Arrecadação foi o triplo da esperada; Divisão da próxima venda garante engajamento do Senado na reforma do governo
Os campos da região Nordeste não receberam ofertas. Ambientalistas comemoram resultado de mobilização pela preservação da marinha / Agência Petrobras
Apesar de apenas 12 dos 36 campos terem sido arrematados no leilão de concessões realizado nesta quinta-feira (10), a arrecadação final foi muito superior à estimativa inicial feita pelo governo. De outro lado, o chamado megaleilão do pré-sal, previsto para novembro, foi autorizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), viabilizando um acordo político que envolve a votação da reforma da Previdência no Senado.
Se todos os 36 campos que foram a leilão nesta quinta tivessem sido arrematados pelo valor mínimo previsto pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), a arrecadação teria sido de pouco mais de R$ 3 bilhões. Com apenas 12 campos arrematados, o valor foi de R$ 8,9 bi. Nenhum campo no Nordeste recebeu ofertas, incluindo os na região de Abrolhos, local com a maior biodiversidade marinha do Brasil e do Atlântico Sul.
Para Thiago Almeida, da campanha de Clima e Energia do Greenpeace, o fato de ativistas terem conseguido “chamar a atenção” para a possibilidade de exploração petrolífera em Abrolhos foi “parte fundamental” para que as empresas não tenham participado do leilão dos campos que impactariam no local
“Entre as razões estão, sem dúvida, essa mobilização espontânea da sociedade civil, que começou com pessoas, antes de organizações e movimentos. Outro ponto é que os riscos são muito grandes e as empresas fazem análise de risco. As empresas percebem o absurdo que seria”, comemora Almeida.
Cloviomar Caranine, analista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e assessor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), acredita que, além da insegurança que a exploração em Abrolhos carrega, há outras razões para as decisões das empresas, o que inclusive explicaria o alto valor arrecadado no leilão.
Para ele, houve um interesse especial das petrolíferas por campos na “franja do pré-sal”, na expectativa de que se possa encontrar reservas desconhecidas. Outro elemento apontado em relação aos valores obtidos e de ordem geopolítica: os ataques à Arábia Saudita. Caranine relata que após o episódio no país do oriente médio, diversas empresas se credenciaram para o leilão ocorrido hoje.
Petróleo e acordo
O chamado megaleilão do pré-sal foi validado pelo TCU. Apesar de não haver necessidade formal de aprovação do órgão, o aval reforça garantias para que o leilão ocorra em novembro. Os valores que se esperam obter nesta rodada – mais de R$ 100 bilhões – ganhou uma importância política inédita. A discussão em torno da divisão desse montante chegou a ser uma ameaça de trancamento da discussão em torno da reforma da Previdência.
Um acordo político foi fechado, ao menos provisoriamente, garantindo 15% da arrecadação com os leilões para os estados e o mesmo percentual para municípios. Caranine avalia que esse modelo é de grande risco tendo em vista a questão do desenvolvimento econômico.
“É muito ruim misturar recursos que vêm da exploração de petróleo com debate político para se tentar aprovar um ou outro ponto. Um país que tem muitas reservas de petróleo tem que ter muita estratégia na hora de explorar. O petróleo dá muito dinheiro, e isso pode ser um problema”, explica.
O analista se refere ao que se chama, em economia, de “doença holandesa”. No caso do petróleo, um bem finito, o não investimento da renda petroleira em setores que permitam diversificar e dinamizar a economia pode levar ao aumento da dependência do país em relação ao produto. Uma espécie de “bilhete sorteado mal gasto”.
Para evitar essa situação, o governo federal deveria exigir garantias de que prefeitos e governadores vão investir a renda do megaleilão em áreas estratégicas, como educação ou no incentivo a cadeias produtivas. O acordo para a reforma da Previdência, entretanto, não prevê nada do gênero.
Fonte: Brasil de Fato / Escrito por: Rafael Tatemoto / Edição: Rodrigo Chagas