Congresso Nacional de Sindicatos de Engenheiros, com patrocínio da Mútua e apoio do Crea-RJ, reúne engenheiras e engenheiros de diversos estados brasileiros. Participam do evento 117 delegados, sendo 75 em formato presencial e 42 virtual, além de seus suplentes e convidados
Por Marine Moraes (Senge-PE)
Com o tema A engenharia, o sindicalismo, a democracia e a soberania nacional, teve início, na noite do dia 9/9 (quinta-feira), o 12º Congresso Nacional de Sindicato de Engenheiros, Consenge – etapa híbrida. O Congresso, que acontecerá de 9 a 11 desse mês, terá sua parte presencial realizada na cidade do Rio de Janeiro e a parte virtual na plataforma digital Zoom.us. O Consenge é realizado pela Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros, Fisenge, conta com patrocínio da Mutua – Caixa de Assistência dos Profissionais do Crea e apoio do Crea-RJ.
Na mesa de abertura, estavam presentes o presidente da Fisenge, Roberto Freire; do Confea, Joel Krüger; o presidente da Mútua, Francisco Almeida; o presidente do Crea-RJ, Luiz Consenza; o presidente da CUT Nacional Sergio Nobre; a diretora da CUT/RJ e conselheira do Ondas (Observatório Nacional do Direito à Água e ao Saneamento), Andrea Matos; a presidente da FNA, Eleonora Mascia; o presidente do Senge RJ, Olímpio Alves dos Santos; o presidente do Clube de Engenharia, Pedro Celestino; a diretora do Coletivo de Mulheres da Fisenge, Virgínia Brandão e a vice-presidente da Fisenge, Elaine Santana.
A importância do 12º Consenge neste momento de crise econômica, política, social e sanitária brasileira foi ressaltada em todas as falas. “Nossos palestrantes vão nos dar uma oportunidade de pensar mais em um Brasil que nós queremos, que nós precisamos e lutamos para manter com soberania, com empresas estatais fortes, com prato de comida na mesa e vacina no braço e com garantia de direitos para as mulheres que são as primeiras atingidas com crises”, falou a diretora de mulher da Fisenge, Virgínia Brandão.
“Esse congresso marca a posição da engenharia em defesa de uma sociedade mais justa, desenvolvida e soberana. Nós perdemos e regredimos muito e nos transformamos, mais uma vez, em meros exportadores de produtos agrícolas”, discursa o presidente do Clube de Engenharia, Pedro Celestino.
A presidenta da Federação Nacional dos Arquitetos (FNA), Eleonora Mascia, ressaltou a importância do tema do Congresso, “em um momento tão grave da vida política e também das questões que dizem respeito à pandemia, ao meio ambiente e às questões sociais desse país, temos uma entidade como a Fisenge e os sindicatos trazendo esse debate, ajudando a construir a reação e a resistência ao golpe que estamos sofrendo desde 2016”, afirmou.
Para o presidente do Crea-RJ, Luiz Cosenza, o momento é muito grave, e não apenas para a engenharia. “O judiciário destruiu a engenharia. E quando destrói a engenharia, está destruindo o país. Nós somos responsáveis por mais de 80% do PIB nacional”, disse.
O presidente da CUT Nacional, Sergio Nobre, aproveitou a oportunidade para listar as graves consequências econômicas e sociais do projeto neoliberal imposto pelo atual governo federal, que vai além das quase 600 mil mortes causadas por conta do coronavírus que, de acordo com ele, poderiam ter sido evitadas se o Brasil fosse governado com seriedade e sem o comportamento genocida do atual presidente. “Está acontecendo o momento mais triste da história da classe trabalhadora brasileira. Infelizmente, hoje 1/3 de nossa população ou está desempregada ou está no desalento, o que é muito triste pra nós. Estamos vendo na periferia das grandes cidades, milhões de famílias passando fome. Estamos assistindo também a um grande desmonte do estado brasileiro com as privatizações. O governo Bolsonaro ameaça privatizar todo setor elétrico e está fatiando a Petrobras e vendendo em pedaços, cometendo um grande crime”, afirmou.
