Stela Farias, sobre o debate da Reforma Política e os 50 anos do golpe de 64: em que medida a não aprovação das reformas de base propostas por
Jango e a interrupção da democracia no Brasil por 21 anos contribuíram para que o sistema político brasileiro fosse o que é hoje? (Foto: Karine Viana)
A deputada estadual Stela Farias (PT), coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa do Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana para a Reforma Política, está realizando uma série de conversas com o objetivo de ampliar a mobilização e o engajamento da sociedade neste tema. Um dos temas dessas conversas com lideranças políticas e sociais do Estado é relacionar o debate sobre a Reforma Política com o contexto histórico dos 50 anos do golpe civil-militar de 1964, que derrubou o governo constitucional de João Goulart. Uma das perguntas que animam essas conversas é: em que medida a não aprovação das reformas de base propostas por Jango e a interrupção da democracia no Brasil por 21 anos contribuíram para que o sistema política brasileiro fosse o que é hoje?
A deputada petista ocupará o Grande Expediente da Assembleia Legislativa no próximo dia 1º de abril para tratar desse tema. Stela Farias definiu essa agenda como um dos temas centrais de sua atuação política em 2014 e pretende se engajar nas articulações que estão sendo promovidas por sindicatos e movimentos sociais para organizar o plebiscito popular que será realizado entre 1º e 7 de setembro deste ano em todo o país. Ela espera que esse debate mobilize também o Parlamento gaúcho. “A reforma política precisa necessariamente ser participativa, profunda e com base no plebiscito, a fim de que a população brasileira tenha o direito a um sistema político que lhe garanta representação e participação”, defende a ex-prefeita de Alvorada.
Embora não tenha força legal, a iniciativa espera desencadear uma forte mobilização política e social em defesa da convocação de uma Constituinte Exclusiva para fazer a reforma política. Em 2002, uma iniciativa similar foi feita para consultar a população sobre o possível ingresso do Brasil na Área de Livre Comércio das Américas (Alca), proposta que estava então na agenda do governo de Fernando Henrique Cardoso. Entre 1º e 7 de setembro de 2002, foram coletados 10.234.143 votos em 46.475 urnas instaladas em todo o país, graças ao trabalho voluntário de mais de 157 mil pessoas. O resultado não deixou dúvida sobre a vontade da população: 98,32% dos eleitores se declararam contra a entrada do Brasil na Alca.
Diversos movimentos sociais estruturados nacionalmente estão participando da organização do plebiscito: Articulação de Mulheres Brasileiras, Central Única dos Trabalhadores (CUT), Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), Via Campesina, União Nacional de Estudantes (UNE), entre outras organizações e movimentos.
Um dos principais temas dos debates preparatórios ao plebiscito é o financiamento das campanhas eleitorais. Como o ano é de eleição, esse tema fará parte do cotidiano político nacional. O abuso do poder econômico só vem crescendo a cada eleição, sem que o Congresso Nacional, até aqui, tome alguma medida para reverter esse quadro.
Na eleição de 2010, 370 deputados federais foram eleitos combinando a condição de candidaturas mais caras (entre as 513 candidaturas mais caras do país).
Na eleição de 2010, 370 deputados federais foram eleitos combinando a condição de candidaturas mais caras (entre as 513 candidaturas mais caras do país).
O crescimento dos gastos das campanhas eleitorais
O crescimento dos gastos de campanhas eleitorais no Brasil tem sido exponencial, ultrapassando largamente a evolução inflacionária. No período entre 2002 e 2010, esses gastos triplicaram, enquanto que a inflação variou em torno dos 76%. Considerando apenas os gastos declarados das campanhas para a presidência e a Câmara Federal, os valores passaram de R$ 827.758.454,00, em 2002, para R$ 4.862.952.768.00, em 2010.
Na eleição de 2010, 370 deputados federais foram eleitos combinando a condição de candidaturas mais caras (entre as 513 candidaturas mais caras do país). O valor das contribuições empresariais dobra ou mais do que dobra a cada eleição, chegando a quase 5 bilhões de reais na última campanha. Essa crescente demanda por recursos tende a dificultar cada vez mais a eleição de candidatos sem acesso ou com acesso reduzido a eles.
O crescimento dos gastos com campanhas eleitorais
Os dados e as conclusões são do artigo Gastos em campanhas eleitorais no Brasil, de Ana Luiza Backes e Luiz Cláudio Pires dos Santos, da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. O estudo consolida informações sobre os gastos eleitorais recentes no Brasil, a partir das declarações prestadas pelos candidatos à Justiça Eleitoral, disponíveis na página do Tribunal Superior Eleitoral na internet. Os autores mostram a evolução das despesas entre 2002 e 2010 e o detalhamento dos gastos em relação à eleição de 2010. Além disso analisa a relação entre volume de gastos e a possibilidade de sucesso dos candidatos, apontando fortes evidências do crescimento do poder econômico no processo eleitoral e das ameaças que isso representa para a democracia brasileira.
O estudo assinala que os gastos com campanhas eleitorais aumentaram muito no mundo inteiro a partir da década de 1980. Entre as causas desse crescimento, estariam o aumento dos custos em marketing e propaganda e dos custos com transporte, com a expansão do uso de jatinhos. Nos últimos anos, foram apresentadas algumas propostas no Congresso para limitar os gastos eleitorais, mas elas não prosperaram. “Diante da falta de acordo quanto aos valores dos limites, a legislação adotou uma fórmula inócua, que deixa na prática sua fixação a cargo dos próprios partidos (que elevam ao máximo este valor)”, assinalam os autores.
A análise dos dados coletados, considerando, cabe enfatizar, apenas os gastos declarados, demonstra uma forte relação entre gastos e sucesso eleitoral. A conclusão de Ana Luiza Backes e Luiz Claúdio Pires dos Santos é a seguinte:
“Comparando a média de gastos dos eleitos com a dos não eleitos, observa-se que aquela foi em média 12 vezes maior. Considerando que o número de candidatos é muito grande, e que existem candidatos que praticamente não fazem campanha, o que rebaixa os gastos da média dos não eleitos, fizemos o cálculo da média de gastos dos candidatos competitivos, ou seja, dos não eleitos mais próximos da eleição (que acabaram ficando como suplentes). Ainda assim, a relação continua forte: os eleitos gastaram na média nacional o dobro dos não eleitos competitivos. Em vários estados (Pernambuco, Acre, Sergipe, Piauí, Rio Grande do Norte e Goiás), os eleitos gastaram o quádruplo ou mais que seus adversários competitivos. Dos 513 eleitos para a Câmara, 369 estão entre os que mais gastaram no seu estado”.
Uma das conclusões mais negativas desse
processo para a democracia é a crescente dificuldade para a eleição de representantes dos setores mais pobres da sociedade. “Se a eleição é mais cara, quem tem menos dinheiro tem mais dificuldade; igualmente partidos de pessoas com menos dinheiro ou que representam seus interesses provavelmente terão menos acesso a recursos”, assinala a pesquisa.
Fonte: Sul 21