“A crise ambiental se impôs na agenda política não só do Brasil, como no mundo no final do último século e no início do atual. Há consenso sobre a necessidade de mudança, mas não há consenso sobre as causas e também sobre a profundidade das medidas a serem tomadas. Há resistências – ou interesses – muito fortes contra as mudanças, e elas são especialmente fortes no meio urbano. E mais ainda nos países emergentes e periféricos”. A afirmação é da arquiteta e urbanista Ermínia Maricato, responsável pelo desenvolvimento da tese A Cidade Sustentável, a ser debatida no 9º Congresso Nacional de Sindicatos de Engenheiros (Consenge) e apresentada às lideranças sindicais dia 30 de abril na sede da Fisenge.
De três em três anos a Fisenge promove o Congresso Nacional de Sindicatos de Engenheiros (Consenge). Em 2011 o encontro, considerado o mais importante fórum de debate dos sindicatos filiados à Fisenge, acontecerá do dia 7 ao dia 10 de setembro, em Porto Velho, Rondônia. Na ocasião, serão discutidas as propostas que resultaram dos debates nos estados das teses apresentadas para discussão. Em sua exposição sobre A Cidade Sustentável Ermínia posiciona o Brasil como uma das sociedades mais desiguais do mundo e aponta os fatores que dificultam a vida nas grandes cidades brasileiras.
“A ocupação desordenada da terra, a falta de controle sobre o uso e a ocupação do solo, a especulação fundiária e imobiliária sem regulação, a segregação urbana, o crescimento exponencial de favelas, os desastres decorrentes de desmoronamentos com mortes e até mesmo a alta taxa de impermeabilização do solo causadora de enchentes constantes, são causas articuladas de um processo que tem a valorização imobiliária no seu núcleo central”, afirmar a necessidade da prioridade ao transporte coletivo não implica em sua implementação: enquanto os discursos e promessas crescem, orçamentos públicos, em diversos níveis, priorizam investimentos para a circulação de automóveis.
A partir de sua visão crítica, a análise do conjunto de obras que compõem o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC mostra que ele não inova no que se refere a uma nova atitude em relação à questão ambiental, especialmente no que se refere à energia. De fato, várias mega obras relacionadas à infraestrutura econômica foram resgatadas da antiga orientação seguida pelo Regime Militar, contrariando a necessidade de repensar um plano inovador orientado por uma nova atitude – sustentável – de planejamento de Estado. Na área do saneamento ambiental, conquistas da primeira equipe que ocupou a Secretaria Nacional do Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades foram perdidas e obras insustentáveis – como o tamponamento de córregos e impermeabilização de calhas de vales – tiveram financiamento retomados repetindo erros dos anos da ditadura.
Segundo Ermínia, o mesmo não se pode dizer das obras do PAC – Habitação. “Elas constituíram uma inovação como prática do Governo Federal”, reconhece. O PAC – Habitação priorizou a urbanização de áreas precárias investindo na construção de bairros saneados sem a remoção da maior parte da ocupação já consolidada. Pela primeira vez na história do país as chamadas obras de urbanização de favelas atinge uma importância e escala sem precedentes. Esse programa dialoga com a cidade real, com o passivo urbano, com a cidade informal repassando recursos para prefeitos recuperarem bairros inteiros, verdadeiros focos de epidemias e insalubridade.
Já o Programa Minha Casa Minha Vida não seguiu essa lógica. Dialogando fortemente com o setor empresarial do mercado residencial (incorporadores e construtores), carreando recursos financeiros inéditos – oriundos do FGTS, do SBPE e subsídios orçamentários- mas deixando intocada a base fundiária, o MCMV contribui para repetir erros e falhas verificados durante o período de vigência do BNH- Banco Nacional da Habitação e SFH e Sistema Financeiro da Habitação. Concluindo, Ermínia previu que o atual programa do Governo Federal, Minha Casa Minha Vida, repetirá erros de programas habitacionais do passado. “O Programa Minha Casa Minha Vida não seguiu essa lógica. Dialogando fortemente com o setor empresarial do mercado residencial (incorporadores e construtores), carreando recursos financeiros inéditos – oriundos do FGTS, do SBPE e subsídios orçamentários- mas deixando intocada a base fundiária, o MCMV contribui para repetir erros e falhas verificados durante o período de vigência do BNH- Banco Nacional da Habitação e do SFH e Sistema Financeiro da Habitação”.
Ermínia Maricato é professora titular (1997) em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo; professora visitante da University of British Columbia/Center of Human Settlements, Canadá (2002) e da University of Witswaterhand of Johannesburg, África do Sul (2006). Foi Secretária de Habitação e Desenvolvimento Urbano da Prefeitura de São Paulo (1989/1992), Coordenadora do Programa de Pós Graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (1998/2002) e Ministra Adjunta das Cidades (2003/2005). (Alexandre Braz)