Para o presidente do Senge-RJ e anfitrião do Congresso, Olímpio Alves dos Santos, a importância do 12º Consenge e da luta das entidades da engenharia, vai além da defesa da categoria. “Os sindicatos têm o viés corporativo de lutar em defesa da categoria, mas nós temos que ir muito além disso e lutar pela construção de nosso país. Não existe engenharia sem o país. Antes da engenharia vem a construção soberana de um país, a engenharia é um dos meios para construir isso. Nós precisamos ter esse entendimento, para que a gente não caia apenas na questão corporativa”, enfatiza. Olimpio ainda ressalta que, nos onze Congressos anteriores, a Fisenge tem pautado a democracia e a soberania nacional como mecanismo para alcançar uma sociedade igualitária. “Nós não vamos construir uma nação soberana sem superar as desigualdades, com capacidade de democracia. É preciso que haja uma democracia onde o sujeito seja o povo, onde o poder seja realmente do povo”, conclui.
Já o presidente da Mutua – Caixa de Assistência dos Profissionais do Crea, patrocinadora do evento, Francisco Almeida, falou sobre a importância da engenharia para o desenvolvimento da nação. “Sem engenharia não tem desenvolvimento sustentável. Sem nós, não existem outras profissões porque tudo depende da engenharia”, afirmou. O engenheiro, aproveitou a oportunidade para falar sobre a Caixa de Assistência e sua importância na valorização profissional da categoria e no apoio e acolhimento a cada engenheira e cada engenheiro.
Ainda sobre a importância da engenharia no atual cenário brasileiro, a conselheira do Ondas, Andrea Matos, enfatizou a importância da engenharia na promoção do desenvolvimento nacional. “Os engenheiros têm a obrigação de engenheirar nossos sonhos na promoção de uma sociedade igualitária, com democracia, pelo direito à vida, pelo direito à comida, ao trabalho digno”, discursaram.
Para finalizar o primeiro dia do 12º Consenge – etapa híbrida, o presidente da Fisenge, Roberto Freire, fez, em seu discurso, um resgate histórico do momento que estamos vivendo e da engenharia nacional. “Neste sete de setembro, nós reafirmamos o coro pelo grito dos excluídos. Quantos de nós não se lembra de tantos sete de setembro com pleno emprego na engenharia, investimentos públicos em diversas áreas em defesa da soberania nacional? O Brasil era um país com uma das principais economias do mundo, fundador dos Brics, com política de conteúdo local que fortalecia as empresas de engenharia e a economia local, com programas de fortalecimento da agricultura familiar, com política de valorização do salário mínimo. O nosso país já não vivia mais na linha da miséria e da pobreza extrema, e nós voltamos a viver. Há alguns anos, desde 2016, quando deram o golpe no mandato da presidenta Dilma Rousseff, vemos esse quadro retroceder numa crise política, social e econômica sem precedente. Que afeta drasticamente a engenharia, o sindicalismo, a democracia e a soberania nacional, que são os temas do nosso Congresso”, disse.
Roberto lembra, ainda, do engenheiro que virou suco. “Em 1990, época de intensificação do neoliberalismo, as capas do jornal estampavam os engenheiros vendendo suco, cachorro quente ou taxista. Quem não se lembra da capa da revista Veja com o engenheiro que virou suco? Agora engenheiro virou uber, com remuneração de um pouco mais que um salário mínimo”.
Antes de encerrar sua fala, o presidente da Fisenge convida os presentes à luta pela democracia e soberania nacional. “Defender a democracia brasileira significa zelar pelo funcionamento das instituições, pelo estado democrático de direito, pela distribuição de renda, pela extinção da fome, pela retomada da economia, pelo fortalecimento dos sindicatos”, encerra.
SALÁRIO MÍNIMO PROFISSIONAL
O presidente do Confea, Joel Krüger, destacou a luta recente pela manutenção do Salário Mínimo Profissional diante da ameaça de emenda apresentada à Lei 1040/2021. “Eu quero destacar a ação recente foi feita de maneira colegiada, a questão da defesa do Salário Mínimo Profissional, um trabalho intenso não só do Sistema Confea/Crea e Mutua, como também de todas as entidades de classe, a Fisenge que teve uma participação ativa importantíssima nesse processo, o Clube de Engenharia, a Federação Nacional dos Arquitetos, Conselho de Arquitetura e Urbanistas e demais conselhos coirmãos que estão relacionados às questão do Salário Mínimo Profissional. Foi uma bela história para preservar essa conquista.”
LUIZ CARLOS SOARES, PRESENTE
O engenheiro Luiz Carlos Soares, um dos fundadores e primeiro presidente da Fisenge, falecido em 17/4/2021, foi lembrado em vários os discursos e homenageado pelo presidente da Fisenge, Roberto Freire, que, antes de seu discurso, pediu aos presentes um minuto de silêncio dedicado à memória do companheiro. A homenagem foi estendida aos quase 600 mil brasileiros que faleceram por conta da pandemia do Covid-19.
