanha de associação, ao mesmo tempo que buscamos financiamento por meio de projetos coerentes com nossos objetivos e princípios, sem abrir mão da independência do ONDAS em relação ao mercado e a todos aqueles que não reconhecem o direito à agua e ao saneamento básico como um direito fundamental.
Entramos nesse segundo ano do ONDAS com a mesma energia que tivemos quando o criamos. Convidamos aqueles que priorizam estas lutas para se juntarem a nós como associados do ONDAS.
Para comemorar seu primeiro aniversário, o ONDAS irá promover em 26 de março próximo, na cidade de São Paulo, um seminário aberto com o tema “Privatização dos serviços de saneamento básico e ameaças aos direitos humanos à água e ao saneamento”. Participe! Mais informações em: www.ondasbrasil.org.
Água e saneamento são direitos e não mercadoria.
6 de fevereiro de 2020.
Coordenação do ONDAS