A relativização, por alguns “jornalistas econômicos” e “analistas de mercado”, sobre o resultado do IPCA de junho de 2017 ter registrado deflação (variação negativa dos preços) de 0,23%, a primeira desde junho de 2006, é uma tentativa de camuflar a profunda crise que o país atravessa: é uma amostra clara e robusta de como a economia brasileira está imersa num lodo no fundo do poço sem qualquer perspectiva de saída no curto prazo. Não há nada para se comemorar quando o resultado de baixa da inflação é resultado de uma forte depressão.
Ao contrário de vários outros países, o Brasil trabalha no regime de metas de inflação a partir do “índice cheio” do IPCA, ou seja, considera a variação completa do índice, que inclui tanto preços administrados (gasolina, energia elétrica, água), como os sazonais (alimentos, passagens aéreas e despesas com educação) ou ainda os vinculados ao “mercado livre” e concorrenciais (cabeleireiro, serviços em geral) e de produtos.
Nos EUA, por exemplo, a taxa de inflação considerada é um núcleo da inflação que inclui apenas os preços concorrenciais. Essa distinção é importante porque quando se considera os diferentes tipos de preços de forma separada torna-se mais efetivo o diagnóstico de inflação típica de demanda, onde uma política monetária de aumento de juros poderá ser mais eficiente e a um custo menor.
Como no Brasil trabalhamos com um índice cheio dentro de um ano calendário (janeiro a dezembro), em um sistema de metas de inflação, os únicos instrumentos de política monetária são os vinculados ao combate de uma inflação de demanda, mesmo que o aumento do índice não seja vinculado a esse tipo de aumento inflacionário. Dito de outra forma se há um “tarifaço” (aumento de preços administrados), como ocorreu no início de 2015, ou ainda uma crise climática que eleva os preços dos alimentos, somente “sobra” para a política monetária atuar os preços livres, mesmo que estes, efetivamente não estejam promovendo o “choque inflacionário” e não sejam as fontes primárias dos aumentos de preços.
Um aumento de juros, por exemplo, tem efeito direto na demanda interna (afetando diretamente os “preços concorrenciais”) além de promover uma possível valorização do câmbio, efeito indireto que diminui o preço dos insumos importados (“populismo cambial”) e auxilia a reduzir a pressão inflacionária.
A calibragem dos juros no Brasil precisa ser muito mais potente porque considera todos os preços, por que a queda de preços livres precisa compensar também a aceleração dos preços nos mercados administrados e sazonais, mesmo porque não se pode normalizar o regime de chuvas com aumento de juros, não é? Ou seja, não pode haver controle desses preços pelos juros.
Por isso que, mesmo com uma recessão brutal, a lógica de manutenção da política de juros altos reais (descontado a inflação) permanece. E juros altos reais neste caso (os mais altos do mundo), além de ter efetividade questionável no combate à inflação, por outro lado gera desemprego, aumento da dívida pública e reduz o consumo e o investimento.
Dito isso, ao verificar o caso brasileiro, a deflação acaba sendo uma combinação de elementos, todos apontando o cenário de deterioração econômica em que nos encontramos: enquanto em 2015 a inflação foi mais em função dos preços administrados (energia elétrica e gasolina) e sazonais (alimentos), fatores exteriores ao mercado de “preços livres” e, portanto indicando que não se tratava de uma inflação de demanda que poderia justificar uma política monetária austera, o índice desse mês – livre das influências dos preços administrados e dos sazonais – demonstrou claramente a o tamanho da crise, registrando uma deflação, ou seja, um movimento já de redução de preços dada demanda enfraquecida.
A deflação comprova a grave recessão que vivemos, mostra um completo desbalanceamento das políticas monetárias ao manter os juros reais nas alturas mesmo nesse cenário (e com isso aprofundando a recessão e o desemprego) e mostra o completo distanciamento da equipe econômica de Henrique Meirelles e Temer com a realidade da população brasileira.
Fonte: CUT/ DIEESE