O próximo dia 1° de abril marcará os 50 anos do golpe militar no Brasil. Por esse motivo a Adital publica, a partir de hoje, uma série de quatro reportagens que abordarão, do ponto de vista histórico, os motivos que levaram o país a aderir ao golpe, inclusive com apoio de grande parte da população; falaremos também sobre a atuação dos órgãos de repressão; a resistência contra a repressão dos militares; e, por fim, construiremos um paralelo entre a atual situação do país e a época do golpe.
O pré-golpe
O golpe militar ocorrido em 1964 estabeleceu no Brasil uma ditadura que se estendeu até o ano de 1985. Ao longo desses 21 anos, o regime militar endureceu o governo, tornando legais práticas totalmente contrárias aos direitos humanos, como a censura e a tortura, por exemplo. Os militares combateram, sem piedade, qualquer ameaça “comunista” ou de manifestantes contra o governo, marcando, na história do Brasil, um período sombrio, caracterizado por atos autoritários e violentos. A simples desconfiança de que alguém era “comunista” já era motivo para espionar e prender a pessoa para averiguação, começando, nesse momento, um cruel processo de tortura psicológica e, em muitos casos, física.
A decisão, por parte dos militares, de aplicar um golpe de Estado num governo eleito democraticamente não foi algo repentino, aconteceu como consequência de uma série de fatos políticos acumulados no período pós Getúlio Vargas, agravados pela decisão deste presidente de por um fim à própria vida. Após a morte de Vargas, Juscelino Kubitscheck (JK) foi eleito de forma direta. JK desenvolveu uma forma de governar que lhe possibilitou a conquista de um grande apoio da população; seu slogan “50 anos em 5” se tornou extremamente popular entre os brasileiros.
A decisão, por parte dos militares, de aplicar um golpe de Estado num governo eleito democraticamente não foi algo repentino, aconteceu como consequência de uma série de fatos políticos acumulados no período pós Getúlio Vargas, agravados pela decisão deste presidente de por um fim à própria vida. Após a morte de Vargas, Juscelino Kubitscheck (JK) foi eleito de forma direta. JK desenvolveu uma forma de governar que lhe possibilitou a conquista de um grande apoio da população; seu slogan “50 anos em 5” se tornou extremamente popular entre os brasileiros. Contudo, o governo JK também já vinha sendo marcado por indícios de os militares esboçavam um golpe de Estado.
Jânio Quadros e a tentativa de auto-golpe
“Varre, varre,varre vassourinha!
Varre, varre a bandalheira!
Que o povo já tá cansado
De sofre dessa maneira…”
O trecho musical acima faz parte do jingle da campanha eleitoral do sucessor de JK na Presidência da República, Jânio Quadros. O jingle e a campanha eleitoral como um todo causaram uma ótima impressão nos brasileiros, tornando Quadros presidente com uma aprovação nunca antes vista nas urnas. A vitória avassaladora, com 5,6 milhões de votos, fez com que o presidente eleito acreditasse em um auto-golpe de Estado. Acreditando que o povo estaria sempre ao seu lado, o próprio Quadros arquitetou uma renúncia. O objetivo era voltar ao poder por meio de um pedido amplo de retorno, que só seria aceito se lhe fossem dados poderes absolutos. Sete meses após sua eleição, ele pôs em prática esse plano e renunciou ao cargo. No entanto, contrariando as expectativas, o povo nunca pediu que ele retornasse e o cargo de presidente acabou sendo ocupado por seu vice, João Goulart, conhecido como Jango. Contudo, não foi fácil para Goulart assumir o cargo que era seu de direito.
À época da renúncia de Jânio Quadros, este estava em uma viagem diplomática na República Popular da China, o que causava calafrios nos militares brasileiros, assumidamente anti-comunistas. Aproveitando a situação, os militares acusaram Jango de ser comunista e o impediram de assumir o cargo máximo do país.
Após muitas negociações, mediadas inclusive por seu cunhado Leonel Brizola, os apoiadores de Jango e a oposição acabaram fazendo um acordo político pelo qual seria criado um regime parlamentarista, em que o presidente é apenas um chefe de Estado com poderes reduzidos. Em 1961, João Goulart assumiu o tal governo parlamentarista. Contudo, dois anos depois, houve um plebiscito e o povo, com um percentual de 82%, optou pela volta do presidencialismo. Então, em 1963, Jango, finalmente, assumiu a Presidência com amplos poderes.
Durante o governo de Jango, tornaram-se notórios os vários problemas estruturais na política do Brasil, acumulados nas décadas que precederam o golpe, e as disputas de natureza internacional, no âmbito da Guerra Fria, que desestabilizaram seu governo.
Jango adotou uma política econômica mais conservadora, diminuindo a participação de empresas estrangeiras em setores estratégicos da economia e instituindo um limite para a remessa de lucros das empresas internacionais, seguindo as orientações do Fundo Monetário Internacional, o FMI. Apesar desse conservadorismo, o então presidente sempre foi maleável em relação às reivindicações sociais, o que aumentava a desconfiança dos militares.
Em meio à instabilidade econômica, Jango lançou o Plano Trienal, que buscava combater a inflação e fazer o Brasil crescer a uma taxa de 7% ao ano, além de iniciar uma política de distribuição de renda. Porém, o plano não conseguiu atingir as metas esperadas e as reivindicações populares se tornaram mais fortes. Após o fracasso do plano, Jango apostou nas reformas de base, para reestruturar o país. Estas medidas incluíam as reformas agrária, tributária, administrativa, bancária e educacional.
Em um grande comício, chamado de ‘Comício da Central, por ter sido realizado na Praça da República, em frente à estação Central do Brasil, no Rio de janeiro, o presidente anunciou para mais de 150 mil pessoas que daria início às reformas e livraria o país do caos em que estava vivendo. O comício, entretanto, foi mais um motivo para que a oposição o acusasse de comunista. A partir daí, intensificou-se uma mobilização social anti-Jango.
O golpe
A classe média, ao ver as bandeiras vermelhas e os pedidos de reforma agrária, ficou assustada com uma possível revolução socialista e deu apoio aos militares. Alguns dias após o comício, foi organizada a ‘Marcha da Família com Deus pela Liberdade’, que levou milhares de pessoas às ruas, pedindo o afastamento do presidente. Essas manifestações foram vistas pelos militares como um consentimento ao então Golpe de Estado que estava sendo preparado.
Na madrugada do dia 31 de março de 1964, o golpe militar foi deflagrado contra o governo de João Goulart. O que pôde ser destacado foi a total falta de reação do governo e dos grupos que lhe davam apoio. Jango caiu sem resistência, nem acionando seu dispositivo militar que lhe daria apoio. Começava, então, um período sombrio para a história brasileira, marcado por autoritarismo, censura e violentas violações de direitos humanos.
De acordo com o professor de história da UFRJ, Carlos Fico, autor do livro Além do Golpe, Jango poderia “ter tomado com facilidade o Palácio Guanabara, onde estava o governador Carlos Lacerda, que se defendia de forma precária. Poderia ter dispersado as tropas golpistas com poucos aviões bombardeiros, porém preferiu evitar uma guerra civil, ou apenas avaliou que seria inútil resistir”. Goulart saiu do país, mas, antes disso, já havia perdido seu mandato. Seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976.
Texto por: Mateus Ramos/ ADITAL