NOVA DIRETORIA DA FISENGE
No evento, a nova diretoria da Federação, que comandará a entidade no próximo triênio, aprovada na etapa virtual do 12º Consenge, que aconteceu em setembro de 2020, foi apresentada e saudada pelos presentes.
Todo o evento conta com garantia de protocolo sanitário de segurança, com obrigação do uso da máscara em todos os espaços.
Confira abaixo a íntegra do discurso do presidente da Fisenge, Roberto Freire:
Antes de iniciar o meu discurso, gostaria de propor um minuto de silêncio pelo falecimento do nosso amigo, companheiro, engenheiro e fundador da Fisenge, Luiz Carlos Soares. E também por todos aqueles e aquelas que se foram nesse período.
1 minuto de silêncio
“Há homens que lutam um dia e são bons. Há outros que lutam um ano e são melhores. Há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis”, poema de Bertolt Brecht que define a trajetória do nosso companheiro Soares.
Soares, o imprescindível, presente!
Inicio agradecendo a Comissão Organizadora do Consenge, o anfitrião, presidente do Senge-RJ e meu companheiro, Olimpio Alves dos Santos; a vice-presidente da Fisenge e companheira, Elaine Santana; o ex-presidente da Fisenge e atual secretário-geral, Clovis Nascimento; o ex-presidente da Fisenge e diretor financeiro do Senge-PR, Carlos Roberto Bittencourt e o diretor financeiro adjunto, Eduardo Piazera. O meu muito obrigado.
Estar hoje, no Rio de Janeiro, durante o 12º Congresso Nacional de Sindicatos de Engenheiros, após o 7 de setembro ocorrido em todo o Brasil pode ser um marco histórico. Como historiador, prezo pelos marcos históricos. Muitas vezes, fazemos reuniões, mobilizações e manifestações que sequer compreendemos o impacto na História. Mas a disputa por essa memória é fundamental. Neste 7 de setembro, reafirmamos o coro pelo Grito dos Excluídos.
Quantos de nós não se lembram de datas como o 7 de setembro com pleno emprego na engenharia, investimentos públicos em diversas áreas e em defesa da soberania nacional? O Brasil era um país com uma das principais economias do mundo, fundador dos BRICS, com política de conteúdo local que fortalecia as empresas de engenharia e a economia local, com programas de fortalecimento da agricultura familiar e com política de valorização do salário mínimo. O nosso país já não vivia mais na linha da miséria e da pobreza extrema.
Há alguns anos, desde 2016, quando deram um golpe no mandato da presidenta Dilma Rousseuff, vemos esse quadro retroceder numa crise política, social e econômica sem precedentes, que afeta drasticamente a engenharia, o sindicalismo, a democracia e a soberania nacional que são os temas do nosso Consenge. Em 2017, com a aprovação da Reforma Trabalhista, começamos a vivenciar o estrangulamento político e econômico das entidades sindicais. E não é algo inédito no Brasil, mas fruto do ultraliberalismo que desregulamenta o mundo do trabalho em diversos países.
Esta situação é agravada pelo processo de uberização, que hoje coloca milhares de trabalhadores vulneráveis sem carteira assinada e sem qualquer garantia. Nos anos 1990, época de intensificação do neoliberalismo, as capas dos jornais estampavam engenheiros vendedores de suco, cachorro quente e taxistas. Quem não se lembra da frase “O engenheiro virou suco” e hoje “o engenheiro virou Uber”. Atualmente, os mesmos jornais estampam engenheiros motoristas de aplicativos com remunerações de pouco mais de 1 salário mínimo. O mundo do trabalho enfrenta uma desregulamentação profunda e temos a responsabilidade de fortalecer as entidades sindicais e a luta dos trabalhadores e das trabalhadoras ao lado dos movimentos sociais.
Foi também nos anos 90, em 1996, que houve a privatização da Vale do Rio Doce que hoje privilegia o lucro. E é esta empresa responsável por uma das maiores tragédias ambientais do país, em Brumadinho, que vitimou inúmeras famílias.
Hoje, em 2021, vemos a retomada das privatizações, desde Eletrobras, Petrobras, Correios e do setor de saneamento. Nós que vivenciamos os anos 1990 sabemos os desastres das privatizações não apenas para a engenharia como para toda a sociedade brasileira. O que está em disputa é o papel do Estado brasileiro.
