O III Simpósio SOS Brasil Soberano, realizado na quinta-feira (8), em Belo Horizonte (MG), teve entre os palestrantes Clélio Campolina Diniz, engenheiro mecânico e de operação, ex-reitor da UFMG e Ministro de Ciência e Tecnologia e Inovação em 2014, durante o governo da presidenta Dilma Rousseff (PT). Na avaliação de Diniz, diante o cenário de crise mundial, “o capitalismo formal fracassou e o futuro está politicamente indeterminado”.
“No meu entendimento o capitalismo é um produto histórico, e tudo que é produto histórico tem um fim histórico. A grande pergunta é quando ele será destruído, em quanto tempo e o que virá no lugar. Eu acho que isso é uma tarefa nossa. Nós temos que encontrar a saída”, provoca.
Segundo o ex-ministro, a crise estrutural internacional contemporânea é profunda e diferente das anteriores, pelas seguintes características: o desemprego é estrutural; há uma proliferação de armas e guerras – e as guerras nunca ocorrem nos territórios das potências dominantes, que sempre estão no ataque; a imigração ocorre em massa, mostrando o colapso das antigas colônias; há um avanço do fundamentalismo religioso, com novas formas de conflito; a corrupção é generalizada; a concentração de renda cresce e se converte em um problema até para o capitalismo, que precisa de mercado; os problemas climático e ambientais se aprofundam; e a insegurança digital avança, a exemplo do que aconteceu nas eleições americanas e a desconfiança de que houve interferência da russa.
“Os paradigmas de sociedade que estão aí estão superados. A história não anda para trás”, completou.
Geopolítica mundial
Em sua explanação, Diniz apresentou dados e análises sobre o cenário mundial de crise política e econômica, e da fragilização do modelo capitalista. O engenheiro mostrou mapas mundiais com a comparação do tamanho dos territórios, dos PIBs e da população. A desproporção das imagens demonstra a centralidade destes três fatores para a análise global. Quando o fator em jogo é o PIB, o mapa da escala geográfica, conhecidos nos mapas tradicionais, incha da metade norte e encolhe no sul do globo. Já com quando o recorte é o tamanho da população, a Ásia se destaca. “São variáveis importante para discutir uma geopolítica do mundo”.
Europa Ocidental, Japão e EUA concentram 78% do PIB mundial e 64% das exportações, enquanto ocupam apenas 13% da área global e têm 12% da população.
Diniz chama atenção para o crescimento da China no que diz respeito ao PIB e às exportações. Com relação ao PIB, a potência saiu de 1,6% em 2000 para 9,8% do ranking global em 2014. O Brasil, no mesmo período, passou de 0,8% para 2,1%. Nas exportações, os chineses comprovam a intencionalidade dos investimentos na indústria: em 2000, o índice era de 0,6%, e 14 anos depois chega a 33,5%. No Brasil, o crescimento foi de 0,1% em 2000 para 1,1% em 2014.
No ranking de exportação de manufaturas, a China passa da 6ª posição em 2000, com 4,7%, para a 1ª posição, com 18,8%, em 2015. O mesmo se repete com a produção de manufaturas, em que o país ocupa o topo da lista, com 19,8%.
No Brasil, os setores mais sofisticados tecnologicamente são os que mais estão perdendo com a crise, de acordo com o Diniz. “Voltamos a ser um exportador de produtos primários”, lamenta. Segundo ele, neste período ficam evidentes as marcas escravidão, de um campo com concentração fundiária e com agricultor sem-terra, e de um Estado patrimonialista e cartorial.
A ciência e a tecnologia, na avaliação do ex-ministro, não servem para o bem da vida, e sim tem sido, ao longo da história do capitalismo, armas de competição. “Se nós vamos ser capazes de dominá-la, eu não sei”.
Saídas
Como bases para uma mudança de paradigmas da organização do Estado, Diz aponta a necessidade de garantir bem estar material, justiça social, sustentabilidade ambiental e soberania dos povos. Mas alerta para a necessidade de um planejamento estrutural e intecionalizado, que leve em conta a complexidade da sociedade brasileira, e que seja aplicado com um processo em constante avaliação e adaptação.
Entre as mudanças estruturais mais urgentes, aponta a reforma do Estado por meio de uma Constituinte, feita com participação popular. A reforma tributária deve passar a onerar mais as faixa da população com maiores rendimentos, e não o contrário, como ocorre no sistema atual.
Educação básica integral e de qualidade é outra proposta de Diniz, para o avanço em “igualdade de condições”. Na avaliação dele, manter a qualidade da educação precária é parte de uma estratégia de submissão. “O dia que você resolver a educação básica, você deixa de ter serviçais”.
O problema habitacional e de mobilidade urbana também precisa ser enfrentado. De acordo com pesquisas feitas a partir da renda de capitais brasileiras, o pesquisador constata uma profunda desigualdade: o rendimento médio da população do centro é 20 vezes maior do que a da periferia. A disparidade se repete quanto o índice medido é o de educação.
Diniz sugere uma reorganização territorial do país, com a criação de “policentros urbanos” nas regiões ainda não urbanizadas. Hoje com a densidade demográfica urbana está concentrado na faixa litorânea. E cobra o desenvolvimento de infraestruturas a partir do interesse público: “A infraestrutura não pode ser feita pela lógica do mercado, tem que ser para o bem da sociedade”. Para a reforma estrutural do Estado, aponta a convocação de uma Constituinte como essencial.
Diante do cenário de crise e da necessidade de construção de novas alternativas para a democracia brasileira, Diniz cobra uma autoavaliação sincera por parte das forças progressistas: “A gente tem que fazer autocrítica também, se não nós não vamos construir soluções. É desagradável, mas nós temos que fazer”.
“Nós temos que ser dialéticos na análise e cartesianos na ação. Nós temos que discutir os problemas, identifica-los, mas nós temos que politiza-los e partir imediatamente para a busca de caminhos de ação. Ou ficamos no nível do discurso, sem conseguir concretizar”, conclui.
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Por Ednubia Ghisi, do Senge-PR / Foto: Alessandro Carvalho