Por Júlia Garcia*
A exploração sobre as mulheres é uma das bases estruturais do capitalismo, portanto, para mudar a vida das mulheres precisamos transformar o mundo em que vivemos. E, para nós, não há como transformar a vida da classe trabalhadora sem transformar a vida das mulheres.
É fundamental para o desenvolvimento do capitalismo que a divisão sexual do trabalho seja perpetuada e que as barreiras entre o espaço público e o espaço privado sejam cada vez maiores.
No espaço privado ou doméstico há um conjunto de relações de reprodução social que são fundamentais para o funcionamento do espaço público. No entanto, no capitalismo, o que é valorizado é o trabalho que acontece fora das casas. O trabalho das mulheres realizado no âmbito doméstico é encarado como uma extensão natural do que é ser mulher.
O capitalismo acirrou a divisão entre espaço público, o local da produção, e o espaço privado, o local da reprodução, e organizou os homens e mulheres para assumirem seus papéis nesses dois espaços. A divisão sexual do trabalho estrutura as relações sociais entre homens e mulheres em nossa sociedade e contribui para a manutenção da desigualdade.
A CLT, no artigo 461, garante que trabalhadores com função idêntica, exercendo tarefas para o mesmo empregador, no mesmo município, com igual produtividade e perfeição técnica, devem receber salários iguais. Proibindo qualquer distinção de sexo, cor da pele, nacionalidade ou idade.
Porém, atualmente, os homens ganham, em média, 30% a mais que as mulheres, mesmo quando realizam as mesmas atividades. E isso tem reflexo no presente e no futuro, quando se aposentarem. As tarefas domésticas e de cuidados, tais como limpeza, cuidado de crianças e de idosos, permanecem como uma responsabilidade quase exclusiva das mulheres, ampliando sua jornada de trabalho social. Por isso, esse trabalho deve ser valorizado e compartilhado.
Para que esse quadro seja revertido, as/os trabalhadoras/es devem cotidianamente lutar pelo princípio da igualdade, que é uma reivindicação histórica para garantir que homens e mulheres tenham as mesmas condições para decidir o que é melhor para suas vidas.
Isso pressupõe que tenham as mesmas condições de acesso, permanência e ascensão no mercado de trabalho; acesso à justiça; à terra; aos serviços públicos; à participação nos espaços de representação formal nos partidos políticos e nos movimentos e organizações sociais.
Para a ONU, o período atual representa um tempo de riquezas sem precedentes, mas, apesar disso, as mulheres ainda ocupam os empregos com menores remunerações e menos qualificados, e continuam a viver em condições mais precárias de saúde, acesso à água e saneamento e são responsáveis por uma carga excessiva de trabalho doméstico não remunerado referente aos cuidados com filhos, com pessoas idosas e doentes e com a administração do lar.
Além deste cenário, temos ainda a carência de equipamentos públicos de assistência às mulheres, como creches. As mulheres brasileiras trabalham, em média, quase cinco horas a mais que os homens por semana. São 56,4 horas, somando o tempo gasto no emprego com o de afazeres domésticos.
Em 2014, as mulheres receberam em média 74,5% da renda dos homens, isso se não levarmos em conta a questão racial: as mulheres negras recebem em média 40% dos salários dos homens brancos. Entre as pessoas formadas em universidades, por exemplo, elas são maioria (61%), mas o salário entre pessoas com nível superior as mulheres recebem 30% a menos, mesmo possuindo mais tempo de estudo.
Com a crise econômica que se apresenta, as mulheres são as primeiras a serem demitidas, além de terem menos direitos trabalhistas e a dependerem de salário mínimo. A representação das mulheres no Congresso, segundo o índice, é de apenas 10% das cadeiras. Essas são expressões de uma sociedade machista e racista.
As mulheres são consideradas trabalhadoras de “segunda categoria”, que complementam os rendimentos do lar, pois os homens seriam os “principais provedores”. Mas basta olharmos para grande parte das famílias brasileiras para vermos que isto é uma grande farsa, uma vez que as mulheres chefiam cada vez mais as famílias, que o número de mães solteiras aumenta a cada dia e assim por diante. Não há mais desculpas para justificar esta desvalorização e discriminação na sociedade.
No mercado de trabalho, temos um índice muito pequeno de sindicalização entre as trabalhadoras, que faz com que a luta por igualdade salarial seja ainda muito fraca, além da luta pelo fim do assédio moral e sexual, que ocorre cotidianamente nos ambientes de trabalho de forma velada ou não.
Estes dados demonstram o quão importante a mobilização das mulheres em busca de melhores condições de vida, da valorização do seu trabalho e de maior participação na sociedade. Sua voz precisa ser ouvida e é necessária a junção de forças para a superação destas diferenças, rumo a uma sociedade justa e igualitária, na qual as mulheres não sejam consideradas seres de segunda categoria. Seu protagonismo é fundamental para a superação desta superexploração.
A luta das mulheres não começou hoje e não está próxima de terminar, porém, todos os direitos até então conquistados são fruto de muita resistência, o que deve nos dar ânimo e força para nos mantermos em rebeldia e não aceitarmos a naturalidade forçada das estruturas sociais atuais.
Precisamos nos comprometer com: a construção concreta e cotidiana de um sindicalismo amplo e massivo, para organizar as trabalhadoras para que engrossem as fileiras. Devemos nos comprometer com a solidariedade, combatendo o corporativismo que só fortalece o sistema que nos oprime; com a combatividade porque sabemos que a luta é o que de fato transforma a realidade; com a ousadia para inovar com criatividade, estimular novos métodos e práticas e com a superação das opressões, em todos os espaços, porque o mundo dos trabalhadores não será justo se persistirem o machismo, o racismo e a homofobia.
08 de março é um dia de luta muito importante para refletirmos a importância da luta de mulheres trabalhadoras que ousaram dizer não para esta sociedade desigual, diante de tamanha exploração e discriminação. Precisamos nos somar a esta luta histórica e levarmos adiante o legado de tantas que deram sua vida para seguirmos, lado a lado, na busca da tão sonhada sociedade em que todas as pessoas são iguais.
*Júlia Garcia é Mestra em Geografia, Militante da Marcha Mundial das Mulheres e do Coletivo de Mulheres da Fisenge