A pandemia da Covid-19 evidenciou a importância das instituições públicas como Fiocruz, SUS, Butantan para a produção de pesquisa, ciência, vacina e políticas públicas de saúde, inclusive no enfrentamento do discurso de negação da ciência.
Por outro lado, o atual governo federal asfixia os recursos do orçamento para a saúde e ainda impõe uma Reforma Administrativa por meio da PEC 32 que altera a organização da administração pública direta e indireta dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Sob o discurso de ajuste fiscal e de combate a privilégios, a proposta vai na contramão do que propõe.
Um dos pontos é o fim da estabilidade no serviço público, restrita a carreiras típicas de Estado, que pode provocar rotatividade de servidores e a descontinuidade de políticas públicas.
E em defesa do serviço público e dos direitos de toda a população estão os sindicatos. Foram as entidades de classe que, em 1966, se organizaram e derrubaram o veto do então presidente Marechal Castelo Branco, à lei 4.950-A que estabelece o nosso Salário Mínimo Profissional, em plena ditadura civil-militar. Foram os sindicatos, e destaco o protagonismo da nossa Fisenge e dos nossos sindicatos, que defenderam o Salário Mínimo Profissional em Brasília e nos seus estados, após uma tentativa de extinção por meio de emenda à Medida Provisória 1040. A história do sindicalismo na engenharia é de muita luta e de muita mobilização. Hoje, só temos a regulamentação da nossa jornada de trabalho e do nosso piso graças a essa atuação. A quem interessa um sindicato forte e atuante? Aos trabalhadores e às trabalhadoras, e é nossa responsabilidade seguir essa história.
Também é significativo que estejamos hoje, na rua Tonelero, em Copacabana, onde em 1954, um suposto atentado a Carlos Lacerda culminou numa crise política que levaria ao suicídio do então presidente Getúlio Vargas, que regulamentou sindicalismo. Foi na Era Vargas que conquistamos a jornada de trabalho de oito horas diárias, as férias remuneradas, a CLT, o descanso semanal obrigatório, a licença para gestantes e a proibição do trabalho para menores de 14 anos. Mais de 60 anos depois, a CLT é desmontada por meio da Reforma Trabalhista e, há poucas semanas, o Senado rejeitou outra Reforma que criaria a carteira verde e amarela, retirando direitos históricos.
Também é preciso reafirmar a memória de um engenheiro. Em 1971, faleceu, no Rio de Janeiro, o engenheiro e político brasileiro, Rubens Paiva, lutador incansável da democracia e também quem inspirou o então deputado Almino Affonso a criar a lei do Salário Mínimo Profissional da engenharia. Rubens Paiva foi sequestrado, torturado e assassinado pela ditadura civil-militar e até hoje sua família e organizações de direitos humanos lutam pelo direito à memória, à justiça e à verdade.
Defender a democracia brasileira significa zelar pelo funcionamento pleno das instituições, pelo Estado democrático de Direito, pela distribuição de renda, pela extinção da fome, pela retomada da economia, pelo fortalecimento dos sindicatos.
A história nos mostra inúmeras crises políticas provocadas, principalmente, pelo ódio de classe das elites desse país. Sabemos que a história se repete ora por farsa ora por tragédia e é nosso dever construir uma história de lutas comprometida com a democracia e a soberania nacional.
Hoje, o Brasil soma 584 mil mortes por COVID-19, numa das maiores crises sanitárias mundiais. Já são mais de 14 milhões de pessoas desempregadas no nosso país, sem contar as desalentadas e informais em situação de alta precarização. Milhares de famílias sem garantia de moradia, sem alimentação e sem esperança de uma vida melhor. Muitas mulheres chefes de família voltaram a cozinhar com lenha nas periferias. Até mesmo motoristas de aplicativos já não conseguem trabalhar com a alta do combustível vem ai outro apagão. O Estado brasileiro tem o dever de garantir uma renda básica universal permanente como política de distribuição de renda e fortalecimento da democracia.
É preciso retomar um ambiente de esperança por um futuro de igualdade social. Nós, engenheiros e engenheiras, temos o compromisso de uma sociedade igualitária, solidária e fraterna. Defendemos atuação forte do Estado brasileiro para suprir as necessidades dos mais pobres.
Para finalizar, vou citar um escritor carioca, Guimarães Rosa, que escreveu sobre o Nordeste:
“O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”
Por Roberto Freire